Gianni Vattimo é um nome pouco conhecido no Brasil: italiano, professor da Universidade de Turim, como todos os outros autores que estamos estudando nessa segunda versão dos Seminários Avançados ensinou em diversos centros de ensino superior do mundo, talvez ecoando a máxima, pós-moderna e mesmo assim gasta, de que vivemos em um mundo globalizado. Melhor, no entanto, do que tentar estimar a razão de Vattimo ser tão pouco discutido no Brasil, é notar que entre os filósofos contemporâneos ele é um dos que melhor conseguiu instalar os problemas da pós-modernidade no interior de uma lógica organizada e, assim, limpar um pouco o terreno nebuloso em que pisamos.
Na conferência que realizou no Rio de Janeiro, em agosto de 2000, Vattimo listou quatro características que descreveriam o nosso tempo: a) o domínio dos meios de comunicação de massa; b) a noção de que a história é um dado retórico (por isso Vattimo, em grande parte de seus textos evoca o famoso anjo de Walter Benjamin); c) a visível difusão de culturas múltiplas; e d) o cabal fim da consciência como um dado acabado. Reunindo essas características, o mundo contemporâneo apostaria em uma "verdade fraca", em que o caráter de transitoriedade está de uma vez por todas no centro da organização das tantas possíveis ordens a que estamos sujeitos (a conferência está publicada pela editora Lacerda).
Vattimo nota ainda o detalhe paradoxal de que a difusão dos meios de comunicação de massa não foi acompanhada pela noção de que tais meios, ou quaisquer outros, não são neutros. Para um italiano, que apenas há poucos dias viu seu país (notemos um detalhe: um país de primeiro mundo cuja educação formal é bastante desenvolvida) livrar-se do governo de um magnata das comunicações, a hipótese de que os meios de massa dominam as relações humanas é evidente.
Com efeito, no Brasil, é essa uma das características que de longe nos mergulha na pós-modernidade. Sem dúvida nenhuma, a cultura brasileira cada vez mais é moldada a partir de fatores publicitários que constituem praticamente a inteireza dos meios de comunicação de massa. No nosso caso, porém, como tivemos uma modernidade incompleta, ainda não conseguimos enxergar a multiplicidade de culturas como um fator positivo: se não resolvemos ainda problemas básicos de infra-estrutura, como podemos esperar a boa convivência dos diferentes modos de viver?
De fato, a clareza de Vattimo ilumina um detalhe que não pode passar afastado das discussões que os Seminários levantam: como entender um pensamento que substitui outro se sequer conseguimos ainda completar organizações que já deveriam estar ultrapassadas?
O filósofo italiano nos vislumbra uma solução anunciando que a modernidade não será ultrapassada por meio de uma “superação crítica”. Ao contrário, só entraremos em um novo paradigma simplesmente enfraquecendo o anterior. Temos, assim, de aceitar que os valores da modernidade, ao contrário dos filósofos contemporâneos que falam em exagero, simplesmente convalesceram e ficaram fracos. A modernidade tornou-se pálida e raquítica.
Para nós, brasileiros, a hipótese é tentadora. Basta lembrar a irracionalidade da última sucessão de feriados para de fato concordar que vivemos em uma organização fraca. O problema, no nosso caso, é que de tal fraqueza simplesmente saem as desigualdades que, de novo, nos lançam em um tempo ultrapassado. Mais do que um paradoxo que invalidaria a filosofia de Vattimo, meu raciocínio aqui procura demonstrar que a sociedade brasileira é incompreensível e filosoficamente inverossímil. E, portanto, deve mudar urgentemente!
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