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Área verde tem dias contados em Diadema
Elaine Granconato
Do Diário do Grande ABC
07/02/2010 | 07:02
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Um dos últimos espaços verdes que sobreviveram à intensa ocupação urbana está com os dias contados em Diadema. Três alterações no Plano Diretor votadas e aprovadas pelo Legislativo entre 2008 e 2009, a pedido do Executivo, excluíram o Sítio Miguel Reale, no bairro Serraria, do rol dos imóveis de Iphac (Interesse Paisagístico, Histórico, Artístico e Cultural) para atender interesse imobiliário. O local deve ser utilizado para construção de empreendimento popular - especula-se em 600 apartamentos.

Com as mudanças efetivadas sem alarde pela administração do PT, o terreno de 42 mil m² localizado entre as avenidas Dona Ruyce Ferraz Alvim e Nossa Senhora das Graças poderá abrigar empreendimentos - residenciais ou industriais. No entanto, representantes da ONG ambientalista MDV (Movimento em Defesa da Vida do Grande ABC) denunciaram o caso à Defensoria Pública do Estado de São Paulo por possíveis atos ilegais praticados pelo poder público.

O presidente do MDV, Virgílio Alcides de Farias, ambientalista filiado ao PV, aponta que as alterações no Plano Diretor da cidade não obedeceram os trâmites legais. "Qualquer alteração no uso, ocupação e características em imóvel de Iphac será precedida de análise efetuada pela Prefeitura e manifestação do Comdema (Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente). O que não ocorreu", afirmou, baseando-se na Lei Complementar 161/2002, Parágrafo Único e artigos 30 e 31.

A própria LOM (Lei Orgânica do Município), nos artigos 197 e 205, bem como o inciso 14 do Regimento Interno do Comdema estabelecem como dever da entidade manifestar-se sobre todo e qualquer projeto, público ou privado, que diga respeito às questões ambientais. "Audiências públicas sequer ocorreram para discutir com entidades e população afetada. Eu mesmo só fiquei sabendo disso em novembro do ano passado", apontou Virgílio.

O que foi confirmado pelo advogado Antônio Mendez Alvarez, integrante do Comdema pela Associação Comercial e Industrial de Diadema. "Não houve discussão de mudança de perfil da área. Tanto que ocorreu uma reunião extraordinária em novembro do ano passado. Consegui derrubar por um voto a votação pela aprovação do empreendimento popular no local", afirmou.

Em nota, a Prefeitura deu outra versão. Informou que "a revisão do Plano Diretor foi objeto de discussão pública e cumpriu todos os trâmites legais, inclusive com reunião extraordinária do Comdema dia 19 de setembro de 2007".


Ex-prefeito Filippi tinha projeto para parque

 
O ex-prefeito José de Filippi Júnior (PT) chegou a cogitar e anunciar na cidade a construção de um parque público no Sítio Miguel Reale, encravado em área 100% de vegetação nativa da Mata Atlântica. No entanto, para concretizar o projeto, a administração petista teria de comprar o terreno que pertenceu ao renomado jurista brasileiro Miguel Reale.

Indagada a respeito, a Prefeitura de Diadema não respondeu. Mas a intenção do ex-prefeito foi confirmada pelo vereador José Francisco Dourado, o Zé Dourado (PSDB). "Em um primeiro momento, o Filippi queria transformar o local em parque. O que faltava, segundo a Prefeitura, era recurso para comprar o terreno", contou o tucano, que disse não se lembrar da votação de mudança no Plano Diretor desconstituindo o imóvel de Interesse Paisagístico, Histórico, Artístico e Cultural para atender interesse imobiliário.

E não poderia ser diferente. A mudança ocorreu exatamente às vésperas da campanha eleitoral de 2008, ainda no governo Filippi. Embora grafado como Área de Preservação Ambiental no Plano Diretor e que possibilitava a construção de parque, a Lei Complementar 273, de 8 de julho de 2008, promoveu a primeira alteração no uso.

E já com o prefeito Mário Reali (PT) no comando da cidade, é a vez de mais uma alteração na lei que dá as diretrizes gerais da política municipal de desenvolvimento urbano.

A Lei Complementar 287, de 8 de maio de 2009, altera o parágrafo 5º, do artigo 36 da lei 273: "O zoneamento das áreas de preservação ambiental poderá ter uso semelhante às categorias existentes no entorno, desde que, os proprietários doem ao poder público municipal, no mínimo, 15% do total da área preservada".

Ou seja, o entorno do Sítio Miguel Reale possui área mista, entre residências e indústrias. "Com a mudança, o local poderá abrigar até mesmo indústrias. Infelizmente, área verde não dá voto", alfinetou o ambientalista Virgílio Alcides de Farias. EG

 

Família de jurista vendeu terreno em 2008


"Fico extremamente chateado, porque muitas das árvores nativas foram plantadas ainda pelo meu pai (Miguel Reale)."Assim se pronunciou o ex-ministro da Justiça no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) Miguel Reale Júnior, filho do famoso jurista e professor de Direito, falecido em 14 de abril de 2006, aos 95 anos. Ele se referia ao fato de o sítio, que pertenceu à família durante décadas, se transformar em concreto armado.

Reale Júnior afirmou "desconhecer" as modificações no Plano Diretor. E o comprador (não foi revelado o nome) "teria garantido respeitar os limites da preservação ambiental" - são cerca de 2.800 árvores nativas e até um rio corre no terreno.

O Sítio Miguel Reale foi comprado pelo ex-jurista em 1946 no bairro Serraria. Acabou vendido pela família em 26 de agosto de 2008 para particular. O valor não foi informado pela assessoria do ex-ministro.

O Diário apurou que o montante foi de R$ 2 milhões. Assim que aprovada a mudança no Plano Diretor desconstituindo o sítio de interesse paisagístico, a Ballarin Imóveis, de Diadema, fez a proposta para compra. Na época, a própria Prefeitura não demonstrou interesse pela compra da área.

Depois, o mesmo terreno teria sido comercializado - fala-se entre R$ 8 milhões e R$ 10,5 milhões. O Diário procurou por telefone pelo proprietário da Ballarin, às 18h de sexta-feira, mas a atendente disse que ele havia saído às 17h30 e não tinha como localizá-lo.

Em nota, a Prefeitura confirma ser terreno particular e informa que "existe pedido de análise ambiental na Secretaria de Habitação e Desenvolvimento Urbano para verificar a viabilidade de empreendimento".

A reportagem esteve no local. Encontrou várias espécies da Mata Atlântica fechada, inclusive árvores de cerca de 30 metros de altura e frutíferas, como jaboticaba. Galinhas, marrecos, gansos e cavalos estão sob os cuidados do caseiro da chácara, Antonio Carlos Fonseca. "Seria muito triste ver tudo isso acabar", afirmou, com os olhos marejados. EG




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