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Segurado poderá ter de pagar por perícia médica

Projeto de lei define que perdedor de ação na Justiça vai ser obrigado a arcar com custas

Caio Prates
do Portal Previdência Total
20/03/2022 | 08:56
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André Henriques/DGABC


Segurados do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) com deficiência, doença grave ou invalidez temporária ou definitiva poderão ter que arcar com os honorários das perícias médicas caso não consigam comprovar na Justiça a sua incapacidade. Esse é um dos objetivos do projeto de lei aprovado no dia 15 de março na Câmara dos Deputados. Oriunda do Senado, a proposta retornará para análise dos senadores.

O texto do projeto estabelece que a parte derrotada na Justiça deverá pagar a perícia médica judicial realizada em ação que tenha o INSS como parte e que discuta a concessão de benefícios assistenciais à pessoa com deficiência ou auxílios previdenciários por incapacidade laboral ­ como auxílio-doença e aposentadoria por invalidez. A regra não se aplica a quem tem direito à gratuidade judicial.

Na visão de especialistas em direito previdenciário, se aprovada, a regra servirá apenas para estabelecer um novo obstáculo para os segurados que sofrerem acidentes de trabalho ou alguma doença que provoque invalidez.

Para Marco Aurelio Serau Junior, advogado, professor da UFPR (Universidade Federal do Paraná) e diretor científico do Ieprev (Instituto de Estudos Previdenciários), esse projeto provoca um entrave de ordem econômica para o segurados. "É algo que deve ser repensado no Congresso. Já existem várias barreiras e óbices para o segurado do INSS na Justiça. E esse projeto de lei encarece o acesso ao Judiciário, principalmente para segurados, que na maioria desses casos, são hipossuficientes e incapazes", critica.

Serau destaca ainda que o projeto também passa a exigir uma série de requisitos procedimentais nas ações de benefícios por incapacidade, como a descrição da doença, impugnação específica do laudo pericial administrativo, uma perspectiva de indicar as atividades do empregado na empresa, por exemplo. "Causa uma perspectiva limitadora do acesso à Justiça", diz.

Isso porque o projeto estabelece os documentos que devem embasar a petição inicial, como comprovante de indeferimento ou não prorrogação do benefício, documento sobre a ocorrência do acidente de trabalho apontado como causa da incapacidade e atestado médico referente à doença alegada como a causa da incapacidade.

O advogado Ruslan Stuchi, sócio do Stuchi Advogados, afirma que o projeto aprovado é inconstitucional. "A Constituição Federal garante o acesso a Justiça, independentemente de a pessoa ter dinheiro ou não para pagar as custas do processo. Mesmo sendo aprovado, esse projeto deve criar uma discussão sobre sua validade no próprio Judiciário", avalia.

DIFICULDADE

Stuchi também destaca que o segurado que procura a Justiça para garantir acesso ao benefício do INSS, na maioria das vezes, já está em uma situação de dificuldade. "Nesses casos em que o segurado está debilitado ou com alguma dificuldade que o incapacite para realizar suas atividades, ele se socorre do Judiciário, variavelmente, na situação extrema, quando já está sem receber salário ou benefício previdenciário. E em muitos casos o benefício foi suspenso por erros administrativos do INSS. Ou seja, numa situação vulnerável financeira e de saúde", alerta.

Para o advogado João Badari, sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogado, trata-se de uma medida que pode cometer injustiça com alguns segurados. "Muitas vezes vemos casos em que o segurado não tem condição de exercer sua atividade, mas o perito não atesta a sua incapacidade. Em outros casos o segurado não tem condição financeira para levar laudos e exames na perícia. E isso pode limitar ainda mais o acesso à Justiça", afirma.

Advogado diz que se trata de ‘aberração jurídica’

Celso Joaquim Jorgetti, sócio da Advocacia Jorgetti, no jogo de empurra entre Executivo e o Judiciário quem vai sair prejudicado da história é o segurado.

"O projeto de lei aprovado pela Câmara dos Deputados é uma verdadeira aberração jurídica e usa como fundamentação o artigo 98 do Código de Processo Civil, uma Lei Ordinária hierarquicamente inferior à Constituição Federal. E faz com que o cidadão tenha cerceado seu direito ao acesso a Justiça fere frontalmente o princípio previsto no inciso XXXV do Artigo 5º da Constituição Federal de 1988, que é um direito fundamental. Este direito garante a todos os brasileiros a possibilidade de acesso ao Poder Judiciário e à Justiça", analisa o advogado.

Segundo Jorgetti, além da Constituição Federal, o artigo 8º da 1ª Convenção Interamericana sobre Direitos Humanos de São José da Costa Rica, da qual o Brasil é signatário, também garante o acesso à Justiça.

Diz o Artigo 8º da convenção que "toda pessoa tem direito de ser ouvida, com as garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista fiscal ou de qualquer natureza",

"Como o projeto de lei, com origem no Senado Federal, foi aprovado com várias alterações, deve retornar para aquela Casa e, no meu entender, dificilmente será mantido como aprovado pela Câmara dos Deputados", frisa o advogado.




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