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Corte de R$ 10 bilhões será insuficiente
Leone Farias e Soraia Abreu Pedrozo
16/05/2010 | 07:06
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Caio Arruda/DGABC


A intenção do governo federal, anunciada na última semana, de cortar gastos públicos para conter a inflação chega tarde e terá pouco efeito, já que o valor planejado de redução de R$ 10 bilhões nas despesas orçamentárias é insuficiente, segundo especialistas.

"A iniciativa do governo lembra um pouco aquela metáfora de se colocar uma tranca resistente na porta depois de já ter ocorrido o arrombamento. Só com uma redução drástica das despesas correntes teremos condições de equilibrar a economia", aponta Fabio Pina, economista da Fecomercio.

Pina defende que há a necessidade de ajuste muito maior do que os R$ 10 bilhões, independente dos resultados primários das contas públicas.

Também ainda há pouca informação sobre como se dará o corte dos gastos, medida que deverá ser detalhada no dia 31. E o plano é anunciado depois de o Banco Central ter iniciado movimento de elevação da taxa básica de juros (a Selic) - no fim de março, o BC elevou a taxa em 0,75 ponto percentual, para 9,5% ao ano.

Segundo o coordenador do curso de Economia da USCS (Universidade Municipal de São Caetano), Francisco Funcia, o aumento da Selic vai impactar em alta no pagamento dos juros da dívida pública do governo aos bancos. Cálculos da Tendência Consultoria apontam que a despesa do governo com juros crescerá em R$ 10 bilhões, chegando a R$ 179 bilhões.

Outro efeito da elevação dos juros é a retração da atividade econômica, já que os financiamentos tornam-se mais caros e o empresário pensa duas vezes antes de realizar um investimento. Com isso, a arrecadação de impostos tende a cair também, o que diminui a fonte de recursos do governo.

"O único que ganha com o aumento da taxa de juros é o mercado financeiro", aponta Funcia. Para o consumidor, o efeito deve levar seis meses para impactar em seu bolso, estima o coordenador, em relação ao aumento dos juros bancários e o encarecimento do crédito.

O professor Eduardo Becker, de macroeconomia da Esags (Escola Superior de Administração e Gestão), de Santo André, concorda que a alta de 0,75 ponto percentual tem pouco impacto imediato na ponta, ou seja, nos juros bancários. Para ele, a população não tem muito a percepção de aumentos nos juros, quando faz compras financiadas. "A pessoa analisa quanto cabe no bolso", afirma.

No entanto, há a expectativa de novas elevações na taxa básica, que pode chegar a 11,75% até o fim do ano segundo projeções de analistas do mercado financeiro.

Demanda - Funcia defende a contenção dos R$ 10 bilhões, alegando que o governo federal, com isso, está contribuindo com a sua parte. Por outro lado, alega que ao tentar esfriar o ânimo atual da economia, a medida pode surtir como um "balde de água fria" na demanda aquecida.

"O aumento dos juros é uma leitura superpreventiva. Mas, se a oferta de recursos do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) continuar crescendo - a liberação de recursos vem dobrando desde 2007 e cresceu 60% em 2009, em meio à crise -, significa que os investimentos estão aumentando e que vamos dar conta do superaquecimento da economia", aponta.

O delegado da seccional do Grande ABC do Corecon (Conselho Regional de Economia), Leonel Tinoco Neto, também considera importante a contenção de despesas do governo, para que o País se mantenha com estabilidade inflacionária. "Os gastos públicos têm sido uma das causas da inflação e não o aumento dos preços do feijão, que é questão passageira, ligada à safra", afirma Tinoco Neto.

Contraponto - Por sua vez, o professor Douglas Renato Pinheiro, coordenador do Curso de Economia das Faculdades Integradas Rio Branco, avalia que a elevação da taxa básica de juros é medida que surte efeito mais rápido para conter a inflação. "O corte de gasto público não surte efeito no curto prazo", avalia o professor, que também afirma que não está claro em que áreas o governo vai reduzir as despesas.

País deve crescer mais de 6% neste ano
Se há divergências entre os especialistas em relação às formas de controlar a inflação, há consenso de que o País deve ter bom crescimento este ano.

A perspectiva é de expansão do PIB (Produto Interno Bruto) - que é a soma das riquezas produzidas no País - superior a 6%, por fatores como crédito farto, a expansão da renda da população e taxas de desemprego relativamente baixas e estáveis. "E a produção industrial tem se recuperado em relação ao ano passado, quando caiu 7,6%", assinala Tinoco Neto.

A maré favorável ocorre apesar de incertezas no mercado financeiro internacional. Para o professor da Esags (Escola Superior de Administração e Gestão) Eduardo Becker,as dificuldades em países europeus, como a Grécia e a Espanha, geram oscilação nas Bolsas, mas por enquanto, tem pouco efeito na economia real (das empresas) no Brasil.

Capacidade - A pedra de toque, hoje, segundo ele, é o controle da inflação. A meta do governo é de que a taxa inflacionária fique em 4,5% no ano, com teto de 2 pontos percentuais (ou seja, podendo chegar a 6,5%). "A demanda muito grande traz a preocupação de que a oferta não acompanhe", afirma.

No entanto, para o professor Francisco Funcia, da USCS, o nível de capacidade instalada das fábricas ainda permite ampliar a produção, de forma rápida, sem que haja necessidade de altos investimentos.

Segundo ele, o único segmento com a capacidade instalada acima de 90% é papel e celulose. As demais estão na casa dos 80%. Portanto, há por onde expandir a produção de forma rápida para atender à alta do consumo, avalia o professor Francisco Funcia, da USCS.

O professor Douglas Pinheiro avalia que o problema atual é "crescer demais, sem ter estrutura". Ele considera que haverá descompasso entre os investimentos de longo prazo para ampliar a oferta e a inflação, no curto prazo.




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