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Cineasta francesa dá aula em Cannes
Do Diário do Grande ABC
18/05/2000 | 10:56
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Citando Raymond Queneau, Gaston Bachelard, Nathalie Sarraute, fazendo cantar em intervalos regulares um passarinho mecânico para animar uma aula bem pouco acadêmica, Agnès Varda se sacrificou, na quarta-feira, ao rito da tradicional ``liçao de cinema'.

Neste ritual, a cineasta francesa, 72 anos, sucedia a alguns prestigiados predecessores, Theo Angelopoulos (1999), Yussef Chahine (1998) e Milos Forman (1997).

Aquela que foi companheira e cúmplice de Jacques Demy está presente este ano em Cannes fora de competiçao, com ``Les glaneurs et la glaneuse', um documentário sobre a economia paralela da recuperaçao nos países desenvolvidos.

``Vivemos em uma sociedade que deixa inutilizada uma quantidade de bens alimentares e nao sabe como distribuir este excedente, quis mostrar este aspecto da realidade, sem miserabilismo, mas com o desejo todavia de ser didática, para que se saiba como funciona'.

No decorrer de uma sessao que durou mais de duas horas, em presença de uma multidao numerosa, constituída de cinéfilos e de estudantes principalmente, a cineasta deu uma aula magistral cheia de vida e de humor, que devia muito ao sentido da fórmula, ao mesmo tempo poética e humorística, a uma de suas principais referências em matéria artística, o poeta Raymond Queneau.

Ela lhe dá, diz Agnès, os três ingredientes que devem constituir os principais motores da criaçao artística: o sentimento, a inteligência e a vontade.

Agnès Varda entremeou seu discurso com casos de sua carreira, afirmando notadamente que a fotografia e a pintura desencadearam seu desejo de ficar atrás da câmara. ``Aos 25 anos, nao tinha praticamente nenhuma cultura cinematográfica, tinha visto 5 filmes no máximo', diz ela. ``Aprendi a enquadrar através da pintura de Degas'.

Indicou como uma rejeiçao - a da comissao de antecipaçao sobre rendas - foi a origem de um de seus filmes mais conhecidos ``Le bonheur' (As duas faces da felicidade, 1965) : ``sexta-feira, soube que me recusavam a antecipaçao. Sob a raiva, escrevi em um week-end um outro roteiro que entreguei na terça e que foi aceito'.

A cineasta também explicou que o acaso na maioria das vezes guiou suas escolhas, citando principalmente uma frase de Luis Buñuel: ``entre o acaso e o mistério, desliza a imaginaçao'.

Leitora assídua até os 30 anos, ela aponta igualmente a romancista Nathalie Sarraute e o filósofo Gaston Bachelard como duas influências determinantes em seu percurso. ``Sao um pouco meus velhos, como a gente chama às vezes os pais, em toda minha vida estes dois intelectuais me protegeram do cretinismo'.

Agnès Varda disse estar atenta à revoluçao digital e à introduçao das novas tecnologias no cinema. ``Entramos numa era na qual vamos poder filmar como se pensa, como se anota'.




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