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Banco Santos: Cid Ferreira pede cancelamento do leilão de parte de sua coleção
18/09/2020 | 07:17
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Ainda que o ex-banqueiro Edemar Cid Ferreira tenha pedido o cancelamento do leilão de parte de sua coleção guardada por 15 anos no Museu de Arte Contemporânea (MAC), deverá resultar infrutífero seu esforço. Cid Ferreira, ex-presidente do Banco Santos, em ofício enviado ao juiz Paulo Furtado de Oliveira, da 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais de São Paulo, pediu que o leilão da massa falida do Banco Santos, a ser comandado pelo leiloeiro James Lisboa a partir de segunda-feira, 21, e programado para durar 10 noites, seja cancelado, justificando que séries vintage de fotografias clássicas (Man Ray e outros), por exemplo, não poderiam ser desmembradas para não desvalorizar o conjunto - argumento usado anteriormente pela curadora de fotografia do MAC, Helouise Costa.

O leilão vai promover a venda de 1.972 obras destinada a juntar recursos para a massa falida da instituição financeira pagar aos credores. Dessas, cerca de 1.500 ficaram sob a guarda do MAC, vinculado à Universidade de São Paulo, que anunciou sua intenção de entrar com recurso no Tribunal de Justiça para o efeito suspensivo do leilão. De acordo com Ana Magalhães, diretora do MAC, o museu gastou o equivalente a R$ 20 milhões para armazenar, catalogar e manter sob seus cuidados o acervo por 15 anos. Uma decisão judicial do ano passado devolveu à instituição só R$ 37 mil (correspondentes aos recibos de despesas apresentados). Esse valor é insuficiente para que o MAC exerça seu direito de preferência no leilão, o que está garantido por lei aos museus.

Segundo Vânio Aguiar, administrador da massa falida do banco, nenhum museu até o momento manifestou interesse em participar do leilão. "O Instituto Brasileiro de Museus (Ibram) não tem orçamento para isso, é mais um desejo do que outra coisa", diz.

Com a atual crise econômica - e os cortes orçamentários do governo que afetaram consideravelmente o Ibram e os museus brasileiros -, dificilmente uma dessas obras será arrematada por uma instituição do gênero, a não ser que um mecenas compre peças no leilão e doe.

Doação é o que sugere Edemar Cid Ferreira em sua petição ao juiz, citando o nome de seis empresas devedoras da massa falida do banco que teriam condições de pagar cerca de R$ 4 bilhões aos credores. Os recursos financeiros trazidos aos credores pela liquidação das obras de arte são inferiores em relação à importância da coleção, argumenta o ex-banqueiro. Procurado pelo Estadão, Cid Ferreira não quis dar entrevista, mas reiterou o que disse em seu ofício enviado na segunda-feira ao juiz Paulo Furtado de Oliveira. Para ele, pelo menos a coleção de fotografias deveria ser doada ao MAC - que chegou a fazer exposições com esse acervo, cuja abrangência vai do surrealista Man Ray até os pioneiros da fotografia moderna no Brasil (Thomaz Farkas, German Lorca, Geraldo de Barros), passando pela fotografia de moda (Richard Avedon) e contemporâneos (Cindy Sherman, Joel-Peter Witkin).

Para o administrador da massa falida, Edemar estaria tentando "tumultuar" o leilão, pois o prazo para fazer petições já passou há tempos. "O MAC não recorreu ao juiz na época, não conseguiu comprovar os gastos de R$ 20 milhões com a manutenção do acervo e esgotou-se o prazo", diz. Não há, segundo Vânio Aguiar, a mínima possibilidade de ser aprovado o cancelamento do leilão agora. "E, além disso, Edemar não pode doar o que não é mais dele", conclui.

Essa é uma outra questão que surge naturalmente quando Edemar pede a doação das obras ao MAC. Por que razão um banqueiro que teve em casa mais de mil imagens que contam a história da fotografia - a coleção mais homogênea e coesa de todo o seu acervo - não fez essa doação quando era um banqueiro rico? Afinal, Edemar sempre apoiou grandes manifestações artísticas como presidente da Bienal. Trouxe ao Brasil importantes exposições como Os Guerreiros de Xian e os Tesouros da Cidade Proibida, Picasso e a grandiosa A Arte Russa. Cuidou pessoalmente da mostra Brasil 500 Anos e recuperou a Oca, no Ibirapuera, que estava abandonada. Edemar considera que esse pedido de doação ao juiz reflete o desejo de praticar esse gesto de doação que não foi esboçado no passado.

"Edemar virou vítima de uma situação que ele mesmo provocou", resume o leiloeiro James Lisboa que, respondendo à acusação de ter "esquartejado" coleções para vender obras de arte como bananas, afirma não ter desmembrado o acervo. "Elas (as fotos) vieram separadas - e tudo isso está no edital do perito, que provavelmente a professora (ele se refere à curadora Helouise Costa, autora da crítica) não leu."

Lisboa cita ainda outro caso, o do esboço da tela Operários, de Tarsila do Amaral, feito em 1933, e que foi encontrado entre os papéis guardados numa mapoteca do MAC em meio a outras obras menores. "Se é tão importante, por que o MAC não emprestou o documento ao Masp quando o museu fez a retrospectiva da pintora?", pergunta o leiloeiro. O desenho de Tarsila, que marca sua transição para a linguagem realista, tem lance inicial de R$ 32 mil, mas deve superar em muitas vezes esse valor, como a maioria das peças, cujos preços, fixados há 15 anos, não foram atualizados desde então. Uma escultura de Tunga (Primeiras Núpcias, de 1986) teve seu lance inicial fixado em R$ 46 mil, quando uma obra do mesmo porte do artista, morto em 2016, vale dez vezes esse valor.

Sobre o leilão (online e por telefone), do dia 21 deste mês a 2 de outubro, James Lisboa é categórico: as chances de ser suspenso são nulas. "O juiz Paulo Furtado de Oliveira é transparente: fez o que devia ser feito para resolver a questão da massa falida e pagar os credores".

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.




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