Os 45 mil servidores do Judiciário paulista prolongam uma greve que deixa os Fóruns do interior paulista às moscas
Os 45 mil servidores do Judiciário paulista prolongam uma greve que deixa os Fóruns do interior paulista às moscas e provoca caos jurídico na maioria das regiões do Estado. A paralisação foi deflagrada no dia 28 de abril, foi alimentada aos olhos passivos do Tribunal de Justiça e do governo do Estado ao longo de maio e junho e avança para o segundo semestre sem perspectiva de negociação. Os funcionários querem reposição salarial de 20,16% contra a proposta oficial de 4,77%. Não se vê uma ação de liderança no sentido de por fim ao impasse.
Que não se surpreendam as autoridades a respeito do movimento. No final do ano passado, o governo do Estado e a Assembleia Legislativa barraram judicialmente decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que mandou o Executivo adicionar cerca de R$ 2 bilhões ao orçamento do Poder Judiciário. A votação do orçamento chegou a ser suspensa por conta do recurso. Prevaleceu a decisão da Secretaria de Economia e Planejamento e o Judiciário ficou com o caixa vazio e sem jogo de cintura para flexibilizar as negociações com os servidores.
Houve corte de 38,7% no orçamento previsto inicialmente ao Judiciário, o que alterou em muito os valores destinados à folha de pagamento dos funcionários. A redução mexeu nos salários de oficiais de justiça, servidores que atendem no balcão e assessores de gabinete e de audiências porque, mantido o corte, o TJ teve dificuldades em assegurar reposição salarial correspondente a defasagem estimada antes em 14,69%.
A ação contra o governo do Estado havia sido provocada pelo Sindicato União dos Servidores do Poder Judiciário, para o qual os três poderes - Executivo, Legislativo e Judiciário - são independentes, possuem orçamentos distintos e um não pode interferir na gestão do orçamento do outro. "O corte é ilegal, o governador deve gerir apenas as verbas destinadas ao Executivo", manifestou-se a diretoria do órgão sindical, sem êxito.
Em anos anteriores do governo Serra, houve cortes fundos no orçamento do Poder Judiciário. Esgotados de bater na mesma tecla, os servidores tentaram reversão via peça orçamentária. Tentativa frustrada, restou o caminho do movimento sindical. Não foi uma greve anunciada?
‘Nostra culpa'
Carlos Henrique Abrão, juiz e doutor em Direito pela USP, escreveu no site especializado Consultor Jurídico: "A grave crise que assola há anos o judiciário paulista é um misto de letargia e leniência das instituições. Cabe no caso concreto o nostra culpa, pois o Executivo nunca se preocupou em melhorar as condições salariais ou estruturar as carreiras, o Legislativo somente agora aprovou plano que já chega tarde, e o Judiciário peca pela falta de planejamento". E mais: "Não é possível deixar de abrir canal de diálogo e pelo menos conhecer as reivindicações, uma vez que cumpre ao Estado e exclusivamente a ele equipar o Judiciário de recursos disponíveis para pagamento do quadro de servidores."
Casa arrombada
Com o estrago escancarado, o TJ propõe encaminhar projeto de lei com reajuste de 4,77% e reposição salarial de 20,16% na proposta orçamentária de 2011. Tarde demais. Os servidores não querem resolver o assunto antes do próximo Carnaval. É uma crise que vai sobrar para o próximo governador. Poderia ter sido evitada, se houvesse o tato da negociação no momento certo. Agora, só resta correr para evitar mais prejuízos. Para o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional de São Paulo, a greve do judiciário paulista pode atrasar em um ano os processos em tramitação. Em Rio Preto, o volume acumulado é tão grande que antes de um ano e meio não será possível colocar em dia o trabalho represado apenas no cartório distribuidor, segundo a presidente da OAB local, Suzana Quintana. Exagero? Em Piracicaba, o diretor do Fórum, Wander Pereira Rossetti Jr., diz que serão necessários "até seis meses" para colocar em dia os processos. Empresas estão sendo prejudicadas em seus negócios. Advogados não sabem mais o que falar a seus clientes sobre pendências. Contratos estão sendo adiados. A sensação é de que o ano parece já ter terminado para a Justiça e muita coisa vai ficar para 2011, provavelmente depois das férias forenses, ou do Carnaval.
Na Assembleia
O deputado Luiz Carlos Gondim (PPS) declarou-se favorável à greve dos trabalhadores do Judiciário e contrário ao desconto em seus salários por conta das paralisações e pediu solução dos problemas na Justiça "para o bem de toda a população do Estado". José Zico Prado (PT) disse que "nenhum funcionário gosta de fazer greve, e só faz quando não há mais recursos de negociação". E Carlos Giannazi (PSOL) foi além. Pediu uma CPI do Judiciário alegando que "falta transparência e democratização no setor".
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