Crise econômica impulsa procura por
SUS e sobrecarrega rede pública de Saúde
A fila para realização de consultas e exames na rede pública de Saúde do Grande ABC atingiu neste mês o surpreendente número de 339.589 agendamentos em espera. Impulsionada pela crise econômica enfrentada pelo País, a qual motivou a suspensão de convênio médico por parte das famílias brasileiras, a demanda reprimida de atendimento na região se tornou o ponto nevrálgico da Saúde para os atuais prefeitos. Sem dinheiro em caixa para contratações de profissionais especialistas e para promover aquisição de novos equipamentos, municípios têm recorrido ao suporte da rede privada para sanar a problemática.
O levantamento exclusivo feito pelo Diário considera número de pacientes na fila de espera de cinco municípios da região – Diadema e Rio Grande da Serra não retornaram os contatos. Nos dados repassados pelas prefeituras consta demanda reprimida de 190.558 consultas e 149.031 exames (confira abaixo números por cidade).
Enquanto a espera por uma consulta com médico especialista de plano de saúde não pode levar mais de 14 dias, segundo determinação da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), moradores da região que aguardam pelo mesmo serviço na rede pública sofrem com a fila que pode chegar a até três anos em determinadas especialidades. A própria União não estabelece limites para a espera de atendimento no SUS (Serviço Único de Saúde).
Dentre as especialidades com maiores demandas na região constam dermatologia, oftalmologia e ortopedia. A primeira, inclusive, possui fila de espera estimada em 23.881 atendimentos.
Em São Caetano, onde a necessidade por dermatologista atinge demanda reprimida de 7.700 atendimentos, a secretária de Saúde Regina Maura Zetone atribui a fila ao alto número de pacientes que buscam procedimentos estéticos. “Infelizmente, existem muitos profissionais que acabam encaminhando pessoas com foco que não é para o dermato e, sim, um cirurgião. Isso dificulta o trabalho”, relata.
A falta de profissionais em determinadas áreas também tem contribuído para o atual cenário. Exemplo desta situação é o caso de 6.883 pacientes que aguardam por consulta com ortopedista em Mauá. Com somente dois profissionais na área que atendem no Cemma (Centro de Especialidades Médicas de Mauá) e agendamentos abertos pelo Estado nos AMEs (Ambulatório Médico de Especialidades) do município e de Santo André, a Prefeitura encontra dificuldades para zerar sua demanda reprimida.
“Em alguns casos temos um quadro suficiente, mas a demanda cresce de maneira muito rápida. Algumas vezes, com casos que poderiam aguardar, mas acabam sendo encaminhados de imediato pelo clínico geral” , fala o secretário de Saúde de São Bernardo, Geraldo Reple, exemplificando a situação com a fila de espera para consulta com oftalmologia no município, a qual chega a 15.767 agendamentos parados. “É como enxugar gelo”, relata.
Para o professor titular e chefe do Departamento de Prática de Saúde Pública da USP (Universidade de São Paulo), Oswaldo Yoshimi Tanaka, a problemática exige necessidade de ações do governo para fortalecer o quadro de profissionais. “Os municípios são obrigados a investir no mínimo 15% dos seus orçamentos para a Saúde, mas a fila de espera por consulta, que é a porta de entrada para o SUS, ainda obriga pacientes a aguardarem anos. A gestão dessa verba precisa ser revista”, defende.
A demanda reprimida por exames também se tornou uma dificuldade para municípios. Com equipamentos limitados, prefeituras buscam parceria com unidades do Estado para sanar o problema.
Dentre as principais demandas estão exames de imagem, tais como ultrassonografia, ressonância magnética e tomografia computadorizada.
Mesmo com parceria com rede privada e empresas especializadas que possuem convênios com as prefeituras, municípios continuam acumulando guias.
“A saúde é um dos serviços prestados que sofre mais com as demandas, falta de recursos e com estruturas insuficientes. A iniciativa de parcerias com redes privadas pode surtir efeito na diminuição de filas, desde que o sistema público se organize para que, em curto prazo, volte a cumprir com suas obrigações”, salienta o professor de Saúde Pública da Universidade Metodista de São Paulo Victor Hugo Bigoli.
Especialistas criticam ausência de trabalho conjunto no SUS
Embora ressaltem, de modo geral, que a crise econômica enfrentada pelo País tem contribuído de maneira significativa para o crescimento da fila de espera em serviços de Saúde, especialistas destacam parcela de culpa de médicos para o agravamento da situação.
“Muitos daqueles que aguardavam por meses na fila de espera poderiam ter seus problemas sanados caso houvesse comprometimento, gestão e um trabalho interdisciplinar, capaz de unir os setores de competência da Saúde. Certamente, trabalhando de forma conjunta as demandas seriam menores”, avalia o professor de Saúde Pública da Universidade Metodista de São Paulo Victor Hugo Bigoli.
Segundo o professor titular e chefe do Departamento de Prática de Saúde Pública da USP (Universidade de São Paulo), Oswaldo Yoshimi Tanaka, a situação pode ser evidenciada pela alta demanda de exames. “Às vezes, o médico clínico geral pede exames sem necessidade, algo que uma consulta mais elaborada e exames que ele mesmo poderia realizar resolveriam a situação. É preciso ter um protocolo mais rígido. Muitas demandas nem precisam ser encaminhadas para o especialista.”
Municípios recorrem à rede privada da região para zerar demanda reprimida
Na tentativa de zerar a fila de espera de consultas e exames em curto prazo, sem comprometer o atendimento da rede pública de Saúde, municípios da região empenham esforços para firmar parcerias com a rede privada com objetivo de equacionar a problemática da demanda reprimida em seus respectivos territórios. O modelo segue linha adotada pelo prefeito João Doria (PSDB), na Capital.
Em Santo André, onde o Paço planeja trocar dívidas de equipamentos da rede privada de Saúde por exames e consultas, a expectativa é que o projeto seja efetivado ainda neste semestre. Na quinta-feira, a Câmara aprovou o projeto de lei do prefeito Paulo Serra por unanimidade. A medida passará por nova votação amanhã.
A rede privada também é vista pela Prefeitura de São Bernardo como alternativa para zerar a fila de espera. “A proposta é fazer chamamento público para atender a demanda reprimida, utilizando a tabela do SUS (Sistema Único de Saúde). Mas, inicialmente, a intenção é fazer isso na própria rede, utilizando hospitais e unidades básicas de Saúde”, explica o secretário da Saúde, Geraldo Reple.
SOLUÇÃO CASEIRA
Com recursos próprios do Paço e profissionais que integram a rede pública de Saúde, a Prefeitura de São Caetano promete zerar a fila de espera em três meses por meio do programa Intensivão da Saúde, lançado oficialmente nesta semana.
Segundo a secretária de Saúde Regina Maura Zetone. a intenção é a de que o governo invista cerca de R$ 250 mil por mês para contratação de profissionais extras para atender a fila de espera em consultas, enquanto no caso da demanda reprimida de exames o município amplie o horário de atendimento de suas unidades. “O projeto consiste simplesmente na adequação da agenda de exames e contratação de profissionais pontuais para auxiliar de maneira ágil na fila de consultas. A intenção é que, com a fila zerada, a administração comece a pensar na reforma dos nossos equipamentos públicos”, declara.
Os demais municípios da região não manifestaram projetos na área para zerar a atual fila de espera na Saúde.
Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.