O escritor, historiador, e jornalista Alvaro Vargas Llosa, de 56 anos, é um apóstolo do liberalismo e um crítico implacável da esquerda e do populismo na América Latina. Filho mais velho do escritor Mario Vargas Llosa, prêmio Nobel de Literatura em 2010, Alvaro tem dupla cidadania, espanhola e peruana, mas mora em Nova York e passa alguns meses por ano na França, de onde falou ao Estadão por videoconferência. Na entrevista, ele analisa a onda de esquerda que se propagou pela América Latina, tema de uma série de reportagens lançada pelo jornal.
O sr. é coautor de dois livros que ironizam a atuação e a mentalidade da esquerda na América Latina. Com vê a ascensão de governos de esquerda na região nos últimos anos e os militantes que os apoiam? O 'idiota latino-americano' ainda está vivo?
Sim, ainda está muito vivo. Ele tem a habilidade de reencarnar geração após geração. Agora, vai ficar no poder por mais alguns anos e vai causar muito prejuízo. O único jeito de impedir a volta do idiota é aprender as lições dos anos 1990, que abriram a economia da região, gerando uma dinâmica muito propícia ao crescimento e ao investimento. Infelizmente, não vimos nenhum governo de centro e de centro-direita na América Latina nos últimos anos se engajando em qualquer tipo de reforma. Temos de fazer muito melhor da próxima vez. Caso o contrário, o idiota continuará voltando, e voltando, e voltando.
Se o sr. fosse escrever um terceiro livro sobre o mesmo tema, com foco na atual onda de esquerda, que título daria?
Eu provavelmente o chamaria de O idiota (latino-americano) pós-moderno. Estamos agora na era do pós-modernismo. Eles se reinventaram. Agora, falam sobre os direitos dos "povos originais", da população indígena, e se tornaram defensores do meio ambiente e de políticas de gênero, dos direitos das minorias. Eles trouxeram a questão de gênero para o centro de suas políticas, mas são incapazes de dar um empurrão na América Latina para a modernidade e o desenvolvimento. Acredito que este é um ponto crucial: nós temos de julgá-los não pelos que eles dizem, pelo quanto se mostram na moda, mas simplesmente pela inabilidade que têm de promover o desenvolvimento. Esta é a questão crucial.
Que efeitos o sr. acredita que essa onda de esquerda pode ter na América Latina nos próximos anos?
Será mais um completo fiasco, a não ser que eles traiam as suas próprias ideias. Isso pode acontecer. Nós já vimos pessoas da esquerda traírem suas ideias. Agora, já estamos vendo uma retaliação contra esses governos por parte das pessoas que votaram neles. Em vários países governados pela esquerda. os governantes se tornaram extremamente impopulares. Até o presidente do Chile, que não é um dos esquerdistas mais radicais da região, apesar de ter sido uma das pessoas que lideraram a revolta contra o bem-sucedido modelo social e econômico chileno, tornou-se uma figura impopular, em um período muito curto de tempo.
Muitos líderes dessa nova onda de esquerda na América Latina foram eleitos com o apoio do centro. Como o sr. vê a aliança do centro com a esquerda e a extrema esquerda na região?
Depende do país de que estamos falando. Não acredito que seja um fenômeno muito abrangente. Mas é verdade, aconteceu. Acredito que, em parte, isso tem a ver com o fato de que houve o surgimento de movimentos populistas de extrema direita e eles estão com medo de ser identificados como aliados desses líderes. Eles acham que vão pagar um preço maior se forem identificados com populistas de direita do que com populistas de esquerda.
Que efeito o sr. acredita que uma eventual vitória de Lula no Brasil pode ter nessa onda de esquerda latino-americana?
O Lula foi um dos principais instigadores de uma tragédia sofrida pela América Latina pelas mãos de demagogos de extrema esquerda, ainda que ele não fosse um deles. Ele era um demagogo, mas não de extrema esquerda. Ele deu seu apoio a toda causa antidemocrática na região. Ele foi uma força fundamental atrás de Chávez, um dos grandes aliados de Cuba e de Evo Morales, na Bolívia. Todo autocrata da América Latina naquela época contava com seu forte apoio. Então nós podemos esperar que o Lula, se venceras eleições neste ano, fará exatamente a mesma coisa, reforçando esse quadro na região. Mas ele não será capaz de salvá-los do próprio fracasso, exceto se eles mudarem de rumo.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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