Setecidades Titulo Ocupação União
Despejo ameaça 200 famílias

Área em São Bernardo, que pertence à Emae, pode ser desocupada a qualquer momento; moradores cobram apoio da Prefeitura

Aline Melo
Do Diário do Grande ABC
11/12/2020 | 00:01
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DGABC


 Sem luzes, enfeites ou árvores de Natal. Entre os barracos e casas de alvenaria da ocupação União, na altura do número 53.038 da Estrada dos Alvarenga, em São Bernardo, o que sobra é o medo e a expectativa de viver uma desocupação, a qualquer momento. Cerca de 200 famílias vivem há mais de cinco anos em área que pertence à Emae (Empresa Metropolitana de Águas e Energia), às margens da Represa Billings, e desde o dia 26 de novembro convivem com a expectativa de serem obrigadas a deixar o local que chamam de lar.

Sem ligações regulares de água, luz ou esgoto, as pessoas que vivem ali têm, em comum, a alta vulnerabilidade social e a dificuldade de manter o aluguel. Foi o caso da estudante Monique Felix, 25 anos. Há cerca de dois anos, se mudou para a ocupação, com o marido e os três filhos. “Só meu marido trabalhava e a gente não conseguia pagar os R$ 700 pela casa onde morávamos”, explicou. “Agora, estamos nós dois desempregados, porque ele foi dispensado depois que teve Covid-19”, completou.

A falta de emprego também foi o que levou Josiane Santos de Oliveira, 33, a se mudar para a ocupação. Ao final de um contrato de dois anos na frente de trabalho, a munícipe não conseguiu outra renda e já não podia mais pagar o aluguel. “A madrinha da minha filha morava aqui e me falou que eu podia vir, que eles me ajudavam a fazer um barraco”, lembrou.

Quem também recebeu o apoio dos vizinhos para ir morar na comunidade foi Marcia Aparecida Camilo, 32. Antes de ir para a ocupação, Marcia chegou a morar na rua com três dos seis filhos. Hoje, sua casa é uma das mais precárias, e ela não sabe para onde ir com as crianças – entre 17 e 3 anos, além de um bebê previsto para nascer daqui a dois meses – se a remoção se concretizar. “Vamos voltar para baixo da ponte”, afirmou. Marcia é natural de Alfenas, Minas Gerais, e não tem familiares em São Bernardo.

O desemprego após acidente de trabalho também é uma situação comum entre os moradores. Edvan Rodrigues dos Santos, 28, e Alan José Cardoso, 23, sofreram acidentes com motocicletas. Santos usa muletas e foi dispensado do trabalho logo após o incidente. Um processo tramita na Justiça do Trabalho. Cardoso era autônomo e ficou sem assistência após quebrar as duas pernas. Atualmente, precisa usar cadeira de rodas. 

Presidente da associação de moradores, Uilson Carlos de Sá, 56, reconhece que as famílias estão em uma área invadida, mas destaca que as pessoas estão ali por falta de opção. “Ninguém está aqui porque quer. A gente não está se negando a sair, mas precisamos de ajuda, porque não temos para onde ir”, afirmou. “Se existe uma lei que diz que não podemos ficar perto da represa, vão ter que destruir vários bairros por aqui, inclusive aquele supermercado grande que tem aqui perto”, argumentou. 

A desocupação não tem data para acontecer, mas após a notificação recebida pelos moradores, pode ocorrer a qualquer momento, dependendo apenas de uma decisão judicial que autorize a ação.

Paço diz que não é parte na ação

A Prefeitura de São Bernardo informou que não é parte na ação que está sendo executada no local. Que, conforme compromisso firmado em 2013 com a Emae (Empresa Metropolitana de Águas e Energia), foi desenvolvido projeto habitacional aos moradores irregulares do local até aquela data. Atualmente, o projeto está em tramitação no governo federal e aguarda liberação de recursos para execução de obras, que ficarão prontas em 24 meses após a obtenção do recurso. A administração frisou que o controle de invasões na área após este período é de responsabilidade da Emae e do governo do Estado.

A Prefeitura de São Bernardo foi provocada em 2018 pela Defensoria Pública a prestar algum tipo de apoio aos moradores que ocupam a área da Emae, pois nesta data já havia decisão judicial em favor da proprietária do terreno pela desocupação. “A gente tem esses papéis, mas a Prefeitura não fez nada até agora”, relata a comerciante Edilza Soares da Cruz, 41 anos.

Os moradores entendem que a posse da área é da Emae, mas questionam se a Prefeitura não tem alguma responsabilidade com os moradores. “Nós vivemos aqui, nessa cidade. O prefeito, a primeira-dama (a deputada estadual Carla Morando/PSDB), também são pai e mãe, deveriam pensar nas crianças que estão aqui e não vão ter para onde ir”, completou o presidente da associação do bairro, Uilson Carlos de Sá, 56.

A Emae informou que a área citada é de proteção permanente, inclusive ocupando parte da área de cota da Represa Billings, um dos mais importantes mananciais da Região Metropolitana de São Paulo, e não pode ter moradias. Segundo a empresa, o local também oferece risco às famílias em razão de eventuais alagamentos por conta do aumento do nível de armazenamento da represa. O processo judicial para desocupação tramita na Justiça há quase 20 anos. A empresa afirmou que vai apoiar com transporte e armazenamento dos pertences, caso necessário, para cumprimento da determinação judicial. Em julho, o MP-SP (Ministério Público de São Paulo) recomendou à prefeitura da Capital que não fizesse desocupações durante a pandemia, mas desde o início do período crítico de contaminação por Covid-19 já houve desocupações na Capital e no Grande ABC.




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