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Adoção tardia ainda é barreira a ser vencida

Apenas uma criança entre as 30 aptas a receber
um novo lar na região tem menos de cinco anos

Natália Fernandjes
Do Diário do Grande ABC
30/05/2016 | 07:00
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Nario Barbosa/DGABC


O Grande ABC tem hoje 30 crianças aptas a adoção, conforme o Cadastro Nacional, do CNJ (Conselho Nacional da Justiça). Dessas, apenas uma tem menos de 5 anos de idade, o que indica mais chances de serem aceitas pelos pretendentes. As demais correm risco de viver em abrigos, longe do convívio familiar, até os 18 anos.

No mês em que se comemora o Dia Nacional da Adoção (celebrado no dia 25), o CNJ conscientiza sobre a adoção tardia, barreira que ainda precisa ser vencida. Atualmente, são 35,8 mil pretendentes à adoção e 6.590 crianças e adolescentes aptas a serem adotadas no País. No entanto, 83,78% das famílias procuram pequenos com idade até 5 anos e apenas 30% deles estão neste perfil.

“Essas restrições estão diminuindo nos últimos anos, conforme os levantamento do Conselho Nacional de Justiça, mas ainda são entraves, mas, em geral, eles (pretendentes) querem adotar meninas brancas, com até 5 anos de idade e sem irmãos. Já a maioria das crianças e adolescentes que estão em abrigos são negras ou pardas, do sexo masculino e com idades de 6 a 17 anos”, destaca o membro do Condepe (Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa Humana), coordenador estadual do Movimento Nacional de Direitos Humanos de São Paulo e fundador da Comissão Especial da Criança e do Adolescente do Conselho Federal da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Ariel de Castro Alves.

As 30 crianças aptas a ganhar novos pais na região correspondem a apenas 11,53% do total de abrigados entre as sete cidades (são pelo menos 260 menores em abrigos). Isso porque os pequenos só podem ser adotados após a destituição do poder familiar (quando há desvínculo da família de origem) – Lei 12.010/2009 – e, geralmente, os processos do tipo demoram de um até três anos na Justiça.

“Em muitas Varas da Infância do Grande ABC e do Estado, o procedimento de habilitação dos adotantes leva de um a dois anos. As varas não possuem estrutura adequada e sofrem com excesso de processos e atribuições. Outro grande problema é a falta de técnicos no Poder Judiciário, como psicólogos e assistentes sociais. Os poucos que atuam ficam sobrecarregados”, aponta Alves.

Conforme a assistente social e coordenadora da Proteção Social Especial de Mauá. Maria Aparecida Lima Ferreira, a burocracia é problema a ser vencido “Até resolver se volta para a família de origem ou é destituído o poder familiar, a criança fica de cinco a seis anos instituída, o que já dificulta a adoção”, diz. Segundo ela, alternativa no município tem sido as audiências concentradas, realizadas duas vezes ao ano, para dar encaminhamento tanto aos processos de adoção quanto de retorno familiar.

Entre as sete cidades, Santo André é a que possui maior número de crianças em abrigos (117). São pelo menos 70 em Diadema, 45 em Mauá, 14 em São Caetano e 14 em Ribeirão Pires. São Bernardo e Rio Grande da Serra não informaram. Já entre os menores aptos a serem adotados, 14 estão em Diadema, nove em São Caetano, dois em Mauá, dois em Ribeirão Pires, dois em Rio Grande da Serra e apenas um em Santo André.

Cerca de 40% ficam no abrigo até os 18

Referência no acolhimento de menores em situação de vulnerabilidade ou sem familiares, os abrigos assumem também tarefa de preparar as crianças e jovens que não são adotados para a vida adulta. Em média, 40% dos abrigados permanecem nos lares até os 18 anos, destaca a coordenadora geral do Lar São José e vice-presidente do Conselho Municipal de Assistência Social de Diadema, Margarete Lira.

“Nós nos preocupamos em ajudá-los a fazer cursos profissionalizantes, a entrar no mercado de trabalho, alugar uma casa, a cuidar da saúde. Mas, depois que saem, aqueles que não tiveram apoio e não sabem se cuidar, acabam perdidos no mundo. O ideal seria a existência de repúblicas para esses jovens”, considera Margarete.

A falta de estrutura, segundo Margarete, ainda é empecilho. “Muitas vezes temos dificuldade de encaminhá-los para a rede de assistência. Recebemos apenas R$ 115 mil para administrar as três unidades do Lar São José por mês, mas nossos gastos giram em torno de R$ 200 mil. Temos uma dívida de R$ 41 mil”, lamenta. A saída, conforme ela, é organizar bazares e festas para complementar o orçamento.

VIDA NOVA

Aluna do 1º ano do Ensino Médio, A.P.D, 17 anos, já planeja seu futuro fora do abrigo. “Quero terminar a escola, fazer um curso de fotografia, uma faculdade e trabalhar com isso”, destaca a menina, que saiu de casa após quatro anos sendo submetida a maus-tratos pela mãe. “Ela me batia muito, me fazia passar vergonha na rua. Cortava meu cabelo bem curto e me colocava roupas feias, porque tinha ciúmes do meu pai”, lembra.

O período no abrigo a fez refletir sobre os problemas sociais e a olhar para o lado. “A gente pensa que tem uma história horrível, mas percebe que tem situações muito piores. Outra coisa que já sei que não vou fazer é repetir a postura da minha mãe com meus filhos”, projeta. 




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