Setecidades Titulo Lá no meu bairro
Jd.Bom Pastor tem tradição na arte circense

Bairro que abrigou artistas mantém raízes com sapateiro de palhaços e circo-escola

Vanessa de Oliveira
Do Diário do Grande ABC
03/05/2014 | 07:00
Compartilhar notícia
André Henriques/DGABC


A partir de hoje, o Diário trará, às terças e sábados, a página Lá no meu bairro, com histórias da gente do Grande ABC. Na estreia, o Jardim Bom Pastor, em Santo André, bairro misto de residências e muitos comércios. Entre tantos estabelecimentos, sapataria na Rua José D’Ângelo, 26, chama a atenção. Não se trata de sapataria comum, já que não trabalha apenas no conserto de calçados. Lá são fabricados sapatos para pés de uma clientela que leva diversão aonde quer que vá: os palhaços.

Da mente e das mãos de Edson Ferreira Campos, 45 anos, saem sapatos cheios de cor e alegria. A sapataria é herança do pai, José Ferreira Campos, que morreu em 2002, aos 59 anos, vítima de infarto.

A especialização nesse tipo de calçado teve início em 1973. O patriarca, que saíra da Bahia em 1970 para buscar melhores condições de vida, comprou a sapataria em que trabalhava (situada àquela época em outro prédio na mesma rua) e, com estabilidade, pôde trazer Edson e mais duas irmãs a São Paulo. “Meu pai arrumou uma casa de dois cômodos e chamou a família. E daqui nunca mais saí.”

A sapataria tinha tudo para ser como outra qualquer, não fosse o diferencial de estar instalada em um bairro que concentrava muitos artistas circenses. “Certo dia, começaram a pedir que ele fizesse sapato de palhaço. Ele criou a fôrma e começou a fazer”, lembra.

Edson acompanhava tudo apenas como espectador, mas, com a morte do pai, assumiu a sapataria. “Um dia um rapaz pediu para eu fazer um par de sapatos de palhaço. Comecei a lembrar como meu pai fazia e consegui reproduzir”, afirma ele, que utiliza até hoje a fôrma e a máquina de costura que eram do pai.

Embora os circos já não estejam tão em alta como naquela época, Edson está sempre cheio de pedidos, já que há grande quantidade de palhaços que animam festas infantis. A produção aumentou ainda mais quando sua irmã Ednéia Ferreira Campos, 43, divulgou a sapataria na internet. “Recebo pedidos de todo o Brasil e já enviei sapatos para o México, Estados Unidos, Argentina e países da Europa”, destaca. Os sapatos, inclusive, foram parar nas telas do cinema, no filme O Palhaço, estrelado pelo ator Selton Mello.

Por mês, são produzidos entre dez e 15 pares. O preço varia de R$ 140 a R$ 600, dependendo do modelo.

Hoje, Edson pensa em deixar o conserto dos calçados tradicionais para se dedicar exclusivamente à produção dos sapatos de palhaço. A única coisa que não deixará é o Jardim Bom Pastor, lugar onde começou a trilhar, literalmente, uma caminhada de alegria.

Família de circo preserva origens do bairro

A existência dos circos já não é mais tão comum no Jardim Bom Pastor, mas a família Palacios resiste há seis décadas.

Quando chegaram ao bairro, não havia quase nada por lá. “Minha avó conta que era só mato e nossa família comprou vários lotes pelo bairro. Não nasci aqui, mas sempre venho para cá, então, o bairro está no sangue”, fala Priscila Nelida Palacios Ayres, 35 anos, da quinta geração da família de artistas de circo.

Da necessidade surgiu a iniciativa que mantém as raízes circenses do bairro. No fundo da casa de propriedade dos Palacios há 60 anos, na Rua José D’Ângelo, foi montado circo-escola que funciona há 14 anos. “A gente tinha um circo pequeno chamado Real Palacio, que ia de bairro em bairro. No dia em que iríamos estrear em Ribeirão Pires, um temporal destruiu toda a nossa estrutura. A gente não sabia o que fazer, pois não tínhamos experiência com outra coisa fora o circo. Então dei a ideia de montar uma escola com o material que a gente tinha e erguemos uma lona no fundo de casa para ensinar várias modalidades circenses”, lembra Patrícia Palacios de Abreu, 37.

