Apesar do corte de 29 vereadores determinado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral), cinco câmaras municipais do Grande ABC atingidas pela medida terão liberdade para gastar, no ano que vem, 34% mais do que gastaram em 2004. A destinação de igual ou maior valor para a chamada função legislativa não contraria a lei, mas frustra qualquer expectativa de que a redução do número de parlamentares signifique economia de dinheiro público.
Entre os 75 maiores municípios pesquisados pelo Ieme (Instituto de Estudos Metropolitanos), São Caetano aparece em 71º lugar no ranking das cidades que mais gastam com a Câmara de Vereadores: R$ 76,68 por habitante, resultado que coloca a cidade em último lugar na região. Os dados, relativos a 2003, mostram ainda que a melhor performance entre as sete cidades é de Santo André, que gastou gastou R$ 24,28 por habitante para sustentar o Legislativo. No ranking do Ieme, aparece em 29º lugar. A cidade que menos gasta com a Câmara é Barretos, com R$ 7,22 por habitante; o Legislativo mais caro é o de Paulínia, com 263,81 per capita.
São Caetano terá dez cadeiras a menos em 2005 (caiu de 21 para 11), mas a verba prevista para 2005 (R$ 17,1 milhões) é 68,2% maior do que foi gasto em 2003 (R$ 10,5 milhões) - os dados de 2004 não fora fechados. O presidente da Câmara, Paulo Pinheiro (PDT), afirma que não há o que discutir, já que é prática comum devolver os restos no final do ano. Em 2004, por exemplo, voltaram R$ 4 milhões para a administração. "Pela LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) não posso gastar além do previsto, já existe o mecanismo de compensação", explica. Pinheiro bate ainda na tecla do prejuízo político, ao argumentar que o corte de 11 vereadores atrapalha a representatividade da população. "Os gastos se diluem na prestação de serviços feita pelos vereadores à população", arremata.
Crise financeira - Em graves dificuldades financeiras, Diadema aumentou o repasse à Câmara em 16%, de R$ 12,6 milhões para R$ 14,3 milhões, embora o número de vereadores tenha caído de 21 para 16. O atual presidente da Câmara, Marquinho Ernandez (PT), coloca que essa reavaliação estará na pauta no próximo mandato. E reforça a possibilidade de as sobras voltarem para os cofres da prefeitura. A Casa deverá economizar cerca de R$ 940 mil por ano, segundo o próprio vereador. "Os poderes ficam fragilizados com essa redução", pondera.
O petista coloca que a redução com despesas produziria o mesmo resultado em termos de economia, sem a contrapartida do prejuízo político. "Nós conseguimos, por exemplo, sustentar o aumento dos subsídios dos vereadores neste ano, com economia nas compras e despesas", explica, ao fazer referência ao aumento de 54% no salários dos parlamentares.
Com Orçamento igualmente apertado e credores de precatórios sempre à porta, Mauá aumenta o repasse para a Câmara em 29%, de R$ 11 milhões para R$ 14,2 milhões, apesar de ter quatro parlamentares a menos - o número de cadeiras caiu de 21 para 17. "O repasse é uma coisa garantida em lei", defende-se o presidente da Câmara, Diniz Lopes (PL). "O que aconteceu é que agora teremos mais espaço para trabalhar."
Candidato à reeleição na presidência da Casa, Diniz descarta a idéia de abrir mão do repasse para garantir mais fôlego financeiro ao próximo prefeito. Para ele, isso impediria os vereadores de atender a população. "Coloca uma coisa na sua cabeça: o número de vereadores diminuiu, mas a população da cidade continua a mesma. Portanto, cada um de nós terá mais trabalho no ano que vem", afirma Diniz Lopes (PL). Ele afirma que os gabinetes terão mais trabalho para atender a população que procura vereadores para obter serviços, como por exemplo a impressão de currículos e de cartas de referência.
Diante da argumentação de que esse não é o objetivo principal do Legislativo, o presidente da Câmara, Diniz Lopes, responde: "Tem de informar isso para a comunidade". Para ele, a mudança para um novo endereço poderá absorver a sobra de dinheiro que será destinada à Câmara nesse ano. "Já está decidido que teremos um novo prédio", afirma. O dinheiro poderá ser empregado na compra de nova mobília, construção de sala de convenções e biblioteca. Segundo Diniz, todas as despesas serão pagas exclusivamente com recursos do repasse à Câmara.
Sem devolução - Ribeirão Pires terá quatro vereadores a menos - o número caiu de 15 para 11 - mas, em vez de cortar, aumentou os recursos previstos para o Legislativo. Nesse ano, a Câmara poderá consumir R$ 2,6 milhões. No ano que vem terá limite de até R$ 3,6 milhões. Apesar do recurso extra, o atual presidente da Casa, Edson Savieto, o Banha (PT), não vê possibilidade de economia. Ele justifica a necessidade da verba extra para melhorar a infra-estrutura da Casa. E reclama da falta de equipamentos e aponta a necessidade de informatizar o Legislativo e até do "cafezinho".
Banha não vê possibilidade de devolução de parte dos recursos para a administração, para serem usados em programas e serviços voltados diretamente à população. "Acho que a administração tem o planejamento de seus programas, e o Legislativo tem de estar preparado, equipado, com boa infra-estrutura para acompanhar o Executivo, senão fica tudo parado", coloca.
Rio Grande da Serra, que vive às voltas com a dificuldade até para comprar cestas básicas, vai pagar a nove vereadores, em 2005, verba de R$ 1,080 milhão, mais ou menos o mesmo que foi suficiente para 15 parlamentares em 2004. O prefeito eleito e atual presidente da Câmara, Adler Kiko Teixeira (PSDB), engrossa o coro dos que justificam a necessidade da "sobra" para melhorar a estrutura de apoio do Legislativo. "Quando houve a redução de cadeiras, acreditávamos que isso (diminuição de vagas e aumento de verba) ia acontecer em cidades com Câmaras sem estrutura", disse.
Questionado se a verba extra do Legislativo não seria mais útil em áreas carentes como a saúde ou educação, Kiko argumenta que o "Legislativo também é importante para a cidade e precisa de infra-estrutura". "Mas a verba está prevista no orçamento. A Câmara de Rio Grande precisa de melhorias, até de espaço físico."
Sem mudança - Determinada pela Constituição, as faixas de repasse estão vinculadas ao número de habitantes, mas poderiam ser alteradas pelos vereadores por pressão política ou pela própria iniciativa ao adequar os repasses à realidade do município. A possibilidade de enxugamento de redução foi cogitada numa PEC (Proposta de Emenda Constitucional), rejeitada em junho no Senado. Espécie de compensação política para justificar a manutenção de muitas vagas de vereadores em todo o país, o autor da emenda propunha a redução de 0,5% em todas as faixas estabelecidas na Constituição.
Corporativista - Na avaliação do vice-presidente da Abracam (Associação Brasileira da Câmara), vereador Laércio Soares (PC do B de Diadema), não cabe às câmaras consertar essa distorção, mas sim ao Congresso. Segundo ele, um simples projeto de lei aprovado pelos vereadores não tem poder de fogo para derrubar uma determinação constitucional. "Mas há a possibilidade administrativa, o presidente da Câmara pode assumir o compromisso de manter os gastos de forma razoável", afirma.
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