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Era uma vez...mas a história mudou

Educadora e artesã, Elidy Moreira costura bonecas negras e personagens de contos ganham nova cor

Bia Moço
Do Diário do Grande ABC
05/09/2021 | 00:01
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Claudinei Plaza/ DGABC


Para pautar discussões raciais, a arte educadora e artesã Elidy Moreira da Silva, 41 anos, idealizou o projeto Cria Criôla, uma confecção de bonecas pretas de pano, costuradas por ela mesma, que utiliza para formação de docentes que terão de abordar o tema nas salas de aula. A pedagoga também tranformou personagens de contos famosos no intuito de quebrar o paradigma ‘de princesas brancas’, promovendo a representatividade afro entre os pequenos.

Moradora do bairro Cidade São Jorge, em Santo André, ela contou que a ideia surgiu quando passou a notar que os contos infantis e histórias em livros didáticos careciam de conteúdos que discutissem diferenças raciais. “Hoje já temos algumas histórias diferentes,mas, na época que eu estava na sala de aula, todas as princesas e príncipes eram brancos. Os livros pouco traziam informações sobre raças e o preconceito. Então passei a usar formas lúdicas para tratar este tema com as crianças”, relembrou Elidy, que além dos objetos de tecido, também passou a contar as histórias comuns, como a da Bela e a Fera, transformando os personagens em negros.

“Hoje uso minha arte para formar professores, e esses bonecos e bonecas tornam o assunto mais leve e divertido na hora que, em sala de aula, os docentes têm de tratar de discussões raciais”, explicou, relembrando que uma aluna negra disse a ela que não poderia ser a personagem Elsa, do filme Frozen, porque seu cabelo não era loiro e liso. “Precisamos mostrar para as crianças que todas elas são iguais, que não têm de ter estigmas de cor de pele e cabelo”, criticou.

De chaveiros a enfeites grandes, Elidy costura diariamente os personagens, que além da cor da pele, representam o cabelo, vestimenta e cultura afro. A artesã confecciona ainda Orixás em tecido, que reforçam a religião cultuada pelo povo africano, e que originou, sobretudo, o samba e batuque comuns do Brasil. Há ainda as bonecas Tilpas, que não expressam personalidade, já que não têm rosto desenhado, de maneira que a pessoa escolhe a boneca que mais se assemelhar. “Hoje faço por encomenda as bonecas, seja para professores ou pessoas que queiram ter. Confecciono também personagens conhecidos, mas de pele preta, como a Negra de Neve, Mulher Maravilha Negra, Bela Negra, que buscam a representatividade afro”, explicou.

Embora não seja negra, a educadora contou que seu bisavô era escravo e que seu sobrenome Moreira pertencia aos donos da fazenda em que ele foi escravizado. “Temos de buscar nosso passado e entender nossa cultura. Comidas, músicas, religiões. Tudo isso traz um passado da nossa história”, comentou a professora.

Embora tenha inciado a confecção para suprir a necessidade de materiais pedagógicos que contemplassem a identidade das crianças pretas, suas criações fizeram sucesso entre as escolas, professores e alunos, o que passou a gerar encomendas. Com tanta procura, há dois anos faz parte da Incubadora de Economia Solidária de Santo André.

Os itens são vendidos de R$ 9 a R$ 120, sendo que ela confecciona mais de 600 bonecas por mês. “Essa experiência de ter um ponto fixo dá todo o respaldo para o empreendedor. Aqui eu tenho um lugar seguro, tranquilo, com vitrine e com a possibilidade de conhecer o cliente, conversar, aprender sobre vendas, a calcular custo, a fechar caixa”, contou. A loja solidária fica no piso 1 do Atrium Shopping , em Santo André.
 




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