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‘Meu papel é abrir oportunidades para mulheres negras’, diz Patricia Ferreira, vice de Diadema
Aline Melo
Do Diário do Grande ABC
11/01/2021 | 07:00
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Aos 47 anos, a empresária Patricia Ferreira, vice-prefeita de Diadema, é a primeira mulher negra a ocupar um cargo no Executivo da região. Iniciante na política partidária, Patricia espera ter papel atuante na administração e avalia que sua participação na campanha já mostrou que o governo será tocado igualmente por ela e pelo prefeito José de Filippi (PT). Empreendedora, umbandista e mãe solo, Patricia avalia que está abrindo caminho para que outras mulheres negras venham a ocupar cargos majoritários na administração diademense e se compromete a ser uma mãe para o município.

Como a senhora entrou na área política?
Não era uma pessoa da política partidária, apesar de, mesmo sem perceber, a gente acabar fazendo política todos os dias. Venho de uma formação de cabeleireira, por muitos anos trabalho com a indústria cosmética, fazendo workshops e divulgações, até que resolvi abrir um salão e logo depois uma escola, onde formo barbeiros, cabeleireiros, manicures e esteticistas. No ano passado, com a pandemia, fiquei fechada por diversos meses e todo dia recebia a ligação de profissionais que estavam em situação difícil por não poderem atuar. Eu me filiei (ao PT) no ano passado para poder pensar em políticas públicas para essa categoria. Inicialmente, ia buscar isso com uma candidatura a vereadora, para propor projetos dentro da área de beleza e cosméticos de Diadema.

O que te motivou a aceitar o convite para ser candidata a vice-prefeita?
A oportunidade de conseguir além do que já tinha como projeto, como vereadora. Os planos aumentam, as oportunidades também e por acreditar que é possível, que a gente deve ter não apenas uma mulher no cargo de vice-prefeita, mas também uma pessoa nova, politicamente falando, que possa somar com a experiência.

A senhora é a primeira mulher negra a ocupar um cargo no Executivo do Grande ABC. Qual a importância disso?
Total. Acho que é a oportunidade de abrir o caminho. Meu papel é justamente de desbravar, oferecer oportunidade para que outras mulheres negras possam assumir. Muitas têm total condição e conhecimento, também podem assumir um cargo como eu, mas talvez falte um pouco, não digo coragem, mas falte a essa mulher se enxergar. De repente, pela minha imagem, essas mulheres se vejam e também possam alcançar.

A senhora também é uma mãe solo, empreendedora e umbandista. De que forma tudo isso deve se refletir no seu trabalho como vice-prefeita de Diadema?
Vai refletir totalmente na questão de que, como mãe, gosto de cuidar. Espero que os outros filhos e as outras crianças possam ter o mesmo cuidado que dou para minha filha. Vou ser como uma mãe para o município. Como religiosa, acho que a fé e o foco vão entrar junto comigo dentro deste governo, de uma forma amorosa, de uma forma sem preconceitos, no qual a gente possa unir todas as religiões. Acho que com as pessoas se sentindo dentro de um coletivo é mais fácil para a gente alcançar os objetivos. A religiosidade vai entrar justamente para colocar a questão de uma cidade laica, onde as pessoas possam perder o preconceito. Quando a gente fala de religiões de matriz africana há uma certa tendência a isso. E com esse jeito, com esse carinho, vou poder colocar essas questões em pauta de uma forma que todo mundo possa se unir. Como empreendedora, é o que sempre digo, a gente precisa ter estudos, trazer oportunidades principalmente para os jovens e as crianças porque é a partir disso que vamos conseguir ter um País, um Estado e um município com menos desigualdade social.

A senhora não era uma pessoa da política. Como a sua filha está lidando com o fato de ter uma mãe vice-prefeita?
Ela está adorando, foi a minha principal incentivadora. Me preocupava com essa questão de ser mãe solo, de ter uma filha, como ia conciliar essas questões todas de campanha, de correria, de reuniões, com uma filha em período de estudo remoto. Quando eu levei essa conversa para ela, foi a primeira pessoa a me falar: ‘Mãe, vai! Você está esperando o quê? Vai, porque eu acho que é bacana.’ Então ela está enxergando isso de forma muito positiva, até porque é uma pré-adolescente muito politizada e essas ideias que têm hoje na cabeça, com certeza, vai poder se espelhar em mim e gerar lá na frente um outro nível de ‘Sara’, vamos dizer assim.

Há expectativa de que a senhora ocupe alguma secretaria de fato, além do cargo de vice-prefeita?
A expectativa que há é a de poder gerir tudo. Com olhar diferenciado, um olhar feminino, poder acompanhar todas as secretarias e fazer com que todas funcionem. Esse é o meu papel na chapa, dentro do governo como vice-prefeita, de ajudar o (José de) Filippi (Júnior, PT, prefeito) em todas essas questões, o substituir na sua ausência, mas principalmente, de poder acompanhar tudo, um pouquinho de cada secretaria, e ajudar para que todas funcionem bem.

