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Ano Santo multiplica peregrinos na Espanha
Heloísa Cestari
Do Diário do Grande ABC
14/07/2004 | 20:58
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Em uma das mais famosas passagens da Bíblia, Jesus Cristo consegue salvar a vida de uma mulher adúltera do apedrejamento em via pública utilizando-se apenas de uma frase: “Quem nunca tiver pecado que atire a primeira pedra”. Na ocasião, ninguém em meio à multidão enfurecida julgou-se suficientemente puro para iniciar a “lapidação” da moça. E hoje a situação não seria muito diferente. Afinal, a condição de sociedade pecadora manteve-se firme no decorrer dos séculos. Mas a igreja católica arrumou um jeitinho de redimir seus adeptos de todos os erros cometidos no passado: basta percorrer as centenas de quilômetros que levam a Santiago de Compostela, na Espanha, e passar pelo pórtico da Glória ainda este ano. Como 2004 é declarado Ano Santo ou Xacobeo (em galego, “jacobeu”, que vem de Jacó ou Tiago), o que só ocorre quando o dia 25 de julho (dia de São Tiago) coincide com um domingo, quem peregrinar até a cidade neste ano receberá indulgência plenária, o que em suma significa o perdão de todos os pecados.

A graça pode ser obtida em proveito próprio ou transferida a entes falecidos. Mas, para tanto, é preciso cumprir algumas condições, como visitar o túmulo do apóstolo na Catedral de Santiago, fazer uma oração em intenção ao Papa, receber os sacramentos da penitência e da comunhão e, de preferência, assistir à celebração da Eucaristia.

Considerada a terceira cidade Santa do mundo cristão, depois das rotas de Jerusalém (Israel) e de Roma (Itália), Santiago de Compostela deverá receber mais de 1,5 milhão de visitantes este ano, especialmente no próximo dia 25. Desde a instituição do Ano Santo em 1122 – quando Calixto II, grande benfeitor da igreja compostelana, acrescentou a graça à Bula Papal, privilégio mais tarde confirmado por Alejandro III –, foram registrados 117 anos santos compostelanos.

A chamada Porta Santa, situada atrás da Catedral, na praça da Quintana, foi aberta aos peregrinos no último dia 31 de dezembro, durante uma cerimônia em que o arcebispo de Santiago derrubou com três golpes um pequeno muro de pedras que mantinha o portal fechado. Ela permanecerá aberta até o último dia de 2004. Depois, só daqui a seis anos.

Mas, pecados à parte, Santiago merece uma visita a qualquer ano, seja ele jacobeu ou não. Afinal, para muitos, a chegada à catedral nem é o mais importante frente às vivências e reveladoras descobertas que se faz no decorrer do percurso. Isso sem falar nas belíssimas paisagens de cidades como Pamplona, Puente La Reina, Burgos, León e Ponferrada, entre tantas outras que, juntas, formam um magnífico conjunto de montanhas, castelos medievais, casas milenares, praias, dezenas de igrejas e mosteiros, alguns deles erguidos há mais de 15 séculos. No vilarejo de Cebreiro, por exemplo, além de palhoças de pedra construídas pelos celtas 3 mil anos atrás, há uma igreja pré-românica que guarda o Santo Graal, cálice em que teria sido depositado o sangue de Cristo. A vila fica no alto de uma montanha, 152 km a leste de Santiago.

Outro destaque é o acervo arquitetônico que se contempla na chegada a Santiago, declarado pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura) como Patrimônio da Humanidade. Os dois monumentos mais significativos ficam na praça do Obradoiro, onde encontram-se o Hotel dos Reis Católicos – um dos mais luxuosos da Europa – e a almejada Catedral de Santiago, ponto final do percurso oficial, onde um pórtico com 200 esculturas românicas do século XII dá as boas-vindas aos peregrinos. Entre elas, a estátua dourada do santo e, sob o altar, a pequena cripta onde estariam os seus restos mortais.

Já ao cair da noite, os badalados pubs, danceterias e bares com mesinhas nas calçadas lotam de jovens, mostrando que nem todo peregrino é, necessariamente, um santo.




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