Candidato à presidência do Ciesp (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo) e a vice da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) nas eleições marcadas para julho, Rafael Cervone, 53 anos, aposta na modernização como forma de enfrentar os danos causados pela pandemia de Covid-19. Ele crê em mudança radical nas relações com a chegada da telefonia 5G e espera que ocorra readequação da carga tributária. O empresário ainda dá um recado aos prefeitos do Grande ABC. Para vislumbrar o desenvolvimento “é preciso que trabalhem em sinergia, não concorrendo entre si”.
Como tem sido o planejamento para as eleições da Fiesp e do Ciesp?
Não é a mesma chapa, porque são características diferentes das entidades. A Fiesp é formada por mais de 130 sindicatos e quem vota são os delegados escolhidos pelos sindicatos. São demandas mais setoriais, onde precisamos ver mais o todo. No Ciesp há cerca de 7.000 associados, com os votos vindos diretamente da ponta. Em que cabem demandas também regionais, do micro e do macro desenvolvimentos. Sou candidato à presidência do Ciesp, com o Josué Gomes da Silva sendo o vice, e trocamos de cargos na disputa na Fiesp, com o Josué candidato à presidência e eu como vice.
Quais as suas principais propostas para as entidades?
Para a Fiesp, especialmente durante agora a pandemia da Covid-19, há questões ligadas à educação e cultura, que envolvem muito a atuação dos Sesis e dos Senais. É preciso fortalecer a formação do capital humano. Temos que debater isso com os diretores, de olho em perceber a adequação a uma demanda regional até uma mudança de parametrização de futuro. No Ciesp, entramos com proposta que chamamos de 5G, fazendo analogia ao impacto dessa nova tecnologia para os próximos anos. Nesses cinco pilares, o primeiro G é de ‘gente’. O maior patrimônio que temos são as pessoas e ainda vão fazer muito a diferença. O segundo ‘G’ vem de ‘gestão’. É preciso apoiar, trabalhar e modernizar cada vez mais a gestão, sendo mais dinâmico. A pandemia acelerou certos movimentos que vieram para ficar. Fazemos trabalho de casa para mostrar que é possível e que vale a pena. As entidades fizeram tremendos trabalhos, mas, daqui para frente, vão precisar dar um salto reinventando o modelo de negócios. O terceiro é ‘governança’, onde entra a responsabilidade sócio-ambiental, que vai permear a relação, principalmente, com o novo consumidor. O quarto mandamento é a ‘globalização’. Precisamos trabalhar fortemente uma indústria mais competitiva e temos um estudo, que mostramos ao governo, que aponta países que concorrem conosco, ressaltando as diferenças de custos efetivos que existe, incluindo o famoso ‘custo Brasil’. É uma diferença, hoje, de R$ 1 trilhão, em vários parâmetros. Vamos trabalhar a agenda competitividade. Já o último ‘G’ é o que chamamos de ‘gosto pela mudança’. Não adianta nada disso se as pessoas não estiverem a fim de mudar a cultura e isso não é fácil, mas necessário.
Quais os efeitos mais nocivos da pandemia para a indústria?
Um dos efeitos mais nocivos da pandemia da Covid-19 foi essa parada geral. Uma loucura. Vimos também uma crise de liderança aqui e no mundo. Não houve uma uniformidade de pensamentos e estratégias de como se combater a pandemia. No Brasil, foi ainda pior, porque vimos na Ásia, na Europa e nos Estados Unidos o caos do coronavírus acontecendo antes de chegar aqui. Poderíamos ter aprendido melhor com o que aconteceu lá fora e aproveitar um pouco da previsibilidade em como combater e lidar com a crise. Claro que é uma crise que nenhum de nós já viu. Ainda que o Brasil fez algumas lições de casa. Nas nossas entidades (Ciesp e Fiesp), nos reinventamos totalmente. A hora que os Sesis e os Senais pararam, por exemplo, imediatamente sacamos que temos restaurante e cozinhas industriais nas unidades. Pensando em como poderiam ser produtivas, produzimos 230 mil refeições por dia no ano passado, com cerca de 12 milhões de refeições em 2020. Demos continuidade, porque as pessoas começaram a passar fome. Usamos o know-how do Senai para capacitar sete indústrias automobilísticas, algumas no Grande ABC, para que elas pudessem consertar respiradores. Ninguém consegue se recuperar sem uma indústria, um serviço e um comércio forte. Foi quem mais sofreu.
O senhor avalia que haveria alguma forma de ter minimizado os danos causados pela Covid?