Três vezes por semana, dois professores dão aulas com duração de uma hora. Cada modalidade leva três anos para ser efetivamente ensinada aos alunos.

Patrícia diz que o bairro é muito carente de Cultura e, sempre que pode, o circo-escola quebra a rotina levando espetáculos a alguns eventos, como em atividades da EE Luiz Martins, situada na mesma rua.

Atualmente, o Circo-Escola conta com 26 alunos e o custo mensal do curso é de R$ 170. No entanto, uma vez por mês são abertas dez vagas para pessoas carentes. No momento, apenas três estão preenchidas pela meninada do bairro, aliás, os únicos alunos do Jardim Bom Pastor. “Aqui tem toda uma história nessa questão do circo e gostaria que mais pessoas conhecessem essa arte”, disse Patrícia, completando: “Circo é alegria. Envolve atividades lúdicas, trabalha coordenação, autoestima e não tem idade. Tenho alunos com 55 anos que dizem: ‘Volto a ser criança quando estou aqui’. Isso, sem dúvida, é algo muito prazeroso.”

Moradores solicitam abertura de agência bancária

Quem vive no Jardim Bom Pastor se diz satisfeito pela comodidade que o bairro proporciona. Faz divisa com a cidade de São Bernardo, tem fácil acesso para São Paulo, dispõe de comércios de todo o tipo, fazendo com a que a saída da área para a execução de serviços variados seja mínima. Mas para essa questão ficar completa, os moradores sentem falta de uma agência bancária. “É uma reivindicação de uns dez anos, pois temos tudo aqui, só para ir ao banco que temos de nos deslocar ”, disse o aposentado João Braz de Azeredo, 60 anos.

Por outro lado, para viabilizar esse anseio, é preciso reforçar a Segurança, segundo os munícipes. “Já colocaram uns caixas eletrônicos no bairro, mas acabaram tirando por conta de frequentes assaltos”, contou Priscila Nelida Palacios Ayres, 35.

Os jovens do Jardim Bom Pastor também tem suas reivindicações, essas referentes ao lazer. O bairro conta com o Cesa (Centro Educacional de Santo André) Vila Floresta, que oferece área para a prática de diversas atividades, como skate. Os adolescentes que frequentam o espaço aprovam o local, mas destacam que algumas melhorias precisam ser feitas. “A pista de skate necessita de uma reforma, pois tem muitos buracos e a iluminação que queimou não foi trocada para utilizarmos com segurança no período da noite”, falou Suyane Reis, 15.

Debora Menezes Rezende pontuou a manutenção dos brinquedos, para as crianças. “O gira-gira quebrou há cerca de três meses e até agora, ninguém consertou.”

Comunidade conquista passarela após anos de pedidos

Após anos de reivindicação por parte dos moradores do Jardim Bom Pastor, em Santo André, finalmente a travessia dos pedestres pode ser feita em segurança, com a remoção da ponte de madeira que cruza o Ribeirão dos Meninos até a Avenida Lauro Gomes, na divisa com São Bernardo.

No dia 5 de abril, foi implantada no local uma passarela – sem cobertura – com estruturada em treliça (rede de vigas cruzadas, usada na construção de pontes) e com dois metros de largura por 26 de comprimento. A obra foi paga pela Prefeitura de Santo André, ao custo de R$ 150 mil. A São Bernardo coube a implantação de sinalização horizontal na travessia da avenida.

Na época da substituição, o engenheiro civil do Departamento de Conservação de Áreas de Santo André, Clovis Tiago Censon, afirmou que a espera pelo aval do Daee (Departamento de Águas e Energia Elétrica), já que a ponte passa por cima do Ribeirão dos Meninos, e a negociação com a Prefeitura de São Bernardo foram os motivos da demora para atender ao pedido da comunidade.

“Aquilo era uma vergonha, além de perigoso, pois passa muita gente no local. A troca foi, sem dúvida, uma grande conquista para o bairro”, ressaltou Maria Eliza, 57 anos.




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;