Especialistas alertam que falta de rastreamento genético oculta os dados; outras três cepas preocupam
Dados informados pela Secretaria de Estado da Saúde dão conta de que até 26 de maio foram confirmados no Grande ABC 14 casos de Covid-19 causados pela variante P1, também chamada de gama, mutação do novo coronavírus que surgiu em Manaus. Em março, a USCS (Universidade Municipal de São Caetano) anunciou a identificação de outros dez casos. O número representa 0,01% dos 191.164 registros que a região computava naquela data, mas especialistas alertam que os números são subnotificados, uma vez que falta o rastreamento genético dos exames. Não foram confirmados casos de outras variantes até o momento no Grande ABC.
Além da variante gama, circulam centenas de tipos de coronavírus no mundo, mas outras três cepas têm sido acompanhadas com mais atenção pelas autoridades sanitárias: a alfa, cuja origem é a Inglaterra, também conhecida como B1.1.17; a beta, originária da África do Sul e identificada como B1.351; e a delta, originária da Índia e identificada cientificamente como B.1.617.2. A decisão de chamar as variantes pelas letras do alfabeto grego foi tomada pela OMS (Organização Mundial de Saúde) no fim de maio.
O médico infectologista Bernardo Almeida explicou que três elementos devem ser levados em consideração para que uma variante seja classificada como de repercussão, ou seja, que inspira preocupação: a capacidade de transmissão entre uma pessoa e outra; escape do sistema imune, ou seja, a capacidade de infectar quem já teve a doença ou quem já foi vacinado; e a gravidade da doença em quem é contaminado.
No Grande ABC, especialistas já apontaram que a presença da variante gama, originária de Manaus, pressionou o número de casos e de mortes, especialmente entre os jovens. Em abril e maio a região registrou a maior incidência de óbitos desde o início da pandemia, totalizando 2.342 vítimas fatais em dois meses, 28%, ou mais de um quarto das 8.338 perdas registradas até o dia 9 de junho.
Almeida pontuou que no Brasil são realizados poucos sequenciamentos genéticos para identificação de variantes. Segundo a Secretaria de Estado de São Paulo, análises do Instituto Adolfo Lutz e do CVE (Centro de Vigilância Epidemiológica) encontraram 374 casos autóctones (ou seja, contraídos na região de residência) de três variantes (gama, alfa e beta), em todo o Estado, até 26 de maio. O número não computa os dez casos da variante gama que foram identificados em março, em São Caetano, por meio de parceria da Prefeitura, da USCS, da Fundação ABC e do IMT (Instituto de Medicina Tropical) da USP (Universidade de São Paulo).
Quando os casos de São Caetano foram tornados públicos, o infectologista e coordenador de pesquisa da USCS, Fábio Leal, alertou sobre a necessidade de ampliar o rastreamento genético. “Falta investimento para ampliação, mas, principalmente, falta articulação entre os governos para que seja feito trabalho eficiente de rastreamento”, explicou à época.
Bernardo Almeida alertou que não é apenas o sequenciamento genético que é feito de maneira insuficiente no País, mas também a testagem. Segundo o especialista, de 20% a 50% das transmissões ocorrem por pessoas sem os sintomas. “Se não incluo esses indivíduos na testagem, não controlo a pandemia”, pontuou. Almeida ressaltou que o esforço de vacinação precisa ser conjunto, não apenas em âmbito nacional, mas também global. “Países como Israel, que vacinou todo mundo, mas que ainda tem muitos países no entorno sem vacina, podem acabar tendo problemas com variante muito transmissiva”, completou.
O infectologista afirmou, ainda, que o cenário perfeito para surgimento de variantes é quando há muitos casos ativos, situação vivenciada em abril e maio considerando o total de casos no mundo, puxada principalmente pela Índia. “Pode haver outras (variantes) que ainda não foram identificadas”, sentenciou. A variante delta, originária da Índia, foi identificada no início de maio e tem capacidade de transmissão 50% maior do que o novo coronavírus.
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