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Home office poderá gerar ação trabalhista

Especialistas apontam existência de conflitos de interesse entre empregados e empresas

Arthur Gandini
do Portal Previdência Total
05/04/2020 | 21:03
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Pixabay


Umas das principais alternativas para os trabalhadores de todo País em tempos de pandemia do novo coronavírus, o home office ou teletrabalho, poderá gerar conflito nas relações entre empregado e empregador no futuro próximo. Embora a prática já fosse usual pelas empresas brasileiras, o trabalho remoto passou a ser regulamentado pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) apenas com a Reforma Trabalhista (Lei 13.467) em 2017. Foi determinado que deveria ser estabelecido um acordo individual para o home office e que a instituição do modelo deveria ter a concordância do empregado. Já a Lei da Liberdade Econômica (Lei 13.874), no ano passado, conferiu ao funcionário a responsabilidade pelo registro da jornada de trabalho.

Entretanto, em março, a MP (Medida Provisória) 927 determinou que os contratos poderiam ser estabelecidos em até 30 dias após o fim da crise e que o teletrabalho poderia ser instituído sem acordo coletivo ou a concordância do trabalhador e que também não necessita mais registrar a sua jornada.

De acordo com especialistas, as mudanças no teletrabalho são exemplos de medidas do governo que se, por um lado facilitam as relações de trabalho durante a crise, também geram insegurança jurídica e devem resultar em uma nova onda de ações na Justiça do Trabalho.

“Os problemas que podem surgir em relação ao teletrabalho são em razão da impossibilidade de controle de jornada, pois futuramente o empregador pode pedir a compensação das horas não trabalhadas. Porém, o empregado pode não concordar, visto que durante este período se manteve à disposição do empregador”, explica Bianca Canzi, advogada especialista em direito do trabalho e sócia do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados.

A MP 927 determinou que o uso de aplicativos e programas de comunicação fora da jornada também não se caracteriza mais como ‘regime de prontidão ou de sobreaviso’, quando o trabalhador permanece à disposição da empresa, salvo previsão distinta em acordo individual ou coletivo. Enquanto durar o estado de calamidade pública instituído pelo governo, com efeitos até dezembro deste ano, as empresas poderão ainda fazer com que os empregados compensem as horas não trabalhadas após o fim da crise por meio de banco de horas.

A compensação deverá ocorrer em até 18 meses após o encerramento da crise, em comparação aos seis meses previstos hoje em lei, e poderá ser realizada mediante prorrogação da jornada em duas horas desde que observado o limite de dez horas diárias. Tanto o banco de horas como a compensação independem da concordância do empregado ou de entidade sindical.

Outro ponto da MP é que deverá ser oficializado no contrato de home office se houve empréstimo de equipamentos aos empregados e o reembolso de valores pagos por eles para a prestação dos serviços.

O advogado especialista em direito e processo do trabalho e sócio do escritório Anjos Ramos Advogados, Arnaldo dos Anjos Ramos, lembra que existem atualmente diversos programas que permitem o controle remoto de jornada, apesar de a MP dispensar o controle. “Caso (os empregadores) optem por não efetuar o controle da jornada, as empresas deverão estar atentas a todos os requisitos estabelecidos na legislação, para evitar ou ao menos diminuir o risco de futuros processos trabalhistas em que os empregados venham a pleitear o pagamento de horas extras”, orienta.

Na quinta-feira, o governo publicou a MP 936 que ofereceu alternativas às empresas para não demitirem durante a crise. Será possível que contratos de trabalho sejam suspensos ou que haja a redução de salários de forma proporcional à redução da jornada dos trabalhadores.

A remuneração dos empregados será complementada pelo governo de forma total ou parcial até o limite do teto do seguro-desemprego, atualmente em R$ 1813.

Regras definidas resultam em insegurança jurídica

As novas regras, assim como as demais já anunciadas pelo governo, devem gerar insegurança jurídica devido ao fato de terem prazo de validade. O Congresso Nacional tem até 120 dias para alterar ou transformar em lei os diversos pontos das medidas.

Outra questão é como as novas regras serão analisadas pelo Judiciário. “Mesmo com a existência de uma Medida Provisória que supra a concordância do empregado, a questão será debatida nos tribunais, caberá saber como o TST (Tribunal Superior do Trabalho) se posicionará”, afirma Cristiano Baratto, sócio do escritório Cristiano José Baratto & Advogados Associados.

De um modo geral, as novas regras têm levado as empresas a repensarem as relações de trabalho durante a crise.

Na opinião do advogado especialista em direito do trabalho e sócio do escritório BFAP Advogados, Fernando Almeida Prado, as medidas do governo foram positivas no atual cenário, mas tiveram como efeito colateral o enfraquecimento dos sindicatos ao determinar que acordos individuais passaram a prevalecer sobre os acordos coletivos. “A MP 927 agiu bem de permitir que as empresas convalidem suas práticas posteriormente. Os grandes prejudicados são os sindicatos, que deixaram de ser intermediários obrigatórios nesta relação”, analisa.

A Medida Provisória do governo também desobrigou as empresas de realizarem exames periódicos dos trabalhadores e postergou o prazo dos exames demissionais dos atuais dez dias para 60 dias, o que pode dificultar a comprovação de doenças ocupacionais. Tal ponto pode ser um problema para a saúde dos trabalhadores, afetada pelo isolamento social. “Ao dispensar os empregadores de realizar os exames, a MP acaba por aumentar significativamente os riscos correspondentes à manifestação de doenças ocupacionais e de acidentes de trabalho. Sem tais investigações, os empregadores não terão dados que os permitam averiguar a eventual sensibilidade dos trabalhadores a certos fatores físicos”, alerta Paulo Lemgruber, advogado trabalhista e sócio do escritório Mauro Menezes & Advogados. 




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