Acho que poderíamos ter tido mais atenção, principalmente no Estado de São Paulo. Não foi e não é momento de aumentar o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e mais de centenas de códigos tributários. Não precisava disso neste cenário. Tanto no governo federal quanto no governo estadual, a arrecadação de impostos em 2020 foi superior ao ano anterior, então não houve queda de ganho. Tivemos mais de 520 mil empresas que fecharam, entre janeiro e junho, no ano passado. Cerca de 50% das que quebraram são do setor de serviço, além do comércio, construção civil e indústria. É uma paulada a se pagar. Como se diz aqui em Santa Bárbara (D’Oeste): ‘não bastasse a queda, tem o coice’. As empresas, no ano passado, pagaram, em tributos e impostos, mais que o dobro do que tiveram de lucro na temporada. E o lucro foi zero, praticamente.
Como o senhor avalia as atuações dos governos federal e estadual?
Hoje, há uma carga tributária brutal. A indústria representa um pouco mais de 11% do PIB (Produto Interno Bruto) e leva nas costas mais de um terço da arrecadação total de impostos. Está desiquilibrado. Por isso a reforma tributária é importante, para tentar ajudar nessa balança. Estamos lutando intensamente e todos os dias em cima dessa pauta. Ela também precisa acabar com um problema sério de São Paulo, que impacta o Grande ABC, que é a guerra fiscal entre os Estados. Se temos um problema de dentro para fora do País, por falta de isonomia competitiva, há também uma guerra interna entre os Estados da Federação em relação aos benefícios fiscais, que São Paulo não tem. Isso arrastou empresa que ficavam na Capital e no Grande ABC para outros lugares. Se isso for equalizado, será ótimo. É preciso resolver esse manicômio.
Como o setor industrial está se preparando para a retomada pós-Covid?
O foco agora está na distribuição da vacina, porque não há retomada sem as pessoas. Retomamos empregos até janeiro e fevereiro deste ano e, na produção, quase atingimos o nível de pré-Covid nesse período. Daí em março e abril veio a segunda onda forte mesmo. O sobe e desce é muito ruim e deixa a sensação de não haver mesmo uma luz no fim do túnel. Com a chegada de mais vacinas temos mais esperança. Ainda vai ser doído este primeiro semestre, não tem como. Esperamos que no segundo semestre exista a volta de certa normalidade.
Em quanto tempo acredita que o País consegue se reeguer após o término da pandemia?
Acredito que o Brasil se recupera em curto e médio prazos. Infelizmente, nos dois últimos momentos onde o País vinha crescendo e se recuperando aos poucos, veio a Covid-19. Dentro da pandemia, quando estávamos nos levantando um pouco, veio a segunda onda. Vamos ter um crescimento de cerca de 4%, que é o mínimo que garante um crescimento substantivo para a economia e para o retorno de parte dos empregos. O que não precisamos é que as pessoas e os governos atrapalhem. Agora é um momento de sinergia. Não cabe mais, e a sociedade civil deve exigir isso cada vez mais, uma politicagem por nada. Temos que partir para a ação, para o trabalho. Esse pessoal precisa enxergar além de vaidades. A temperatura está esquentando nas cobrança.
O Brasil está próximo de avançar na questão da telefonia 5G. Como avalia esse avanço e o que espera?
A chegada do 5G no Brasil irá trazer uma mudança radical na forma como convivemos no dia a dia. A conexão dos celulares ganham força com a roupa, porque até agora não inventaram outra coisa que passe mais tempo em contato com o ser humano do que a roupa. O 5G é esse salto tecnológico. Irá marcar um acesso mais democrática à educação e à medicina em uma velocidade nunca antes vista. A implementação do 5G depende de embates políticos e ideológicos que atrapalham.
Quais são os principais obstáculos para o fortalecimento da indústria brasileira?
A readequação dos impostos é apenas uma das questões. A complicação vem ao longo de décadas. Temos que resolver problemas de infraestrutura, acelerar privatizações, cortar custos do governo, reduzir os impostos, diminuir a máquina estatal, fazer uma reforma administrativa para frear os gastos públicos, entre outras coisas. Também precisamos desenvolver melhor os portos, aeroportos e estradas, além de uma malha ferroviária. Sem esquecer de investimento em inovação e tecnologia. Também temos que readequar a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), principalmente depois da dinâmica de trabalho na pandemia. Ela foi feita décadas atrás como algo que garante o emprego, não que garante o trabalho.
O Grande ABC ganhou destaque como celeiro da indústria nacional, mas grandes empresas deixaram a região. Na sua opinião, por que isso ocorreu?
Muito da indústria, incluindo a indústria automobilística, por exemplo, deixou a região e o Estado de São Paulo, mas outras coisas chegaram. Aqui ainda é uma grande oportunidade. Temos que pensar, e isso é uma missão do Ciesp e da Fiesp, em como fazer do limão uma limonada. A indústria automobilística é detentora de inovação e tecnologia, por isso puxa toda uma cadeia de fornecimento. Há mais áreas para se fornecer e todas as mudanças abrem oportunidades. O desenvolvimento da cidade e da macroregião passa por encontrar essas portas a serem abertas. Mas para isso é preciso que prefeitos dos municípios trabalhem em sinergia, não concorrendo entre si.
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