Setecidades Titulo Crise
Região perde 500
leitos em cinco anos

Fechamento de hospitais particulares pressiona rede de
atendimento de emergência do Sistema Único de Saúde

Por Maíra Sanches
Do Diário do Grande ABC
23/01/2012 | 07:00
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Com o fechamento de pelo menos seis hospitais particulares nos últimos cinco anos, o Grande ABC perdeu quase 500 leitos no setor privado de Saúde. Hoje, o número é de 2.766, contra 2.091 leitos na rede pública. Entre os equipamentos falidos estão o Neomater, Baeta Neves e São Caetano.

A série de desativações provocou aumento na procura por hospitais públicos da região. A avaliação é do coordenador do Grupo de Trabalho de Saúde do Consórcio Intermunicipal do Grande ABC e secretário de Saúde de São Bernardo, Arthur Chioro.

O setor ambulatorial do Sistema Único de Saúde foi o menos prejudicado. O gargalo está na rede de emergência, que atende casos graves e de alta complexidade. Parte da população prejudicada pelos fechamentos perdeu a referência na rede privada. A saída, então, passou a ser o SUS. "O impacto é claramente visível. A rede privada segura bem os casos de média e baixa complexidade, que são mais baratos. Mas, quando complica, vem para a gente. Oncologia, por exemplo, é um desastre. Ninguém quer atender. Na área que precisa abrir, não existe investimento", analisou. Chioro também citou as dificuldades geográficas. Às vezes, a assistência oferecida pelo plano de saúde está em outra cidade, o que abrevia o acesso. "O paciente não vai. Não tem dinheiro. Fica tudo para o SUS."

De acordo com a Agência Nacional de Saúde, 60% da população do Grande ABC são beneficiários de plano de saúde. Os dados mais atualizados são de setembro de 2011. Quase metade das famílias da região (45,8%) pertence às classes C e D, segundo o Instituto de Pesquisas da Universidade Municipal de São Caetano. De acordo com Chioro, esse é justamente o perfil da demanda SUS-dependente do Grande ABC.
Mesmo com a crise do setor privado, há pouca movimentação na região para estimular a criação de leitos particulares. "A excessão é a Rede D'Or. Se continuar o investimento, ajudará muito", aponta Chioro. O grupo carioca comprou o Hospital e Maternidade Brasil, de Santo André, e o Hospital Assunção, de São Bernardo, ambos em 2010. Juntas, as duas unidades somam 400 leitos. Além desses, está em construção um terceiro equipamento, que funcionará no mesmo espaço do antigo Hospital São Caetano.
Mesmo com essa importante contrapartida, Chioro avalia que a corrida pela criação de leitos ainda é vencida pelo SUS. "Avançamos muito mais do que o setor privado. O deficit na rede pública (de 1.500 leitos, publicado pelo Diário em abril de 2011) não se mantém hoje. Só de leitos em domicílio já abrimos 120, sem contar os dos Centros de Atenção Psicossocial e das Unidades de Pronto Atendimento."


Crise em setor privado compromete qualidade


Existe outro público prejudicado pelos fechamentos de hospitais particulares: os usuários que permanecem com planos de saúde. As alternativas diminuíram. Com isso, houve concentração da demanda e o reflexo pode ser medido, novamente, nos prontos-socorros.
Atualmente uma das principais reclamações dos beneficiários é a demora no atendimento. Leva-se até quatro horas para concluir a saga: triagem, consulta, exames e medicação. Em 2011, o Hospital e Maternidade Brasil, em Santo André, e o Hospital Assunção, em São Bernardo, já sentiam aumento de 25% na frequência de pacientes nos PSs.
Ontem à tarde, o paciente do Hospital Brasil Alfredo Torres, 86 anos, que tem convênio médico com internação em apartamento, teve de esperar por vaga em outro local, conforme informou o genro, Nelson Sampaio, 65. Ele teve uma sequência de crises de hipoglicemia. "Informaram que não podem internar porque está lotado. Não há leito nem na enfermaria. Ou seja, pagamos pelo convênio, tem hospital, mas não tem atendimento."
Torres foi colocado de forma improvisada em quarto no pronto-atendimento até que fosse localizada vaga em outra unidade de Saúde da região.


Unidades devem acompanhar transformação tecnológica

A modernização da medicina nos últimos 20 anos não foi acompanhada por todos os centros hospitalares. Muitos, mesmo com tradição, ficaram pelo caminho e deixaram de equipar os leitos de alta complexidade para receber a demanda reprimida.
"Alguns hospitais perderam o trem. Entraram na década de 1990 completamente diferente de outros. Fruto da transição tecnológica. Não houve investimento" disse o coordenador do GT de Saúde do Consórcio Intermunicipal do Grande ABC, Arthur Chioro.
O médico e professor da Universidade Municipal de São Caetano, mestre em Administração, Isaac Gil, concorda com a adequação que os hospitais precisam alcançar hoje para oferecer atendimento de qualidade. "O aperfeiçoamento da gestão das instituições e a oferta de recursos aumentam a capacidade de absorver a demanda e as soluções que a população precisa", ponderou.
O período de internação dos pacientes caiu bastante de 20 anos para cá. Com isso, houve redução na criação de leitos hospitalares. "Há 15 anos o paciente que operava cálculo de vesícula raramente tinha alta com menos de sete dias. Hoje, com videolaparoscopia, se fica internado 24 horas é muito", comparou Chioro.

RESSARCIMENTO
O governo federal prometeu, em 2011, acelerar a cobrança por pagamento das operadoras de Saúde quando o beneficiário utilizar a rede pública. O ressarcimento deve ser realizado ao Sistema Único de Saúde, mas o processo é lento. Atualmente o Ministério da Saúde busca com a Agência Nacional de Saúde Suplementar regulamentar o funcionamento para obter dados dos atendimentos.
O valor pago por operadoras bateu recorde no primeiro semestre de 2011. De acordo com o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, foram R$ 25 milhões, mais do que o total recebido pelo SUS entre 2008 e 2010.
"O paciente tem direito. O correto seria que a rede pública cobrasse dos convênios, mas não há regulamentação. Isso gera enorme aumento de demanda", afirmou o novo presidente da Fundação do ABC, Mauricio Mindrisz.




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