Com base em dois dos mais tradicionais personagens do Carnaval, o mestre-sala e a porta-bandeira, Luis Ferron foi desdobrando elementos de culturalização assimilados pelos brasileiros em mais de 500 anos de história de cruzamento de raças e costumes.
As descobertas culminaram em Sapatos Brancos, coreografia exibida gratuitamente amanhã, às 20h, no Sesi Santo André. A obra venceu o Prêmio APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte) 2009 de coreografia e acaba de receber o Prêmio Bravo! 2010 de melhor espetáculo de dança.
"O mote é a procura de descobrir como se dá a corporeidade destes personagens. Na escola de samba, os únicos que não podem sambar são o mestre-sala e a porta-bandeira. A dança deles é muito singular", conta Ferron, que além de idealizar e dirigir o projeto, dança, canta e é compositor das letras - algumas em parceria com o Mestre André - do espetáculo.
"Através das investigações não conseguimos definir exatamente o que torna essa dança tão atípica, mas vê-se um percurso histórico de onde as influências brotam."
Para remontar esse balaio, Ferron exemplifica pelo menos cinco manifestações que se cruzam nos movimentos do famoso casal carnavalesco.
"O primeiro fato são os minuetos que vieram com a colônia portuguesa para o Brasil. Tem também a pernada, que em São Paulo tem o nome de tiririca. Há o jongo, na qual o homem fica em volta da mulher e os passos do palhaço dos reisados de folia de reis, o famoso corta-jaca, entre outros. Há uma hibridação de atravessamentos, ao longo da história, principalmente de danças afro-brasileiras", aponta o coreógrafo, que traz também muitas referências adquiridas pelos personagens através da riqueza da cultura paulista.
DIÁLOGOS - "O foco é mapear a presença do corpo e da cultura negra dialogando com a cidade moderna. Pegar ritos e signos e transpor para um espaço cênico", conta Ferron, que acrescenta que apesar de conversar entre as fusões do antigo e moderno, preserva a estética tradicional das danças.
"Eu potencializei o corpo de cada um no que ele tinha de verdade durante a criação da coreografia. Enxerga-se o bailarino contemporâneo, a dança de orixá, o sambista das antigas, o mestre-sala."
Na trilha, o hibridismo se mostra através dos batuques fundidos aos arranjos eletrônicos, que são de autoria de Loop B. Sete personagens, entre músicos e bailarinos, cantam e dançam o enredo.
RITUAL - "A tese veio antes, não está no palco", conta Ferron, que evidencia que o clima da coreografia preserva as características das quadras das tradicionais escolas de samba - espaços que ele conhece há mais de dez anos. "É um lugar que conserva a ancestralidade e alegria do momento, é ali que reside o Carnaval. A avenida virou um curral."
No palco, a busca é a apoteose. "Começa como entrar no terreiro e pedir licença, abrindo espaço e tomando forma, até chegar ao espírito da grande festa", finaliza Ferron.
Sapatos Brancos - Dança. No Teatro do Sesi Santo André - Praça Doutor Armando de Arruda Pereira, 100. Tel.: 4997-1333. Amanhã, às 20h. Grátis.
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