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Curso ensina Português para haitianos

Prefeitura oferece 135 vagas a imigrantes por meio do Pronatec

Por Natália Fernandjes
Do Diário do Grande ABC
03/08/2014 | 07:00
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Ricardo Trida/DGABC


 Ao invés do sinal, oração em forma de canto em Francês ecoa pelos corredores da EE Professor Adamastor de Carvalho, na Vila Metalúrgica, em Santo André, e anuncia o início das aulas. O ritual emocionante é protagonizado por 135 haitianos que participam de curso para aprender Português oferecido pela Prefeitura diariamente.

O grupo corresponde à primeira turma da formação gratuita de 160 horas, que teve início em meados de julho. Foi criado na tentativa de incluir a comunidade de cerca de 700 haitianos que se instalou nas proximidades do núcleo dos Ciganos, no bairro Utinga. As aulas são realizadas de segunda a sexta-feira, das 19h às 21h, e ministradas por professores contratados pela administração por meio de convênio com o Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego).

A maior parte dos haitianos está na cidade em busca de especialização profissional. Caso do médico generalista Robert Gilles, 35 anos, há oito meses no Brasil. Depois de se graduar em 2009, em Cuba, ele resolveu seguir os passos de um primo que morava em Santo André. “Acho que escolhi o Brasil porque é um país latino e a cultura é parecida com a do Haiti. Também gostamos muito de futebol, de bailar (dançar), temos religiosidade forte”, explica.

Enquanto não finaliza a documentação necessária para que consiga ingressar em pós-graduação na área de Endocrinologia ou Nefrologia (ele ainda está em dúvida), Gilles aproveita para dominar o idioma, o que não tem sido complicado. Isso porque quase todo haitiano é bilíngue: tem como língua local o crioulo e oficialmente utiliza o Francês. “Já tinha contato com o Espanhol, então não estou achando tão difícil.” A afirmação foi confirmada pela equipe do Diário, tendo em vista a facilidade com que o estrangeiro se comunicou durante a conversa.

Para conseguir se manter no País, o médico trabalha como operador de caixa em supermercado de Santo André. Segundo ele, o acolhimento da comunidade religiosa no núcleo dos Ciganos foi fundamental para que não desanimasse nos primeiros meses e voltasse ao Haiti. Para ele, suportar a saudade da família tem sido o mais complicado, embora esteja gostando da tranquilidade andreense.

IMIGRAÇÃO

Em 2010, o Haiti sofreu terremoto de grande escala que matou mais de 300 mil pessoas. Desde então, cerca de 21 mil estrangeiros entraram legalmente no Brasil como refugiados. “Não somos marginais. Estamos aqui porque consideramos importante adquirir essa experiência em outro país para retornar ao Haiti e auxiliar nossa pátria”, destaca Gilles.

As diferenças econômicas entre os dois países são destacadas pelo administrador Winzor Doricent, 27, há nove meses na cidade, em uma singela comparação entre as moedas locais. “Imagine que lá no Haiti cinco gourdes (unidade monetária) equivalem a 20 centavos do Brasil. Com esse valor compramos um pão lá, já aqui mal conseguimos comprar uma bala. Tudo é caro.”

Doricent é almoxarife e mora com grupo de amigos para dividir o aluguel. “O custo de vida no Brasil é bem caro”, destaca. Apesar da questão financeira, a ideia inicial de voltar para o Haiti após conclusão dos estudos está sendo repensada. “Tudo depende do que o país pode oferecer”, diz.

O haitiano ingressou no MBA em Gestão de Projetos em março, na Anhanguera, e, para intensificar o aprendizado no idioma, Doricent contou que recorre a uma técnica simples: ouvir música brasileira. Entre os preferidos está o cantor sertanejo Gustavo Lima.

Compromisso com aprendizado chama atenção

O compromisso com a aprendizagem é um dos pontos que mais chama atenção de Vilma Rosa, uma das professoras do curso de Português, sobre os haitianos que participam das aulas. “Eles têm real noção do tamanho da oportunidade que estão tendo. Até porque foi um ato de muita coragem terem deixado tudo no Haiti para vir ao Brasil”, defende.

Formada em História, a docente é fluente no Francês e tinha experiência com comunidades por meio de projetos sociais. “É um público muito rico. Aprendo bastante com eles. Estou mergulhando num universo incrível”, revela.

Além do ensino gramatical, sobre leitura, técnicas de redação e estilos literários, as aulas de Português oferecidas para estrangeiros também trabalham conteúdos de História do Brasil, da cultura nacional, sobre o espaço geográfico, cidadania e o mundo de trabalho. “Neste primeiro momento estamos estabelecendo a parte gramatical básica para que eles consigam se comunicar e, assim, avançar para as demais questões”, explica Vilma.

A facilidade com que a maior parte dos estudantes adquire fluência no idioma é assustadora, define Vilma. “Podemos considerar que, gramaticalmente, o Francês é parecido com o Português. Além disso, muitos são bilíngues e até trilíngues, já que 10% dos meus alunos fala Espanhol”, comenta. Cada sala de aula tem 27 estudantes.




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