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O humor sério de Caio Blat
André Bernardo
Da TV Press
05/06/2004 | 19:49
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  Caio Blat sempre se sentiu um tanto deslocado nos almoços de domingo. A exemplo do sensível Abelardo, de Da Cor do Pecado, que ousou ser maquiador numa família de lutadores de jiu-jítsu, ele é o único ator numa família de profissionais de saúde. O pai, José Lucínio, e a irmã, Camila, são fonoaudiólogos; a mãe, Kátya, e a outra irmã, Maria Fernanda, dentistas. “Fiquei de fora dessa tradição familiar. Mas na boa. Sem discriminação”, enfatiza.

Dona Kátya, porém, está longe de lembrar a Mamusca da novela das sete da Globo. Foi ela quem levou Caio, ainda pequeno, para fazer os primeiros comerciais de TV. “Ela é a minha maior crítica. Se um personagem está muito parecido com outro, fala para caramba.”

A julgar por seu currículo, não há muita reclamação a fazer. “Já fui mocinho, sedutor, vilão. Agora, faço o esquisitão da casa. Deve ser horrível ficar marcado por um tipo apenas”, acredita. Apesar de já contabilizar dez anos de carreira – só de novelas –, Blat nunca interpretou um tipo assumidamente cômico antes. O máximo que conseguiu foi fazer um humor involuntário como o querubim Rafael de Um Anjo Caiu do Céu (2001). Na maioria das vezes, Blat assumia o papel do antigalã, que conquista o público pelo ar ingênuo e rosto de garoto. “Meu objetivo não é seduzir, mas emocionar as pessoas”.

TV PRESS – O Abelardo é o seu primeiro personagem cômico. Você concorda com quem diz que é mais difícil fazer rir do que chorar?
CAIO BLAT – Eu já tive algumas experiências cômicas antes, como em Um Anjo Caiu do Céu, onde havia uma graça que nascia da ingenuidade do Rafael. Mas, personagem cômico mesmo, o Abelardo é o primeiro. E a orientação que eu tive da direção foi fazer humor como se faz drama. Nesse sentido, resolvi conversar com alguns mestres da comédia, como Luiz Fernando Guimarães e Jorge Fernando. E os dois me disseram: “acredite no que você está fazendo. Faça o personagem de verdade. Acredite nele. Não faça careta, graça ou algo do gênero”. E é isso o que eu estou fazendo.

TV PRESS – Mas você esperava tanto alvoroço em torno da dubiedade sexual do personagem?
BLAT – Esse foi um dos grandes desafios que a direção da novela me impôs. Que eu não fizesse do Abelardo um homossexual. Que eu o mantivesse numa linha divisória, muito tênue, que oscilasse entre um lado e o outro. Mas sempre envolto em clima de mistério, suspense, indefinição. Será que ele é? Será que ele não é? Não sabemos. Mas e as cartas de amor que a gente não sabe de quem são? Até o fim da novela, devemos manter esse clima de mistério entre o homossexual e o que o pessoal já se habituou a chamar de metrossexual: o homem que se cuida, se depila, anda na moda, gosta de artes plásticas e balé. Em outras palavras, o Abelardo não é um personagem facilmente identificável. Nem profissional nem sexualmente falando.

TV PRESS – Na infância, você chegou a praticar judô. Há alguma outra afinidade com a cultura oriental?
BLAT – Sim, muitas. Há alguns anos, por exemplo, freqüento a sociedade taoísta. A primeira vez que me interessei pelo assunto foi na época de Um Anjo Caiu do Céu. Eu queria fazer um anjo que reunisse informações de diferentes correntes religiosas. Desde então, o Tao é um livro que anda sempre perto de mim. Agora, quanto às artes marciais, não. Dia desses, numa cena de luta contra os vilões, foi quase um sonho de criança que realizei. Quando moleque, via aqueles filmes do Bruce Lee e Van Damme e ficava em casa pulando em cima do sofá da sala. Gravar aquela cena foi como realizar um sonho de garoto.

TV PRESS – Mas como surgiu a idéia de buscar inspiração no horóscopo chinês para compor o Abelardo?
BLAT – Para compor o Abelardo, fui buscar inspiração em muitos lugares. Por curiosidade, no horóscopo chinês. E cheguei à conclusão que o Abelardo é de galo. No horóscopo chinês, o galo é um signo que vive sempre empinado, impondo o seu jeito de ser, a sua personalidade. Enfim, sempre cantando de galo. No meio daquela família caótica, ele é o único a ter horários e objetivos. Isso é bem característico do signo. Aliás, a personalidade forte é o que o Abelardo tem de mais bacana para passar para o público. Mesmo com aquela gangue de trogloditas em casa tentando anular a personalidade dele, o Abelardo faz de tudo para se impor.

TV PRESS – Você se destaca dos atores de sua geração por uma postura mais discreta, quase anti-social. Isso tem a ver com o taoísmo?
BLAT – Não. Tem a ver comigo mesmo. Trabalho desde muito moleque. A profissão, para mim, sempre foi sinônimo de estudo, preparação, concentração. A minha primeira novela, Éramos Seis, do SBT, fez muito sucesso. Fiquei famoso de cara. Naquela época, as pessoas já me paravam nas ruas para pedir autógrafo. Depois de algum tempo, isso passou. Mais adiante, veio a Globo. Hoje, você está no auge. Amanhã, pode não estar. É preciso estar preparado para encarar todas as fases de sua carreira. Por essas e outras, o meu maior objetivo nunca foi aparecer em revistas, ficar famoso etc. O mais importante para mim é o prazer que sinto ao atuar. É uma coisa minha mesmo.

TV PRESS – Esse ano, você completa uma década de novelas. Que balanço você faz de sua trajetória na TV?
BLAT – Eu nunca me senti trabalhando. É como se eu estivesse apenas desenvolvendo um hobby. Se a pessoa consegue desenvolver esse prazer de fazer o que gosta, é maravilhoso. Você não tem a sensação de que tem mais um dia de trabalho a cumprir e sim mais um dia maravilhoso e sempre diferente do outro a desfrutar. Eu vivo a vida como se estivesse a passeio. E, graças a Deus, trabalho naquilo que gosto. Não vejo minha profissão como um fardo, um compromisso. É claro que sou um profissional responsável, mas prefiro ver minha profissão como um hobby mesmo.




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