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Modelo de negociação da GM pode virar regra

Para especialistas, demais empresas da região e do País tendem a implantar estratégia da montadora

Yara Ferraz
Diário do Grande ABC
27/01/2019 | 07:00
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Claudinei Plaza/DGABC


Após a GM (General Motors) anunciar a possibilidade de fechar suas fábricas no País, a montadora norte-americana começou intensa negociação envolvendo a flexibilização dos direitos dos trabalhadores e o aumento de incentivos fiscais junto ao poder público. Essas são condições impostas à sua permanência e, consequentemente, à manutenção dos empregos – 8.500 somente na planta de São Caetano – além de investimentos futuros nas unidades da região e de São José dos Campos. O modelo de negociação pode vir a se tornar tendência entre as montadoras da região e outras empresas em âmbito nacional, apontam especialistas e fontes do setor.

Além da GM, localizada em São Caetano, o Grande ABC possui mais cinco montadoras – Mercedes-Benz, Volkswagen, Ford, Scania e Toyota – todas elas instaladas em São Bernardo. Para o presidente do SMABC (Sindicato dos Metalúrgicos do ABC), Wagner Santana, o Wagnão, apesar de todas elas estarem com acordos coletivos válidos pelos próximos anos, até 2021, existe preocupação da utilização nos mesmos moldes que a GM.

“Existem acordos vigentes, só que essas empresas não terão dúvidas em utilizar essas estratégias se elas forem mais vantajosas. Porém, tudo depende de como o movimento sindical vai reagir a essas investidas. A própria questão do trabalho intermitente (uma das medidas que deve ser solicitada pela GM aos trabalhadores) é tentativa de rebaixamento de direitos. O fato de a GM tentar isso já é significativo”, disse. “Nós, trabalhadores, não vamos pagar pelos erros e pelas novas estratégias que as empresas tentam impor.”

O coordenador de MBA em gestão estratégica de empresas da cadeia automotiva da FGV, Antonio Jorge Martins, acredita que um efeito em cascata possa ser desencadeado, mas que ele também pode não ocorrer. “O estágio de maturação dessas empresas no Brasil é diferente de uma para outra. Ou seja, isso pode acontecer, mas não necessariamente vai acontecer. As empresas fazem investimentos em momentos diferentes, então a maturação de negócios de cada uma delas também difere no Brasil”, disse.

O economista e coordenador do Conjuscs (Observatório de Políticas Públicas, Empreendedorismo e Conjuntura), da USCS (Universidade Municipal de São Caetano), Jefferson José da Conceição, pontuou que existe ambiente favorável para esse tipo de negociação. “As empresas jogam as regras do jogo. Uma série de ações tem sido implementadas e a reforma trabalhista é uma delas. A busca da reforma tributária que desonere o investimento é outra. Se acrescenta a isso o ambiente de 2016 para cá, com desaceleração anunciada da economia, o que deixa o cenário mais propício a essas mudanças.”

Conceição pondera que o acontecimento traz preocupação para a região. “Como temos estruturas semelhantes, somos imediatamente afetados. A reforma trabalhista, que deve ser praticada neste acordo, pode servir para as empresas como modelo de redução de custo ‘negociado’. Se eles assinarem, virará modelo, e trará grandes impactos na nossa economia”, sentenciou.

Aposta é que fabricante permaneça no Brasil

Apesar do anúncio da possibilidade de fechamento das fábricas na América Latina, especialistas acreditam que a GM não deve sair do Brasil. Entre os motivos estão a importância do mercado automotivo brasileiro e o próprio andamento da negociação.

“Na minha opinião, o que aconteceu foi a utilização de um instrumento de poder de barganha com as partes interessadas”, disse o coordenador de MBA da FGV, Antonio Jorge Martins. “Até porque a GM fabrica o carro que é líder de vendas no Brasil, o Ônix (cuja versão de entrada, a Joy, é feita em São Caetano).”

Segundo o especialista, a imagem da montadora ficaria arranhada se ela saísse do País, que ainda possui mercado de veículos com grandes possibilidades de crescimento, e que voltou a reagir no ano passado. Dados da Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores) mostram que saíram das linhas de produção das montadoras do País 2,8 milhões de veículos, 6,7% mais do que em 2017. Martins aponta que o cenário é bem diferente em lugares onde a marca fechou fábricas, como nos Estados Unidos, Canadá e Rússia.

Mesmo assim, ele pontua que a GM sentiu os efeitos da crise. “Quando essas empresas chegaram aqui, o mercado era totalmente diferente. Hoje, elas precisam investir mais e em menos tempo para não perder competitividade. O mercado também está mudando. Já estamos falando em carros elétricos e autônomos”, disse. Além disso, ele completa que montadoras que se instalaram no País depois, muitas vezes colocam no mercado veículos com melhor custo benefício, mais completos, o que acirra a competitividade.  




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