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Crescem as ameaças contra a imprensa
Célio Franco
Do Diário do Grande ABC
16/12/2006 | 22:39
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Já são 107 jornalistas assassinados em 2006 em todo o mundo – quase o dobro das 58 mortes registradas em 2005 –, sem que o ano ainda nem tenha acabado. Guerras, crime organizado, narcotráfico, grupos armados políticos ou policiais e regimes ditatoriais são a maior ameaça ao exercício da profissão de jornalista e à liberdade de expressão e imprensa, segundo o relatório da WAN (World Association of Newspapers).

No Brasil, a ocorrência mais recente foi a morte do jornalista Ajuricaba Monassa de Paula, em Guapimirim, Rio de Janeiro, que provocou a condenação formal por parte da organização Repórteres sem Fronteiras. Ajuricaba, de 73 anos, trabalhava como jornalista free-lancer para vários sites e revistas, investigava o governo local e foi espancado brutalmente até o desfalecimento, em 24 de julho último, pelo vereador Osvaldo Vivas, faixa preta em artes marciais.

Muito ferido, o jornalista morreu na unidade de terapia intensiva do hospital onde foi socorrido. A ABI (Associação Brasileira de Imprensa) cobrou da governadora do Rio, Rosinha Garotinho, um inquérito aprofundado para apurar as circunstâncias exatas da morte de Ajuricaba Monassa. “Esse assassinato é covarde e abominável. Revela o incrível desprezo que os poderes políticos às vezes têm pela imprensa local”, afirmou, em nota, a entidade Repórteres sem Fronteiras.

Chamando a atenção de todo o mundo para a gravidade da violência contra jornalistas, o recente assassinato da repórter russa Anna Politkovskaya, no último dia 7 de outubro, provocou indignação e reação imediata de várias organizações de direitos humanos e de defesa dos profissionais de imprensa. Crítica declarada do presidente russo, Vladimir Putin, e da guerra na região rebelde da Chechênia, Anna foi morta a tiros no prédio em que vivia, na zona central de Moscou.

Conhecida por revelar os abusos de direitos humanos cometidos por tropas russas, Anna escreveu o livro Putin's Rússia (A Rússia de Putin), no qual critica o ex-diretor para assuntos externos da temida polícia política KGB. Entre as ameaças e agressões que sofreu, a jornalista também foi supostamente envenenada, ao tomar uma xícara de chá, quando se preparava para cobrir, em 2004, o cerco à escola de Beslan, na Ossétia do Norte, na Rússia, onde morreram mais de 330 pessoas. Vitaly Yaroshevsky, editor-adjunto da Novaya Gazeta, publicação onde Anna trabalhava, declarou que a primeira hipótese para o assassinato da jornalista era sua postura crítica em relação ao Kremlin.

No relatório da WAN deste ano, a Rússia aparece entre os países com maior registro de assassinatos de profissionais de imprensa, com três ocorrências. O Iraque lidera a lista, com 44 mortes, seguido das Filipinas (8), Guiana e México (6), Sri Lanka (5), Paquistão e Colômbia (4), e Rússia, Afeganistão e Venezuela, com três mortes cada um.

Nos últimos cinco anos, o Brasil aparece com a vergonhosa marca de oito jornalistas assassinados. O caso que mais chocou a sociedade brasileira e ganhou cobertura internacional pela covardia e brutalidade foi o assassinato do jornalista Tim Lopes, repórter da Rede Globo que investigava denúncia de exploração sexual de menores em festas patrocinadas por traficantes de drogas no Rio de Janeiro. Executado em junho de 2002 na favela Complexo do Alemão, o crime teve tons de crueldade e culminou com a queima do corpo do jornalista no dia 2 de junho daquele ano.

Em uma vitória da mobilização da sociedade e das entidades representativas de empresas e profissionais de imprensa, os traficantes que assassinaram Tim Lopes foram julgados e condenados no ano passado a penas que somaram mais de 150 anos de prisão. Elias Maluco, que comandou a execução, foi condenado a 28 anos e seis meses de reclusão. Os outros cinco envolvidos – Cláudio Orlando do Nascimento, o Ratinho; Elizeu Felício de Souza, o Zeu; Reinaldo Amaral de Jesus, o Cadê; Fernando Sátyro da Silva, o Frei; e Claudino dos Santos Coelho, o Xuxa – receberam a pena de 23 anos e seis meses de prisão cada. O último a ser julgado, Ângelo Ferreira da Silva, foi condenado a nove anos e quatro meses de prisão – pena menor pelo fato de ter colaborado com as investigações.

Mas o Brasil ainda foi manchete em 2006 na imprensa nacional e internacional com o seqüestro, no dia 12 de agosto, do repórter Guilherme Portanova e do auxiliar-técnico Alexandre Coelho Calado, funcionários da Rede Globo, por criminosos da facção PCC (Primeiro Comando da Capital). Na noite do mesmo dia, Alexandre foi libertado com a instrução de entregar à Rede Globo gravação de depoimento que deveria entrar no ar imediatamente. Um homem encapuzado aparecia na gravação lendo manifesto do PCC com críticas ao Regime Disciplinar Diferenciado, utilizado para isolar presos de alta periculosidade. Em meio ao clima de terror promovido pelo PCC, com rebeliões em presídios paulistas e cenas de selvageria nas ruas de São Paulo, o criminoso, em uma atitude arrogante, reivindicava mudanças nessa legislação.

Para preservar a vida do repórter, a Rede Globo divulgou o vídeo. No dia seguinte, Guilherme Portanova foi libertado. As entidades representativas dos veículos de comunicação divulgaram documento chamando a atenção para o fato de que, além de atentarem contra a integridade física de dois profissionais de imprensa, os criminosos colocaram um veículo de comunicação como protagonista da questão do crime no Brasil. Mas vitimaram, principalmente, a liberdade de toda a sociedade brasileira. Para mais informações acesse www.rsf.org 




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