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Região discute casa de passagem
Deborah Moreira
Do Diário do Grande ABC
31/05/2010 | 07:00
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Nos últimos meses, especialistas no atendimento de mulheres vítimas da violência doméstica vêm discutindo uma alternativa para aquelas que não desejam e nem precisam se submeter as regras rígidas de confinamento das casas-abrigo para mulheres em situação de violência: a casa de passagem.

"É um elo que falta na rede, onde conseguiríamos abrigar as que têm lugar para ir, porém, não no momento da saída de casa. Normalmente, elas saem em situações tumultuadas e horários difíceis, sem fazer contato com familiares que podem recebê-las", explicou a psicóloga Raquel Moreno, presidente da ONG que administra as casas-abrigo do Grande ABC.

Segundo ela, a ideia é manter mulher e filhos, se houver, durante pouco tempo (no máximo dez dias), até que ela faça contato com amigos ou parentes que têm condições de acolhê-la.

A alternativa ainda não se concretizou, mas, se depender da rede de atendimento à mulher em situação de violência, deve sair do papel.

Todas as especialistas ouvidas - psicólogos, assistentes sociais, educadoras e delegadas de polícia - concordam com Raquel. "Não tenho conhecimento da existência de um modelo assim no País. Mas, certamente, agilizaria muito o atendimento das vítimas, evitaria sofrimento e até mortes", observou Ancilia Del Vega Giaconi, delegada da 2ª DDM (Delegacia de Defesa da Mulher) da Capital. Ela afirma que cerca de 60% dos casos que atende são de ameaças de morte e injúrias. O restante é lesão corporal, estupro e crimes sexuais.

Mais tempo - Há algumas mulheres, porém, que precisam de mais tempo do que a média de seis meses estabelecidos nas casas-abrigo. O Diário teve acesso a um desses endereços, sigilosos, mantidos pelo Consórcio Intermunicipal do Grande ABC, e descobriu casos como o de Helena Rodrigues, que está há mais tempo por causa de sua condição de saúde. "Temos uma missão, que é devolver o direito à vida digna para ela e às outras, independente do tempo", declarou Maria Helena Gonçalves Rios, representante de Ribeirão Pires no Grupo de Trabalho responsável pelos abrigos no Consórcio ABC.

Solange Rodrigues está há quase dez meses. "No dia em que cheguei fui correndo para o fundo do quintal. Nem falava direito. Hoje, você quer que eu fale daquele ‘lixo'? Ele quase me matou e tentou matar o filho também, achando que não era o pai dele. Meu cabelo está assim de tanto que ele puxou e me arrastou", lembrou Solange, que conseguiu trabalho como acompanhante de uma senhora e aos sábados corta cabelo. Agora, falta encontrar um novo lar. Com o auxílio jurídico, ela obteve pensão para um dos filhos e o afastamento do ex-marido.

As participantes do GT contam que os agressores costumam procurar pelas companheiras com certa frequência. "Eles sempre afirmam que estão arrependidos, que não vão mais fazer, que precisam vê-las, se fazem de coitadinhos. Eu mando passear. Não damos qualquer referência que possa levar à localização das mulheres e os orientamos a procurar seus direitos, inclusive tratamento médico, se necessário", declarou a advogada Maria Aparecida da Silva, de São Caetano.

Desabrigamento - Para a especialista Marilda Lemos, que ajudou a implementar a primeira casa na região, é preciso melhorar o desligamento das famílias. "O desabrigamento é tão importante quanto abrigá-las. Ainda é preciso pensar em políticas que possibilitem a reinserção delas na sociedade. Dar trabalho, profissão, moradia."

Segundo ela, não são medidas assistencialistas que privilegiarão uma minoria. "É dar prioridade a essas famílias por causa das condições sub-humanas a que estão submetidas", concluiu Marilda, que coordena o curso de Serviço Social da Faculdade de Serviço Social, em São Caetano.

Já a representante de Ribeirão Pires no consórcio afirma que são oferecidas condições de retorno, inclusive auxílio-moradia, nos primeiros meses fora do abrigo. Porém, reconhece que ainda há muito a ser feito: "Apesar de todo o serviço oferecido pelas cidades para que elas recuperem uma vida digna, sem violência, ainda há muito o que investir financeira e tecnicamente".




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