Quais devem ser as áreas prioritárias de atuação logo nas primeiras semanas de governo em Diadema?
Acho que o primeiro ponto, indiscutivelmente, é a saúde. Pela condição que nós vivemos hoje da pandemia, da falta de estrutura, de organização dentro da saúde. É o primeiro pilar que vamos buscar. Mas, paralelamente a isso, vamos continuar com as questões da educação, porque é o que a gente sempre fala, o que o Filippi pontuou na campanha, que o melhor investimento que a gente faz é nas pessoas. Eu não enxergo outra coisa a não ser a educação, a geração de emprego, as oportunidades a se criar para que a gente possa ter uma vida melhor.

O último vice-prefeito de uma gestão petista, justamente o ex-prefeito Gilson Menezes (morto em 2020), chegou a reclamar que não participou ativamente do governo. Ele disse que se sentia um jarro ao lado de Mário Reali. Como a senhora pretende garantir que isso não se repita?
A minha garantia é pelo prefeito. O Filippi já carrega isso e quando me fez o convite, esperava que eu fosse uma vice atuante. Então, isso (escanteamento) não vai acontecer. Primeiro porque eu vou trazer oportunidades para que isso não ocorra e pelo próprio Filippi, que é uma pessoa atuante, do coletivo, que precisa de ideias, de novidades. A gente ouve muito pouco falar dos vices durante as campanhas e não foi meu caso. A visibilidade que o Filippi teve eu também tive, pude falar, participar de reuniões e pela campanha já dá para ter uma ideia de como será esse governo.

Como a senhora avalia a participação feminina na área da política?
Acho que está vindo em um crescente, as mulheres estão se colocando mais. Tivemos três eleitas, mas muitas candidatas, um sinal que estamos nos posicionando na vida política e a tendência é só aumentar, porque uma vai se espelhando no exemplo da outra, uma vai dando a mão para a outra e a possibilidade da gente alcançar mais sucesso de fato vem à tona.

Como incentivar mais mulheres na política partidária?
Dialogando o tempo todo. Colocando as mulheres junto do governo, pedindo a participação delas. Talvez as mulheres não percebam, mas quem mais faz política somos nós. Somos maioria na representatividade do eleitorado. É a mulher que vai procurar vaga na escola para os filhos, que vai ao hospital buscar atendimento médico para a família, que se preocupa quando os filhos, o marido, não chegam à noite em casa por causa da falta de segurança. Então a política tem que ser feita para a mulher. E tem que ter uma união entre homens e mulheres, porque nesse contexto de todo mundo junto a gente consegue alcançar muito mais coisas e ter mais sucesso.

Diadema é um polo cosmético, mas a região como um todo vive um grande processo de desindustrialização. Quais medidas a senhora avalia serem necessárias e possíveis de serem implementadas para o fortalecimento desse segmento da economia?
Conversar com as indústrias. Trazer oportunidade para que elas voltem a se instalar na cidade. Já tivemos um polo muito importante, não só dos cosméticos, mas da borracha, de autopeças e a gente precisa retomar essa conversa. O que aconteceu foi falta de diálogo e muitas empresas acabaram se mudando para outros municípios. A ideia é trazer oportunidades de incentivo, de melhoria na qualidade das indústrias na cidade, na melhoria da qualidade da vida da população se integrando à essas indústrias, então acho que o diálogo e a conversa vão ser os pontos iniciais para reintegrar essas indústrias na cidade.

Que leitura a senhora faz da situação do PT na região, que teve vitórias em Diadema e Mauá, mas derrota expressiva em São Bernardo?
A leitura que faço é que, em Diadema, o PT tem um legado gigantesco. A maioria das coisas que foram construídas na cidade foi obra do PT, foi obra do Filippi nas três gestões em que foi prefeito. Nossa retomada é justamente por esse legado. Mas precisa sim ter uma conversa e estimular as pessoas a entenderem da ideologia (do partido), do processo, porque foi instaurado um discurso do ódio e, às vezes, as pessoas nem sabem o que de fato aconteceu, mas esbravejam. Nosso processo vai ser de reconstrução. Voltar a falar de quais são os projetos, as conquistas, o que mais o PT pode trazer para a população de forma geral. Quando se abrirem essas conversas as pessoas vão começar a perceber o que de fato aconteceu, o que ainda pode acontecer e com certeza vamos ter essa retomada.

Ser vice-prefeita de Diadema é o começo de uma carreira política? Quais são seus planos para o futuro?
Essa é uma pergunta que ainda me faço. Sou cabeleireira, sou cosmetóloga, sou professora dentro da área, mas estou como política e estou gostando bastante. Acho que sim, pode ser uma possibilidade.

E o que você vislumbra em termos políticos?
Vislumbro primeiro o conhecimento. Acho que é a primeira coisa, a gente vai conhecer, entender, para depois pensar em outras coisas.




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