Queda é devido à reforma da CLT, que gera insegurança no trabalhador que deseja entrar com ação
Desde a implementação da reforma da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), cuja vigência completa um ano hoje, o número de ações trabalhistas caiu 36,7% no Grande ABC, passando de 48.302 para 30.574. Isso significa que, em média, 42 processos deixaram de ser abertos por dia. As informações são do TRT-2 (Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região) e foram levantadas a pedido do Diário.
Vale dizer que os dados regionais estão em linha com os nacionais, onde, segundo o TST (Tribunal Superior do Trabalho), a quantidade de processos desse tipo reduziu 38% – caindo de 2,2 milhões para 1,4 milhão.
Das sete cidades, São Bernardo é responsável pelo maior descréscimo (41,3%) e pela maior quantidade de ações. Para Ruslan Stuchi, advogado trabalhista do Stuchi Advogados, isso acontece pois o município conta com a maior concentração de empresas, como montadoras, e, consequentemente, o maior estoque de empregados.
Um dos principais motivos para a redução é o pagamento de valores processuais, tais como honorários de sucumbência e taxas. “Atualmente, a pessoa só ingressa na Justiça quando há grande possibilidade de êxito, já que deverá arcar com os custos em caso de perda total ou parcial do processo, diminuindo a quantidade de ações aventureiras”, avalia Roberta Cavalcante e Silva, advogada trabalhista do Correia da Silva Advogados.
“O trabalhador tem medo de ingressar com processo e acabar saindo prejudicado”, afirma Stuchi. “Às vezes, ele (o trabalhador) acha que não tem provas testemunhais ou documentais suficientes, então opta por não procurar a Justiça por não ter como pagar os custos processuais da outra parte.”
O especialista assinala que essa medida deveria ser considerada inconstitucional, uma vez que todo cidadão tem direito ao acesso à Justiça. “Temos ações neste sentido correndo (na Justiça) hoje, mas até chegar ao STF (Superior Tribunal Federal), muitas pessoas serão prejudicadas.”
Além disso, a incerteza em relação à jurisprudência também foi responsável pela queda desse tipo de ação. “Muita gente está em compasso de espera pois ainda há certa insegurança em relação às decisões dos tribunais. Ninguém sabe se o responsável pelo julgamento irá fazê-lo conforme o contrato antigo ou não”, explica Roberta.
Em alguns casos, como o direito processual – que abrange os honorários de sucumbência –, há instrução normativa do TST para que todos os processos sejam julgados de acordo com as novas leis. Porém, para as regras do direito material – que inclui direitos e deveres – não há direcionamento, observa a especialista.
“A reforma trabalhista diz que a vigência é imediata para ações ingressadas após 11 de novembro de 2017, mas isso significa que valeria apenas para processos distribuidos (ou seja, aqueles cujo juiz responsável já foi designado) após a data, mas não é o que acontece”, acrescenta Stuchi.
Roberta pontua que um dos principais aspectos positivos da alteração da CLT é a solução de conflitos sem a necessidade de acionar o Judiciário, com a abertura para a arbitragem e legalização do acordo extrajudicial. A modalidade também contribui para a redução do número de processos.
Governo Bolsonaro deve reavaliar pontos
Na avaliação dos especialistas, o governo do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) mostra-se favorável às leis trabalhistas em vigor. Entretanto, caberá a ele fazer os ajustes necessários para aumentar a segurança jurídica e extinguir pontos que geram ônus aos trabalhadores.
“Com certeza não haverá extinção da reforma trabalhista, mas essas mudanças demandam regulementações, como no caso do trabalho intermitente, cuja Medida Provisória que o regulamentava caiu”, explica Roberta Cavalcante e Silva, advogada trabalhista da Correia da Silva Advogados.
Ruslan Stuchi, advogado trabalhista do Stuchi Advogados, salienta que a hora de almoço – que pode ser de 30 minutos desde que o empregado saia meia hora mais cedo – e a possibilidade de grávidas operarem em áreas insalubres, além dos custos processuais, que devem ser arcados por quem perder a ação, devem ser revistas ou excluídas.
Outra questão apontada por Roberta é o imposto sindical, que deixou de ser obrigatório. “Tivemos um grande número de ações por parte dos sindicatos e as negociações trabalhistas ficaram travadas no período por causa da questão da taxa negocial. É preciso trazer uma solução para o financiamento dessas entidades.”
Por outro lado, a advogada Cíntia Fernandes, do escritório Mauro Menezes & Advogados, avalia que os principais desafios, em relação as regras trabalhistas, consistem em estabelecer diretrizes para uma relação de emprego pautada na valorização do trabalho, com garantias de segurança, saúde e bem-estar.
Em sinergia, Stuchi completa que a demissão em comum acordo, por exemplo, pode prejudicar o funcionário. “Esse acordo entre as partes não é positivo na maioria dos casos pois há certa imposição do empregador para que o trabalhador renuncie a alguns direitos.”
Mudança na lei não faz geração de empregos subir conforme esperado
Em julho de 2017, quanto a reforma trabalhista foi aprovada, um dos principais objetivos, segundo o governo, era a geração de empregos. Henrique Meirelles, então ministro da Fazenda, chegou a projetar criação de 6 milhões de postos no País.
Entretanto, Jefferson José da Conceição, coordenador do Conjuscs (Observatório de Políticas Públicas, Empreendedorismo e Conjuntura da Universidade Municipal de São Caetano), avalia que “não chegamos nem a 30% disso”. “O que faz gerar emprego é investimento, consumo e exportações. As contratações são feitas apenas quando a economia retoma.”
“A aceleração econômica não envolve a reforma trabalhista”, afirma Ruslan Stuchi, advogado trabalhista do Stuchi Advogados. “Com ela, há maior instabilidade pois os contratos são mais precários”, analisa. “Além de tudo, os novos contratos podem fazer a massa de salários cair”, completa Conceição.
Para o Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), até setembro, o saldo (diferença entre admissões e dispensas) de trabalhadores é positivo em 719 mil vagas, número 1,9% maior do que no mesmo período de 2017.
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