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O teatro do Grande ABC e sua gente
Por Mauro Fernando
Do Diário do Grande ABC
14/07/2001 | 15:23
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A questão é complexa e não há conclusões definitivas nem soluções prontas. Há um único ponto de concordância: quem faz teatro no Grande ABC precisa sair da região para desenvolver uma carreira sólida. Cássia Kiss e Lucélia Santos são dois exemplos. Antônio Petrin, Jerusa Franco, Luís Alberto de Abreu, Sônia Guedes, Zécarlos Machado, entre tantos, também alçaram vôo. Angélica, embora não tenha trabalhado na área, também teve de sair.

Profissionais como Antônio Araújo, Francisco Medeiros e o próprio Abreu lecionam na ELT (Escola Livre de Teatro), de Santo André, e a Fundação das Artes de São Caetano já teve em seu quadro de professores Eugênio Kusnet, o maior diretor de atores do Brasil. A região, portanto, é um pólo importante de formação. Tornar viáveis as produções, porém, é outra história.

Escassez de espaços e recursos privados e públicos, falta de leis municipais de cultura, inexistência de público fiel, inquietação artística, tudo isso ajuda a explicar a migração para centros como São Paulo ou Rio. Reprimir esse movimento significa fortalecer culturalmente o Grande ABC.

Petrin e Sônia ficaram conhecidos no meio artístico por meio do Grupo Teatro da Cidade, de Santo André, que durou de 1968 a 1978. “A companhia não mantinha atividade constante durante todo o ano e as pessoas precisavam ir à cata de outros trabalhos. Aos poucos, o grupo foi se exaurindo”, diz Petrin.

Para a diretora de Cultura de Santo André, Marta de Betânia Juliano, a migração é natural: “Há um desejo artístico de buscar novos horizontes. A partir de certo ponto, as coisas não dependem do poder público, cujo papel é criar projetos de formação e democratização cultural”. Diretor do Departamento de Teatro de São Paulo, e ex-secretário de Cultura de Santo André, Celso Frateschi concorda: “É difícil brecar esse movimento por causa do poder de atração da capital”.

José Armando Pereira da Silva, mestre em Teatro com uma dissertação sobre o Grupo Teatro da Cidade, aponta a proximidade com São Paulo como problema sério. “O ator que quer viver de teatro está sujeito ao mercado de trabalho, que é complicado”, diz. Para ele, a criação de uma companhia estável financiada é uma alternativa: “Um exemplo é a que o Sesi mantinha com a direção do Osmar Rodrigues Cruz”.

É justamente essa a batalha que Milton Andrade trava atualmente. O ator de São Caetano prepara um projeto “para arrebanhar gente jovem e fixá-la na região”. Se o projeto cair nas graças de alguma Prefeitura, entidade ou empresa, um texto de William Shakespeare marcará o início das atividades do grupo.

O ator Manuel Filho é de São Bernardo. “Profissionalmente, São Paulo é mais interessante, é lá que rolam os testes”, diz. Foi em um deles que conseguiu o papel de Nicolau Coelho em Os Lusíadas, produção de Ruth Escobar. “Espero que com o projeto Nova Vera Cruz as coisas melhorem”, afirma. Patrícia Franco, de Santo André, também está no elenco de Os Lusíadas. Ela vê na questão educacional uma das causas da falta de público nas salas. “Falta uma preocupação do Estado com a cidadania. A arte também pode dar um caminho legal para crianças carentes”, diz.

Zécarlos Machado, do Grupo Tapa, formou-se na Fundação das Artes nos anos 70. Saiu de São Caetano por causa de “questões econômicas, espaço de trabalho”. Fez um teste no Rio para O Homem de La Mancha e atuou ao lado de Bibi Ferreira, Grande Otelo e Paulo Autran. Jonas Bloch, que na década de 70 lecionou na Fundação das Artes e dirigiu o Tear (Teatro de Arte), em Santo André, leva em consideração a inquietação: “Chega um momento em que é preciso variar. Fui para o Rio sem um projeto, mas logo a Fernanda Montenegro me convidou para fazer É..., do Millôr (Fernandes)”.

A andreense Jerusa Franco e Vanessa Gerbelli, de São Bernardo, começaram suas carreiras em São Paulo. “Se houvesse a ELT na época, teria ficado”, diz Jerusa. “Em São Paulo há mais oportunidades”, afirma Vanessa. O diretor do Grite (Grupo Imes de Teatro Experimental), Kleber di Lázzare, cita outro problema: “O público do ABC prefere espetáculos de São Paulo”.

Sérgio Pires, ator e autor de Santo André, define a situação: “Como disse o (Luís Alberto de) Abreu, a única arma do artista é a própria arte”. James Silva, da Cia. Quartum Crescente, de Mauá, de certa forma, concorda: “Sobreviver de arte no Brasil é uma batalha”.




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