Personagens gays em novelas, quando agradam, quase sempre é pela comicidade de gestos afeminados incontidos. Com o Orlandinho de Iran Malfitano em A Favorita, é diferente. O ator conta que nunca foi abordado com tanto carinho pelo público, pois todos adoram a sensibilidade e o bom caráter do personagem. "Todo mundo lamenta quando ele não aparece em um capítulo e dizem que estão tristes porque a novela está chegando ao fim. Para as pessoas a bondade do Orlandinho está acima de sua opção sexual", analisa Iran. Prova disso é que, ao final da novela, o personagem deve terminar mesmo é com Céu, ‘deixando' de ser gay. "A maioria das pessoas torce por isso", conta.
Na eleição realizada por TV Press para escolher os melhores e piores de 2008, editores de mais de 60 jornais e portais de todo o País também mostraram que Iran Malfitano agradou como Orlandinho. O ator foi escolhido o coadjuvante do ano e se orgulha do resultado. "Dá uma sensação de dever cumprido. Sinto que a cada trabalho consigo mostrar mais minha vocação e fico muito feliz", agradece.
Como Orlandinho, você faria apenas uma participação em A Favorita. A permanência de seu personagem na novela e a repercussão que ele alcançou te surpreendem?
IRAN MALFITANO - Eu me sinto muito lisonjeado porque inicialmente eu faria dois capítulos, depois passaram a ser 30 e acabei ficando até o fim da história. Só isso já é um reconhecimento pelo meu trabalho. Mostrei disponibilidade para o João Emanuel Carneiro, aceitei com garra esse personagem sem me preocupar se as pessoas têm preconceito em relação ao homossexualismo ou não. Se tivesse pudores, não seria ator, ia trabalhar com comércio. Ser ator para beijar mulher bonita? Isso é fácil. Mas e na hora de beijar homem ou olhar para um cara com desejo? Acho que mostrei serviço.
Personagens gays facilmente escorregam para a caricatura. O que foi mais difícil na composição desse papel?
MALFITANO - É um trabalho complicado. Para falar a verdade só no final da novela é que vejo que estou com o personagem na mão. E tenho de agradecer aos atores com quem contracenei e aos diretores por ter conseguido levá-lo à frente. Recebi vários conselhos e fui ponderando tudo para tentar melhorar. O ator Bruno Gradim, que hoje faz Revelação no SBT e é meu grande amigo, já ganhou até prêmio no teatro interpretando homossexuais. E às vezes ele levava esse personagem para as mesas de bar onde a gente saía. Sempre achei que ele fazia maravilhosamente bem e ficava me perguntando se eu conseguiria. Quando soube que o Orlandinho ia se descobrir gay na novela, a dúvida voltou à minha cabeça. Não era um bloqueio, mas sim um obstáculo que eu teria de vencer. Hoje me sinto bem e vejo que o personagem definitivamente deu certo. Porque todo mundo está gostando. Recebi elogios de pessoas que eu não esperava.
Quem, por exemplo?
MALFITANO - A Patrícia Pillar chegou e me disse que eu estava trabalhando muito bem. Depois de ouvir isso de alguém que entende, o que mais eu quero? Nos corredores do Projac, o Fábio Assunção também me parou para dizer que estava me adorando na novela, ficou conversando comigo sobre o meu personagem. Nenhum deles precisava ficar me elogiando, mas elogiaram. É por isso e pela resposta que tenho do público que adoro fazer o Orlandinho.
Como é o assédio na ruas?
MALFITANO - As pessoas abraçaram o personagem e todo mundo adora o Orlandinho. Mesmo em se tratando de um País preconceituoso e que aceita com mais facilidade o homossexualismo feminino. Ele cativou as pessoas porque é humano, é do bem, sensível e isso está acima de sua sexualidade. Recebi inclusive e-mails de homossexuais agradecendo por eu ter humanizado o personagem dessa forma. Os idosos chegam até mim e as crianças me abordam sem que suas famílias as repreendam de alguma forma. Talvez as pessoas estejam revendo essa questão do preconceito.
Você enfrentou alguma manifestação negativa nas ruas?
MALFITANO - Negativa, não. A não ser algumas pessoas que não sabem abordar de maneira educada. Estava em uma van outro dia quando um rapaz me viu e disse que não andava em carro junto com ‘veado'. A pessoa do lado me cutucou e disse: ‘Olha lá, ele está mexendo com você.' Só respondi que não devia ser comigo, pois ali estava o Iran e não o Orlandinho. De qualquer forma esse tipo de comentário eu ignoro. E eles não somam nem cinco. A verdade é que a abordagem do público comigo mudou depois de A Favorita.
Mudou como?
MALFITANO - Na época em que fiz Malhação eu só era abordado por adolescentes e mulheres. Os homens se sentiam ofendidos de chegar até mim. Mas agora os caras vêm com suas respectivas namoradas me dizer que elas me adoram. Sou parado por pessoas de todas as classes sociais, de ambos os sexos, de todas as idades. Ampliei meu público e isso me mostra que o Orlandinho foi um degrau que subi na carreira.
Você quer dizer que até hoje carregava o estigma do galãzinho de Malhação? Porque depois desse trabalho você já fez inúmeras outras novelas.
MALFITANO - Mas até então eu era o Gui da Malhação. Agora é completamente diferente. Eu sou o cara que faz a novela das oito. Mas o que está em questão não é a novela em horário nobre, mas sim a credibilidade que estou ganhando. Antes eu fazia personagens que sempre carregavam alguma coisa de mim, de uma certa forma eram mais fáceis. Desta vez, tive de me aprofundar, estudar. Quando você tem um rostinho bonito é difícil permanecer nessa profissão. Até você provar que tem algo além da beleza, todo mundo diz que você está onde está apenas porque é bonito.
Desde sua estréia na TV, em 2001, você enfrentou momentos de altos e baixos na carreira. Como avalia sua trajetória até aqui?
MALFITANO - É uma verdadeira montanha russa. Mas tanto nas curvas perigosas quanto nas brandas, eu aprendi. Tomei atitudes precipitadas e outras acertadas. Todas elas me fizeram chegar onde estou. Sem dúvida hoje sou um profissional bem melhor do que quando fiz Malhação. Tenho noção de que sou ator não para sair em revista e beijar mulheres bonitas. Estou aqui para fazer o galã, mas também para ser o vilão da novela. Não escondo, no entanto, que já fui bem deslumbrado. E os meus momentos de baixa foram por conduta inadequada, por desleixo. Cheguei no Rio com 16 anos e com 19 eu virei protagonista de Malhação. De repente todas as lojas, restaurantes e boates abrem as portas para você. Não é preciso ir fazer compras porque mandam caixas e caixas de roupas na sua casa. Sem contar que os bailes de debutantes rendem R$ 15 mil por uma presença de duas ou três horas. Eu me deslumbrei com tudo isso.
E o que te fez cair na real?
MALFITANO - Meus pais. A família é tudo nessa hora. Só não perdi a cabeça por causa deles. Pondero muito o que eles dizem e se hoje sou benquisto pelos meus amigos e pelas pessoas que trabalham comigo, devo tudo aos meus pais. Com 20 anos me vi com carro, apartamento. Mas olhava para os meus amigos e via que eles estudavam normalmente, ralavam de segunda a sábado para ganhar pouco dinheiro. Só a minha família para me fazer botar os pés no chão. A prova de que eles estavam certos é que passei por tudo isso e hoje ganhei a oportunidade de fazer o Orlandinho, um grande trabalho na minha carreira. Ele pode não ser o melhor personagem da novela, mas sem dúvida é um dos mais queridos.
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