Previstos para serem instalados um ano atrás, os equipamentos que farão a medição de poluentes liberados na atmosfera pelo Polo Petroquímico, localizado no bairro Capuava, na divisa entre Santo André e Mauá, entraram em funcionamento na última semana. O aparelho começou a operar justamente na semana em que houve o rompimento de uma tubulação que ocasionou incêndio na Braskem, principal empresa do complexo. O forte odor de plástico queimado que ficou no ar, causou diversos transtornos à população.
Dois equipamentos foram implantados pelo Laboratório de Poluição Atmosférica da USP (Universidade de São Paulo): um no próprio polo e o outro no campus da FMABC (Faculdade de Medicina do ABC), onde a pesquisadora Maria Angela Zaccarelli Marino, responsável pela parceria com a USP, é professora de Endocrinologia. A docente é autora de estudo que apontou que os poluentes emitidos pelo complexo seriam a causa de doenças da tireoide na população residente próxima ao local.
Ao comparar moradores em um raio de 500 metros da Petroquímica com os que residiam a 8,5 quilômetros da área industrial, observou-se que, na última amostra, 2,9% das pessoas avaliadas foram diagnosticadas com tireoidite crônica autoimune, enquanto que na primeira, foram 46%. A escolha do campus da FMABC para abrigar um dos equipamentos é justamente por estar longe de empresas químicas e, assim, poder fazer a comparação.
O atraso na implantação dos aparelhos se deu por conta da instabilidade climática. “O clima tem sido muito anômalo. Agora, houve a possibilidade de colocar, porque se instalamos em uma fase errada, depois não podemos computar o resultado”, explicou a pesquisadora.
A ação visa não só medir o nível de poluentes, mas também identificar quais são os agentes químicos presentes na região do Polo Petroquímico, que levariam ao desenvolvimento da enfermidade. “Durante 15 dias (até o dia 31) a medição será feita por estes aparelhos, que são de alta tecnologia. Os computadores nos dão os dados e os estatísticos fazem cálculos diários. Após esse período, eles serão avaliados e aí vamos ter uma noção. Estamos ansiosos”, disse Maria Angela. Não há prazo determinado para a permanência dos aparelhos. “Vai depender dos primeiros resultados.”
Assim que os agentes forem detectados, inicia-se a segunda fase do processo, que é a coleta de amostras de sangue da população das áreas envolvidas para análise de dosagem dos agentes. O Instituto de Química; o de Matemática e Estatística; e do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas, todos da USP, também integram a iniciativa.
A Braskem, que conta com diversas fábricas no Polo Petroquímico, ressalta que “a empresa segue as regulações exigidas pela Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo) e cumpre as normas do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente) para limites de emissão de poluentes atmosféricos para fontes fixas”.
“Os resultados do monitoramento ambiental são informados periodicamente ao órgão competente”, acrescentou em nota.
Maria Angela frisa que o estudo não tem o objetivo de ser contra a indústria. “Estamos a favor da saúde, tentando resolver o problema da doença que estamos estudando.”
Especialista dedica-se a estudo há décadas
A professora de Endocrinologia da FMABC (Faculdade de Medicina do ABC) Maria Angela Zaccarelli Marino iniciou a pesquisa de tireoidite crônica autoimune em 1989 com moradores da divisa entre Mauá, Santo André e São Paulo – região onde estão instaladas diversas indústrias do segmento petroquímico. Os pacientes analisados foram acompanhados a partir de consultas médicas, exames laboratoriais de sangue com dosagens dos hormônios tireoidianos e ultrassonografia da tireoide.
A partir daquele ano até 2004, 6.306 homens e mulheres com idade entre 5 e 78 anos foram avaliados. Eles foram divididos em dois grupos segundo o local de moradia. Nos arredores do Polo Petroquímico, estavam 3.356 pessoas do grupo 1. Já o grupo 2 foi composto por 2.950 pacientes de região afastada de área industrial, nas divisas entre São Caetano, Santo André e São Bernardo. Na comparação geral de 15 anos, o grupo 1 apresentou 905 pacientes com a doença, contra somente 173 do grupo 2.
A pesquisadora sugeriu nova denominação para a doença: tireoidite química autoimune, uma vez que a poluição pode ser o fator desencadeante para formação de anticorpos antitireoidianos, que são substâncias que agridem a glândula tireoide ocasionando a enfermidade.
A aposentada Arlete Ferreira, 67 anos, mora há 34 no bairro Capuava, próximo ao Polo Petroquímico. Lá ela também trabalhou no restaurante, por dois anos e meio. Em 2012, descobriu ter tireoide. “Todos os dias a rua fica cheirando a gás e o ar com muita poluição, mas fazer o quê? A gente vai vivendo e se acostumando com isso.”
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