A campanha de trânsito oferecida por órgãos públicos paulistas neste maio visou conscientizar sobre o fator humano, gerador principal de acidentes. Seu tema, Foca no Trânsito, buscou identidade social, a partir de memes de redes sociais (http://www.saopaulo.sp.gov.br/campanhas/foca-no-transito/).
O maior problema no trânsito brasileiro é mesmo de ordem humana. O número elevado e a considerável severidade dos acidentes que envolvem embriaguez ao volante e excesso de velocidade são suficientes para comprovar a assertiva. Terminado maio, o bordão ‘Foca no Trânsito’ está em 17,4 mil sites contra 500 mil de ‘vamos tomar todas’ ou 3,3 milhões de ‘rachas’. Equivale a 3,5% e 0,5%, respectivamente. Infelizmente, ainda estamos longe do comportamento responsável na direção.
Vivemos em sociedade onde o motorista que ultrapassa em faixa amarela dupla contínua, em uma avenida sem visibilidade, é simplesmente aceito. Contudo, um motorista na exata velocidade permitida e que, aparentemente, segura o tráfego em trecho sem radar, é objeto da vaia de buzinas, de aceleradas de gigantescos veículos quase encostados em seus para-choques ou de lampejos de faróis de irritados motoristas.
A campanha teve seu ‘foco’ justificado por trocadilho com um simpático animal. Foca, designação comum a mamíferos focídeos, simpáticos animais que nutrem filhotes, enquanto irresponsáveis motoristas tiram vidas de crianças, em acidentes gerados pela pressa de chegar à casa ao fim do dia, tendo-as no colo em vez de cintos de segurança. Ao molhar o jardim de minha casa, passava carro com criança no colo do motorista, e este, sem cinto. Tive tempo de gritar alguma palavra de ordem. Em segundos, ouvi palavrões do motorista. Minha mulher, ao meu lado, levantou as sobrancelhas, num claro gesto de resignação.
Focas, uma vez na terra, empurram seus corpos sobre o solo, segundo movimento com suas patas no formato de flippers, garantido baixa velocidade, justamente o que se deseja no trânsito. A velocidade reduzida minimiza a gravidade dos acidentes. Salva vidas. Carros? Compramos outros, dizem conscientes motoristas.
Focas-machos se atraem na fase de reprodução. Evidências de maior produção de hormônios se associam à tensão e à agressão entre estes para chamar a atenção de determinadas fêmeas (http://www.seals-world.com/seal-reproduction/). Segundo a CET (http://www.cetsp.com.br/media/56546/btcetsp42.pdf), 50% dos ocupantes mortos têm entre 20 e 29 anos. A Lei Seca se inspira em trágicos acidentes com jovens embriagados. Rachas se marcam com profusão de jovens de ambos os sexos. Parece que o comportamento os aproxima de machos-focas. E não faltam hormônios. Quanto à forma do olhar, a campanha merece destaque. Focas, como seres humanos, têm seus olhos próximos. Animais caçadores com esta compleição física mais bem se concentram na presa. A perspectiva gerada pelo cruzamento das imagens no cérebro informa a distância. Os olhos laterais das galinhas permitem maior visão de campo na defesa contra predadores.
A teoria evolutiva, segundo Kark Changizi (http://hypescience.com/por-que-alguns-animais-tem-os-olhos-na-frente-e-outros-do-lado-da-cara), chama visão de Raios X a dos primatas. Quando se observa um ponto distante e se interpõe um dedo à frente dos olhos, este fica com imagem dupla e não tira a visão do ponto de foco, tal como se pudesse olhar através do dedo. Primatas, sob esta hipótese, pulam de galho em galho, sem errar, mesmo com outros galhos à frente.
Motoristas focam pontos à frente do veículo. A audição auxilia a informar sobre o campo lateral. Distraídos com o painel, ou focados em celular, estão próximos de acidentes. Se também ouvem música alta ou usam proibidos fones, há iminência da maior tristeza de pais. Solução? Educação.
Creso Peixoto é mestre em transportes e professor da FEI.
E-mail para esta coluna: cresopeixoto@gmail.com
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