O estilista abriu a apresentação lembrando que o Brasil é o país onde mais ocorrem assassinatos de travestis e transexuais em todo o mundo, segundo um relatório da ONG internacional Transgender Europe. "Estamos em tempos de guerra. Nós não precisamos mais de roupas. A moda precisa começar a dialogar em outras frentes."
Valentina Sampaio, que é trans e desponta como a top queridinha da estação, era a única modelo profissional. O resto do casting foi selecionado pelo Instagram. "Foi emocionante, até chorei. Nunca vi uma manifestação assim em desfiles de moda. Ronaldo realmente vai além", disse a consultora de moda Costanza Pascolato.
Ao levantar a bandeira do transgênero e convocar travestis e mulheres que passaram por cirurgia de mudança de sexo para seu desfile, Fraga não apenas fez uma moda de protesto como deu vida e personalidade às roupas. "Não é o vestido que valoriza o corpo, é o corpo que valoriza o vestido. Se antes ele caía solto, agora ele ganha bundas e peitos que eu não desenhei", diz. "Isso é maravilhoso."
No momento em que até a roupa ganha leitura politizada (um suéter de cashmere vira símbolo de preferência política em uma eleição e usar vermelho torna-se sinônimo de orientação partidária), as passarelas refletem o engajamento visto nas redes sociais e na vida real também. E a moda ganha espaço pegando carona na relevância dessas discussões, vide Emicida com movimento negro no desfile da marca LAB e agora Ronaldo Fraga com o transativismo. "A questão agora é saber até que ponto essa movimentação é genuína e duradoura e até onde isso é só um modismo dessa estação, que reverbera nas redes sociais", diz Sergio Amaral, diretor de redação da revista L?Officiel Hommes.
Em contraponto a isso, no quarto dia de desfiles, houve espaço também para o escapismo da moda praia. Inspirada nas Maldivas, a Água de Coco apresentou um beachwear de luxo, com biquínis e maiôs com mangas amplas e hotpants. Trouxe um time de tops poderoso, com nomes de peso como Carol Ribeiro, Ana Beatriz Barros, Fernanda Tavares, Isabeli Fontana, entre outras. Marlon Teixeira, o modelo número um do mundo na moda masculina, fez duas entradas mostrando os únicos looks para homens do desfile. Acomodadas na fila A, imprensa, blogueiras e a cantora Claudia Leitte, que já estava com uma produção da nova coleção da Água de Coco. A apresentação aconteceu na Artefacto Beach & Country, loja de móveis e decoração de São Paulo.
Os bordados deixaram as peças, que já foram feitas em tecidos nobres, como a seda, ainda mais sofisticadas. Os vestidos longos e calças fluidas também se destacaram.
Já a marca de Amir Slama investiu em um beachwear fetichista, resgatando o fio dental e os modelos cavados, e recriando lingeries tipo corselets, com barbatanas e amarrações. Além de apostar em leggings, cintas-ligas e transparências. O cabelo veio com uma enorme trança e um boné, o batom era preto e saltos altos completavam os looks no estilo dominatrix.
Inspirada na perturbadora arte do pintor francês Gustavo Coubert, a coleção de Vitorino Campos foi totalmente sem gênero, com vestidos para eles e elas, muito tule e formas retas, nada muito ajustado. Casacos com volumosas ombreiras, peças com aplicações de retalhos de couro e vestidos brilhantes e transparentes deram toque anos 1980 às peças. Nos pés, sandálias plásticas sem salto, criadas em parceria com a marca Melissa, usadas com meias.
Em um dia de desfiles no qual as trans brilharam e atraíram toda a atenção e que, mais uma vez, as blogueiras-stars foram assediadas nos corredores do evento, ficou evidente que a era das supermagras está no fim, prestes a morrer na praia. E que corpos esquálidos não fazem sucesso fora do mundo da moda. Pelo contrário, eles acabam diminuindo a graça da roupa. (Colaborou Isabela Serafim)
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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