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Impasse segue 70 dias após Ford fechar portas

São Bernardo e Estado, que prometeram solução, agora pouco se manifestam sobre o assunto

Yara Ferraz
Do Diário do Grande ABC
08/01/2020 | 07:23
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Denis Maciel/DGABC


Exatamente 70 dias após o encerramento das atividades Ford em São Bernardo, o destino das negociações envolvendo a venda do parque fabril seguem indefinidas. Apesar de ao longo de quase todo o ano passado haver conversas na tentativa de selar acordo, envolvendo diretamente a Prefeitura de São Bernardo e o governo do Estado de São Paulo. o destino da planta que ocupa imóvel no bairro Taboão há 52 anos segue incerto.

Desde o dia 19 de fevereiro de 2019, quando a Ford anunciou que sairia do mercado de caminhões na América do Sul e, portanto, fecharia sua unidade da região, onde três modelos eram fabricados, o prefeito Orlando Morando (PSBD) e o governador João Doria (PSDB) realizaram inúmeros anúncios sobre avanços nas negociações e promessas de que os empregos não seriam perdidos. Inicialmente, as negociações envolviam três interessados, o que foi reduzido a dois e, no fim do ano, após a Caoa avisar que as chances de adquirir a unidade eram remotas, surgiu a informação de que a montadora chinesa BYD, especializada em veículos elétricos, teria interesse em assumir o parque fabril para produzir caminhões movidos a eletricidade com objetivo de abastecer o mercado nacional e países vizinhos. A última declaração de Doria foi a de que a Caoa assumiria a planta. A de Morando, que havia conversado com a cônsul-geral da China, Chen Peijie, para estreitar relações com o País e ‘oferecer’ a fábrica da Ford.

Questionados sobre o impasse, o Estado, por meio da Secretaria de Fazenda e Planejamento, negou haver atualizações sobre o assunto. A Prefeitura não retornou à demanda do Diário. Assim com Ford, Caoa e BYD, que igualmente não se manifestaram.

REFLEXO NO EMPREGO

Enquanto o imbróglio continua, a Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores) divulgou ontem que o ano passado encerrou com 125,6 mil funcionários nas montadoras. Trata-se do menor nível desde 2015, quando 115 mil eram empregados nas fabricantes. Somente ao longo de 2019, foram eliminados 4.855 postos e, desses, 57,6%, ou 2.800, foram cortados em São Bernardo, com o encerramento das atividades da Ford.

De acordo com o presidente da Anfavea, Luiz Carlos Moraes, os números sofreram forte impacto do fechamento da operação de caminhões da montadora norte-americana. Perguntado sobre o tempo para o mercado absorver essa queda, ele falou sobre a mudança do perfil do emprego na indústria automotiva. “É uma decisão de cada empresa, a Anfavea não tem como avaliar se esses 2.800 trabalhadores, sendo que alguns se aposentaram, vão voltar a ter emprego. É uma mudança estrutural mesmo”, disse.

De acordo com Moraes, o crescimento dos postos de trabalho do setor só deve acontecer quando a produção recuperar níveis de anos anteriores. A associação projeta a fabricação de 3,16 milhões de unidades em 2020, o que representa crescimento de 7,3% em relação a 2019, mas ainda contabiliza diferença de 550 mil unidades em relação ao montante produzido em 2013 (3,71 milhões de veículos), ano em que as montadoras mantinham 135,3 mil profissionais.

“A gente entende que o crescimento no emprego só deve acontecer quando houver mudança de turno. Acho que o modelo de negócios está se transformando, assim como o de produção. Nós temos menor verticalização no nosso setor e várias companhias introduziram a indústria 4.0. Estamos dentro de um modelo de produção diferenciada. Então, vai ter crescimento de emprego? Sim, mas talvez não na mesma dimensão que vimos lá atrás”, afirmou.

Sobre o cenário do Grande ABC, Moraes afirmou que as fábricas “investiram muito em tecnologia, e a indústria está se adaptando ao novo mundo para continuar a ser competitiva no mercado global”.

Por outro lado, o executivo também destacou que o setor automobilístico traz postos de trabalho para outras demandas, especialmente no “segmento de serviços e no de mobilidade”. “Vai mudando o modelo de emprego, e pode ser que este modelo talvez não esteja mais na montadora, mas, sim, na locadora ou no aplicativo de transporte. Temos que olhar o emprego com outro olhar, porque essa mudança veio para ficar”, disse.

Além disso, o presidente da Anfavea também citou o impacto da crise na Argentina, que por ser o principal parceiro comercial do setor e da região, também teve forte contribuição para derrubar a produção em 2019, que cresceu apenas 2,3%, para 2,9 milhões de unidades. As exportações despencaram 32%, para 428,2 mil veículos. A expectativa é a de que haja redução de 11% nas vendas a outros países em 2020, aos 381 mil exemplares.

Devido à importância da Argentina e aos conflitos internos em países como Chile, Moraes acredita que não há “possibilidade de absorção do mercado.”

MERCADO INTERNO

A esperança do setor para este ano está calcada na retomada da economia e das vendas no mercado interno, com a recuperação da confiança do consumidor. A Anfavea está otimista com o cenário doméstico e projeta aumento de 9,4% nos licenciamentos.

Neste contexto, segundo Moraes, a expectativa para a região é a mesma do que para a indústria como um todo. “Temos expectativa positiva no mercado interno e no Grande ABC há empresas com grande participação no mercado. Quanto à exportação, estamos mais conservadores em relação à crise da Argentina. E isso vai continuar impactando a região, porque as montadoras de lá são grandes exportadoras e enfrentam essas dificuldades”, disse. Portanto, o desafio às fabricantes continua. 

(Colaborou Soraia Abreu Pedrozo)




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