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Classe operária é tema de mostra de cinema em SP
Por Alessandro Soares
Do Diário do Grande ABC
28/04/2003 | 18:40
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Sob a ditadura do proletariado na ex-União Soviética nos anos 20 e 30, surgiu a teoria da montagem, ou edição de cenas, técnica e arte exclusiva do cinema. O russo Sergei Eisenstein foi seu teórico e prático, levando a teoria às telas para os camaradas bolcheviques que tomaram ao pé da letra as máximas marxistas. Daí em diante, cineastas passaram a pôr mãos à obra enquanto a classe operária ia ao cinema, quando assistir filmes era um programa barato.

O filme de Eisenstein na mostra O Operário no Cinema, no Centro Cultural São Paulo, é A Greve (1926), seu primeiro. É uma produção muda sobre operários que se rebelaram contra maus-tratos na Rússia czarista pré-Revolução de 1917. Traz o frescor de Eisenstein ainda formulando sua teoria e registra o engajamento de uma produção amparada pela máquina estatal. A classe operária como massa de manobra de Stálin, que governava em seu nome.

Em cartaz nesta terça-feira, a consciência da condição de operário e de classe trabalhadora permeia três filmes na mostra. Em A Classe Operária Vai ao Paraíso (1971), Palma de Ouro em Cannes, o operário interpretado por Gian Maria Volonté perde um dedo na prensa da fábrica. A luta sindical o chama, mas sua atenção também está nos atrativos da sociedade de consumo. Divisão tratada de modo espetaculoso pelo diretor Elio Petri.

O Homem que Virou Suco (1980) retrata outra tomada de consciência: a do imigrante nordestino do interior, marginalizado em sua luta para sobreviver na metrópole. Tempos Modernos (1936) é uma visão de Charles Chaplin do mundo operário, com a fábrica como o monstro desumanizante e o campo com seu atrativo bucólico como escape ideal.

A Árvore dos Tamancos (1978) na mostra A Classe Operária Vai ao Cinema, no Centro Cultural Banco do Brasil, não é tão condescendente sobre a vida no campo como Chaplin. Também contemplada com a Palma de Ouro, a história mostra como cinco famílias de arrendatários de uma fazenda italiana no fim do século XIX pena com baixos salários.

A força dos patrões em detrimento da união dos trabalhadores pesa na mostra. No CCBB, Sacco e Vanzetti (1971) relata a história dos anarquistas de origem italiana Nicola Sacco e Bartolomeo Vanzetti, condenados à pena de morte em 1927 pelo assassinato de dois policiais durante um assalto em Boston, nos Estados Unidos. É o maior caso de erro judicial do país, e um dos motivos seria o preconceito contra a influência de anarquistas no nascente movimento operário. Ficou proibido no Brasil durante vários anos.

Outra demonstração de choque de forças contrárias é A Queda (1978), no CCSP. Ruy Guerra e Nelson Xavier contam a história de um homem contra uma empresa, esta tentando abafar o caso da morte de um operário durante a construção do metrô, e aquele brigando para divulgar o caso publicamente. Ensaio de Orquestra (1979), no CCBB, parece meio fora da ordem, mas é um filme sobre a rebelião de músicos, que obviamente são trabalhadores, contra o regente de uma orquestra, que não deixa de ser patrão.

O ideal revolucionário surge em dois títulos. No CCSP, é A Mãe (1926), inspirado no livro homônimo de Máximo Gorki, sobre a mulher que toma o lugar do filho na revolução. É mais uma peça da propaganda soviética. O outro é O Velho (1997), no Itaú Cultural, biografia do líder comunista brasileiro Luiz Carlos Prestes (1898-1990), que encerra a semana com exibição no dia 1º. Trabalho ancorado na montagem de cenas de arquivo e depoimentos – a teoria de Eisenstein na prática –, resgata a história do esquerdista que se manteve no posto sem concessões, enfrentou oligarquias e só sucumbiu quando o próprio comunismo desmoronava na ex-União Soviética. Veio a nova ordem mundial, mas com as mesmas classes da velha.




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