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Estatuto do idoso estimula denúncia
Illenia Negrin
Do Diário do Grande ABC
01/01/2005 | 19:41
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O Estatuto do Idoso completa um ano em vigor e o poder público ainda engatinha quando se trata de garantir os direitos da terceira idade. Nesse período, a mudança de comportamento mais visível foi o aumento de denúncias de agressão. Sinal de que a agressão ao idoso não é mais encarada com naturalidade. Em um ano, o número de denúncias cresceu assustadoramente, de acordo com especialistas que trabalham com a população idosa no Grande ABC.

Em Diadema, por exemplo, o aumento foi de 200%, calcula a assistente social Wanda Regina Marques, coordenadora do CRI (Centro de Referência do Idoso). "Em dezembro de 2003, tomamos conhecimento de duas denúncias de maus-tratos. Em 2004, foram 20. Esse é um lado muito positivo. Ninguém mais deve achar normal deixar um idoso à míngua, tomando o sol do meio-dia, sofrendo com o calor. Isso é agressão, falta de cuidado."

Ela explica que o CRI verifica todas as denúncias que recebe. Assistentes sociais de Diadema vão até as famílias acusadas de maus-tratos e os casos em que realmente houve a agressão são encaminhados às delegacias. "Na maioria, são pessoas que não têm a intenção de maltratar a pessoa mais velha. São casos em que não sabem como agir, como cuidar adequadamente", diz a assistente social Wanda.

Para rebater a violência contra o idoso, a Prefeitura de Santo André criou um grupo para discutir maneiras de tornar a denúncia e a punição da agressão mais eficientes. "Advogados, promotores, delegados, idosos, e gente da Prefeitura estão envolvidos para elaborar uma proposta que dê certo", afirma a socióloga Marisa Rodrigues, de Santo André.

Se por um lado muita gente não se cala diante dos maus-tratos, do outro a Justiça ainda trata as ocorrências como leves, e as punições acabam por não corresponder ao tamanho do estrago. O fato de em todo o Estado de São Paulo só haver duas delegacias do idoso (na capital e em Guarulhos) é um dos indicativos dessa realidade.

A região tem 190 mil habitantes com mais de 60 anos e nenhuma delegacia do idoso, apesar das promessas feitas em setembro de 2003 pelas duas maiores seccionais do Grande ABC, a de São Bernardo e Santo André. Hoje, as denúncias são apresentadas nas delegacias comuns, onde os policiais nem sempre estão preparados para lidar com as peculiaridades das vítimas idosas. Quando a investigação é levada adiante, a punição dos agressores esbarra nas brechas da Justiça. A grande maioria dos casos termina em conciliação, com o pagamento de cestas básicas.

"O estatuto deveria prever leis mais rígidas para quem agride um idoso. Acabou virando a lei da cesta básica. Muita gente hoje denuncia os maus-tratos, mas isso acaba sendo contraproducente porque a Justiça não dá uma resposta à altura da violação. Cai no descrédito", avalia Flávio Crocce Caetano, presidente da Comissão de Estudos sobre o Idoso da OAB/São Paulo.

Outro problema, aponta o advogado, é que os processos acabam caindo na vala comum do Judiciário porque não há defensores públicos especializados nos fóruns. "Só na capital existe um setor especializado no Ministério Público, que é o Grupo de Atendimento Especial ao Idoso", afirma.

Exceção – Como a maioria dos casos termina em conciliação, as reincidências são comuns. Na Delegacia do Idoso de São Paulo, somam 20%. "São considerados crimes de baixo potencial ofensivo. E uma cesta básica resolve o problema. Pelo menos naquela hora", conta o delegado titular Oscar Ferraz Gomes.

Ainda que a Justiça não dê conta do recado, a delegacia do idoso da capital, criada há dez anos, é exemplo de que a existência de um posto especializado pode fazer a diferença. Depois do estatuto, o número de denúncias aumentou 100%. A maioria, segundo o delegado, dá conta de agressões físicas, abandono material e casos em que a família se apropria da aposentadoria do idoso e não reverte o dinheiro em seu benefício. "Se houvesse outras espalhadas pelo Estado, seria bem melhor."

Em 2004, a delegacia atendeu mais de 4 mil pessoas. Quase metade das que procuraram o serviço entre 2000 e 2003, em que foram registrados 10 mil atendimentos.




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