Norma Bengell sempre ouvia da mãe que se ela nascesse homem ia ser barra-pesada. Mas a verdadeira dama do cinema brasileiro não precisou de atributos masculinos para se destacar. Muito menos precisou ser machona, como muitos pensam que ela é após ressurgir encarnando a Dona Deise da sitcom global Toma Lá Da Cá. Feminina e ousada, a artista foi vencendo barreiras na vida.
São exatamente reminiscências de sua história - muitas caídas no esquecimento - que a própria atriz levará ao palco por meio da peça Dias Felizes. Tem estreia prevista para o dia 26 e já está sendo ensaiada no Rio, onde mora.
A produção do espetáculo está a cargo da Cia. da Matilde, de São Caetano, e será encenada no Sesc Ipiranga. O grupo da região conseguiu concretizar o projeto ao firmar convênio com a Secretaria de Estado da Cultura. Convidada, Norma aceitou de pronto. A direção é de Emílio Di Biasi.
Por razões contratuais com a Rede Globo, a atriz não pôde conceder entrevista ao Diário antes de a emissora publicar sobre o assunto em seu site.
Norma Bengell firmou-se no cinema a partir de 1959 por ser uma mulher que unia a beleza e o talento ao destemor de dizer o que pensava e o atrevimento de quebrar barreiras para construir sua história, como a nudez que protagonizou em Os Cafajestes (1962), o primeiro nu frontal no cinema nacional.
Sua filmografia conta com mais de 60 produções. Ultrapassam as fronteiras do cinema tupiniquim e chegam a Hollywood e Itália - nesta última filmou com mestres como Fellini e Pasolini. Ainda, Norma dirigiu dois longas, Eternamente Pagu (1988) e O Guarani (1996).
A peça Dias Felizes é adaptada do texto homônimo do irlandês Samuel Beckett. A protagonista Winnie (Norma) está enterrada até o pescoço, recriando o presente, ao lado do marido, através de fragmentos de experiências anteriores.
"Essa peça já foi metáfora para vida de um casal, invasão de privacidade e solidão e, mantendo as intenções do texto, aproveito a possibilidade para recontar a história da Norma", diz o diretor. "Elas (Winnie e Norma) têm em comum os dias felizes de muito sucesso no mundo inteiro", afirma.
Recortes de filmes e história da vida da atriz são costurados ao texto de Beckett. Um documentário com depoimentos de pessoas que conviveram com Norma compõe a montagem.
Além das dez apresentações já garantidas no Sesc Ipiranga, a peça deve passar pelo Grande ABC. Érike Busoni, diretor da Cia. da Matilde, tem tentado junto à prefeitura de São Caetano, conseguir o Teatro Santos Dumont - até o momento sem sucesso.
A peça será um momento raro para ver Norma em ação. "Ela sempre foi mulher de ir à luta, mas já estava resolvida a parar de atuar", diz Biasi.
Cia. da Matilde muda perfil para 2010
Incluir Norma Bengell no currículo é o maior sinal dos novos rumos tomados pela Cia. da Matilde. O grupo de São Caetano completou seis anos neste mês e apresenta uma agenda ousada para 2010.
"Se conseguimos trazer um espetáculo com a Norma, podemos fazer muito mais pela cultura e obter retorno", acredita Érike Busoni, diretor da companhia.
Até 2008 a Matilde era organizada em forma de Associação. Em 2006, chegou a ter mais de 50 membros. No ano passado, abriu as portas de sua sede para apresentações culturais e sobrevivia com a renda captada na entrada e na venda de alimentos e bebidas.
Hoje, propõe-se a trazer atividades com grandes nomes das artes. A primeira oficina, de clown, acontece nos dias 6 e 7, com Bete Dorgam, doutora em Artes Cênicas e professora da USP (Universidade de São Paulo).
"A gente traz essa oficina para a qualificação profissional dos artistas da região. São grandes nomes com os quais a gente trabalha em São Paulo", comenta Busoni, que integra o grupo paulistano Folias.
O nome agendado para a próxima oficina é o do ator Ailton Graça, que ministrará o curso de interpretação para cinema em abril.
Para Busoni, o projeto do espetáculo com Norma Bengell, realizado em parceria com o produtor paulistano Alexandre Brasil, e os grandes nomes elencados para as oficinas, são a chance de mostrar para o poder público, para os artistas e para a população que o Grande ABC tem potencial para fazer arte de qualidade na região. "É possível e sabemos e acreditamos", afirma o diretor.
Uma das grandes dificuldades que Busoni enxerga na cultura regional é a falta de espaço e investimento para a concretização dos trabalhos que os grupos daqui fazem. "Fomos até a Secretaria de Estado da Cultura e conseguimos o dinheiro. Aqui no Grande ABC temos dificuldade de conseguir o teatro", comenta, exemplificando não ter conseguido ainda fechar um espaço para as apresentações de Norma Bengell na cidade.
"Temos a Fundação das Artes de São Caetano, a ELT (Escola Livre de Teatro) de Santo André, mas os artistas formados por elas onde é que vão trabalhar?", questiona.
A dificuldade dos próprios artistas em organizar-se, pela necessidade de manter um emprego paralelo para se manter, é outro problema apontado pelo diretor da Matilde.
Interessados em participar das oficinas e obter mais informações sobre as atividades da Cia. da Matilde podem entrar em contato pelo telefone 2759-1756.
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