Diarinho Titulo
Desafiando a cidade
Marcela Munhoz
Do Diário do Grande ABC
31/01/2010 | 07:28
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Não estranhe quando der de cara na rua com gente saltando buracos, escalando muros e se equilibrando em canos. São os traceurs, praticantes da modalidade parkour, cada vez mais comum nos centros urbanos.

O parkour ou le parkour - em francês le é o e parcour (a palavra original é com c), percurso - é uma atividade em que seus adeptos encaram o desafio de ultrapassar obstáculos sem utilizar recursos, apenas a força e a habilidade do corpo e da mente. "Meus amigos acham que saio por aí pulando de um lado para o outro e é só isso. Mas o parkour é muito mais, tem uma filosofia. Gosto tanto que deixei a capoeira e o futebol de lado", conta Bruno Archanjo Fabiano, 14 anos, de Santo André.

O garoto conheceu os movimentos há um ano, na internet. Entrou na comunidade do Orkut e passou a frequentar os encontros de traceurs. "No início, achava perigoso. Mas vi que ninguém ultrapassa os limites do corpo e que os meninos são educados. Fiquei mais tranquila", confessa Michelle Archanjo, 31, mãe do Bruno.

Em geral, os encontros são marcados nos fins de semana em locais onde há algumas opções de obstáculos. No Grande ABC, costumam ir aos parques Ipiranguinha e Central, além do Paço Municipal. "Isso não quer dizer que não podemos utilizar as técnicas no nosso dia a dia. Depois de conhecer o par-kour, passamos a enxergar a cidade de forma diferente, cheia de desafios para ultrapassar", diz Gustavo Mendes, 19.

A liberdade de movimentos e a amizade entre os praticantes atraíram Rafael Brancaglione, 20, para a modalidade. Há quatros anos e meio no par-kour, o garoto descobriu que um dos principais objetivos é aprender a controlar a mente e saber até onde o corpo pode ir. "A dificuldade de cada obstáculo depende de cada um. Conseguir evoluir é muito bom. O parkour é minha vida."

No início, os obstáculos eram naturais
Pode-se relacionar o parkour ao antropólogo francês George Hebert, que criou o método natural do movimento em pesquisa realizada em 1893. Ele acreditava na importância da força física e na dedicação em ajudar os outros, depois que conseguiu salvar mais de 700 pessoas da cidade de St. Pierre, na França, durante uma erupção vulcânica.

"Ele desenvolveu uma técnica baseada nos nossos instintos naturais. Acreditava que o homem deveria usar todas as possibilidades corporais para se mover. O método se tornou padrão e base de treinamento militar. Os soldados saltavam, escalavam e se equilibravam nos obstáculos da floresta", explica o presidente da Associação de Parkour do Grande ABC (PK ABC), Fabiano Coelho, 35 anos. As frases repetidas pelos praticantes são ‘Ser e Durar' e ‘Ser Forte para Ser Útil', pois acreditam que o homem não nasceu para ser sedentário.

Como oficial da marinha, Herbert adaptou as técnicas e criou o parcours du combatant, algo como ‘percursos do combate'. Um dos soldados franceses que aprendeu as técnicas foi Raymond Belle (1939-1999), pai do criador do parkour, David Belle. O militar chegou a utilizar as regras na Guerra do Vietnã (1959-1975). David se interessou pelos movimentos e os adaptou para os centros urbanos na década de 1980. Ele morava em Lisses, na França, berço do parkour. A técnica chegou ao Brasil há cinco anos.

"Mais do que uma atividade física completa, o parkour treina também o equilíbrio mental. A cada movimento, testa os limites do praticante, o que ajuda a enfrentar os obstáculos da vida também", diz Fabiano, presidente da PK ABC, que é advogado. "Não é raro me ver equilibrando em canos de terno e gravata." Para ele é importante deixar claro que não há competição no parkour e ninguém deve cobrar nada para ensiná-lo.

Aprenda com os traceurs mais velhos
Ficou com vontade de experimentar? Calma! Primeiro tem de aprender. Os traceurs da Associação de Parkour do Grande ABC ensinam os movimentos. Vá a uma reunião do grupo, acompanhado por um responsável.

Além da associação, até dia 26, outros traceurs - Akira e e Pê - estão às sextas, das 14h às 16h, no Sesc Santo André, ensinando as técnicas. A aula é de graça. Otávio Thonebohn, 15, foi conferir de perto. "Meus pais não se incomodam com o parkour porque sabem que não posso fazer isso em qualquer lugar para não me machucar."

Renato Zanettn, 15, também está aprendendo aos poucos. "Tem de começar com movimentos simples para adquirir flexibilidade." Weverson de Souza, 13, é estreante. "No começo senti dor muscular, mas já estou me acostumando."

Todo cuidado é pouco
"Como toda atividade radical, o parkour expõe o corpo a situações de perigo. Qualquer erro milimétrico pode causar grande acidente", alerta Luis Carlos de Oliveira, pesquisador do Celafiscis (Centro de Estudos do Laboratório de Aptidão Física de São Caetano do Sul).

Apesar do risco, acredita que pode ser praticado por quem tem bom condicionamento físico (elasticidade e força) e habilidade suficiente para executar os movimentos. "Não dá para sair pulando por aí sem instrução e sem saber as técnicas."

Os traceurs, em geral, não usam equipamentos de segurança. Apenas tênis de boa qualidade e roupa confortável para não restringir os movimentos. "Se treinar muito, gasta um tênis por mês. Ele fica destruído", diz o presidente Fabiano Coelho. Praticado em local público, o parkour não é proibido, mas tem de respeitar o espaço.

Parkour na novela
A atividade ultrapassou os limites urbanos e está sendo retratada na TV. O clipe Jump da Madonna é sobre parkour. Na abertura da novela Cama de Gato, da Globo, dá para ver alguns movimentos; e agora, em Tempos Modernos, na mesma emissora, a modalidade é praticada pelo personagem Led Piñon, interpretado por Guilherme Leicam, 19 anos.

O ator não conhecia a modalidade e só tinha visto alguns vídeos na net. "Fiz workshops e adorei. Aprendi as técnicas devagar e, aos poucos, comecei a repetir os movimentos. Precisa ter confiança antes de qualquer coisa; um erro pode ser fatal."

Antes da novela, o único esporte que Guilherme praticava era corrida, o que o ajudou em alguns movimentos. "Mesmo assim, é preciso ter habilidade, técnica, leveza e precisão. Para mim, os que exigem precisão são os mais complicados", conta o ator, que aprendeu a curtir ainda mais o Rio de Janeiro depois do parkour. "Tem uns picos bem legais no Botafogo e em um condomínio na Cidade de Deus."

Tem mais
Free running mistura parkour e acrobacias, como movimentos de ginástica artística, capoeira e circo. Seu criador, Sebastian Foucan, é requisitado na TV e cinema. Sabe a cena de abertura de 007 - Cassino Royale? Foucan estava lá!

Quer saber mais?
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Assista ao filme B13 - 13º Distrito (2004), que conta uma história de guerra urbana com cenas iradas. O segundo da série Ultimato (2009), já está na locadora
* Veja o documentário Samparkour, no YouTube
* Acesse www.parkourbrazil.com e www.pkabc.com.br
* Jogue o game Free Run, disponível gratuitamente em todos os sites de jogos online. Também tem Free Running, para Playstation.




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