Um dos grandes nomes da música popular brasileira, precursor da bossa nova cuja estética uniu depois a ritmos caribenhos, o pianista, arranjador, cantor e compositor João Donato morreu na madrugada de ontem, aos 88 anos, no Rio de Janeiro. Ele estava internado com pneumonia na Casa de Saúde São José, no Humaitá, e foi intubado no dia 6 de julho.
Há cerca de um mês, Donato cancelou sua participação em show em Los Angeles, nos Estados Unidos, ao lado da cantora e compositora Joyce Moreno, já por problemas de saúde.
Parceiro de João Gilberto, Tom Jobim, Vinícius de Moraes e outros, João Donato foi um dos principais nomes da bossa nova. Ao longo da carreira, de mais de 70 anos, expandiu os limites da MPB ao fundir jazz, samba e outros ritmos latinos e caribenhos.
João Donato de Oliveira Neto nasceu em 17 de agosto de 1934 em Rio Branco, Acre. Compositor, pianista e arranjador, ele fez a primeira gravação em 1949, aos 15 anos, tocando acordeon, no disco de estreia de Altamiro Carrilho.
Em 1956, Donato lançou o álbum instrumental Chá Dançante, com versões para clássicos da música brasileira e sucessos da época, como Carinhoso, No Rancho Fundo, Peguei um Ita no Norte e Baião.
Foi um período que coincidiu com o surgimento da bossa nova, no qual ele teve grande influência. No Rio de Janeiro, tocou em boates e passou a ser chamado para gravar e fazer arranjos na Companhia Brasileira de Discos (CBD). Nos anos iniciais da bossa nova, costumava reunir-se com os amigos e parceiros Tom Jobim, João Gilberto e Johnny Alf em longas caminhadas pela zona sul do Rio, nas quais falavam sobre música e futebol.
Identidade
Foi com o álbum Muito à Vontade, de 1962, que Donato, acompanhado por um trio, começou a mostrar um som com mais identidade, além de canções próprias - como as bossas Sambou Sambou e Minha Saudade.
Apesar de ter nascido no norte do País, Donato teve contato mesmo com a música latina e caribenha quando decidiu ir morar nos EUA, na década de 1960. Ele queria conhecer de perto o jazz, gênero que sempre admirou, mas, por lá, teve contato com as orquestras latinas que tocavam em Los Angeles e Nova York. Essa influência marcaria sua música e tudo o que passou a produzir em seguida.
Ainda nos EUA, Donato gravou um dos álbuns mais cultuados de sua carreira, A Bad Donato, pela Blue Thumb Records, com arranjos do pianista Eumir Deodato, também estabelecido nos Estados Unidos. Foi Deodato quem levou a orquestra do músico americano Stanley Kenton para participar da gravação de A Bad Donato. Nesse trabalho estão faixas como The Frog e Cadê Jodel, que acompanhariam a carreira de Donato. No álbum veio à tona uma espécie de DNA da música verdadeiramente moderna feita por ele, mistura de bossa, jazz, música latina, funk americano e eletrônica, esta última por meio dos sintetizadores.
De volta ao Brasil, em 1972, Donato ainda não era um sucesso popular. A história começou a mudar quando suas canções instrumentais passaram a ganhar letras - no álbum Quem É Quem, de 1973, a música Ahie, teve letra escrita pelo compositor Paulo César Pinheiro.
Clássico
A partir daí ele passou a ser gravado por outros, sobretudo cantoras. Ainda em 1973, Nana Caymmi gravou Ahie. No ano seguinte, Gal Costa gravou The Frog que, com letra de Caetano Veloso, passou a se chamar A Rã - e se tornou um clássico da música brasileira. No mesmo disco, Gal gravou Até Quem Sabe e Flor de Maracujá, de Donato e seu irmão, Lysias Ênio.
Outro parceiro constante na década de 1970 foi Gilberto Gil. Juntos, fizeram Lugar Comum, Bananeira e Emoriô - grandes sucessos comerciais. Emoriô, inclusive, é frequentemente redescoberta e remixada por DJs, principalmente na Europa.
Com Gil, Donato compôs a canção A Paz, também chamada de Leila IV, lançada pela cantora Zizi Possi em 1987. Gil disse ter feito a letra ao visitar Donato em sua casa e vê-lo dormindo, em plena luz do dia. O compositor ainda se inspirou no livro Guerra e Paz, de Leon Tolstoi, para as contradições que a letra traz.
O último álbum lançado por Donato foi Serotonina, em 2022, seu primeiro disco de inéditas em duas décadas. Nele, o músico fez parcerias com nomes como Anastácia e Rodrigo Amarante.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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