Desde a época em que os Beatles vestiam roupas de couro preto, em 1962, e cantavam, em alemão, Komm gib mir deine Hand (I Want to Hold Your Hand) nos inferninhos de Hamburgo até a dissolução do grupo, em 1970, nunca antes um jornalista dedicou tanto tempo ao estudo das letras de suas 208 canções como o inglês Steve Turner. Seu livro The Beatles - A História por Trás das Músicas é não só um guia musical como um pequeno compêndio sociológico sobre o comportamento dos jovens nos anos 1960.
De um grupo que interpretava canções açucaradas no início de carreira, como PS I Love You (1964), a Revolution (1968), resposta desafiadora aos jovens burgueses que saíram às ruas, em maio de 1968, pregando a revolução maoísta, os Beatles enfrentaram as mudanças sociais e culturais do mundo sem medo de desagradar revolucionários ou reacionários.
O argumento de John Lennon, porta-voz político do grupo, era o seguinte: todos falam em destruir o sistema, mas acabam colocando um monstrengo pior em seu lugar. Revolution (do álbum branco) seria, então, a expressão máxima de sua visão política.
Dizia explicitamente que não contassem com ele nas barricadas, se fosse para engolir a velha história do sistema. E argumentava: "Os franceses não haviam inventado essa lenda de liberdade, igualdade e fraternidade? Ao que isso levou? À guilhotina. Os russos não colocaram o trem do marxismo para rodar? E ele não saiu dos trilhos?"
A revolução dos Beatles, segundo Turner, foi, assim, estritamente musical. A banda, diz ele, se notabilizou por ultrapassar os padrões de qualidade das gravações da época, incorporando em suas capas o que de melhor existia na arte pop e expandindo as fronteiras da música popular, ao absorver desde a influência do blues americano até a música concreta do alemão Stockhausen. Prova disso é Revolution 9.
Turner mostra, em seu livro, que muitas das canções dos Beatles não tinham sequer o peso alegórico que muitos fãs gostariam que tivessem. She's Leaving Home, do álbum Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band, faz uso de uma linguagem naturalista porque foi inspirada numa notícia de jornal, sobre uma jovem adolescente londrina de 17 anos que fugiu de casa. Em 1967, segundo o FBI, 90 mil outros jovens fugiram de casa. Era a tal da sociedade alternativa chamando a moçada.
A dupla Lennon e McCartney, sempre antenada, resolveu contar essa história. E criou um marco, o melhor disco pop do século 20.
Fã e mulher escrevem sobre John Lennon
Uma é a biografia escrita há quatro anos pela ex-mulher, John (Larousse). Outra, uma minibiografia dos Beatles escrita por um fã, Eu Conheci Lennon (Arx). Quase 30 anos após sua morte, Lennon, como se vê, continua o beatle mais lembrado e analisado. O livro de Cynthia Lennon, mãe de Julian, filho mais velho do cantor, tem prefácio do último, que já começa se queixando, ao afirmar que o líder da banda era intimidador o bastante para considerar sua mãe apenas uma "nuvem de fumaça" em sua vida.
Ressentida, Cynthia reclama das biografias de John Lennon, que a colocam em papel secundário. O casamento, assume a ex-esposa, foi uma mistura entre o cômico e o bizarro. Lembra que Lennon obrigou seu empresário Brian Epstein a tomar medidas para impedir que o pai do músico, Alf, lançasse o disco que gravou em 1965, e que todos os problemas do casal começaram nessa época, por causa do uso de drogas pelo marido.
Jerry Levitan, em Eu Conheci Lennon, confirma essa dependência e registra imagens do músico com os olhos vidrados, em 1969. Há na foto uma evidente intenção de provocar, mas seu livro deve ser lido como o de um beatlemaníaco adolescente, deslumbrado com o ídolo transgressor.
No entanto, o que interessa mesmo em seu livro é a entrevista inédita de Lennon, em que o músico, entre outros assuntos, fala do guru dos Beatles, o indiano Maharishi Mahesh Yogi. "Ele não era uma farsa", defende, para logo em seguida comentar que não sabia o que estava acontecendo quando gravou Revolution 9, a ponto de não se lembrar dos palavrões registrados na faixa mais polêmica do álbum branco dos Beatles.
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