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Crônica de uma casa dividida
Por Carlos Brickmann
Para o Diário do Grande ABC
26/10/2014 | 07:00
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Esqueça as promessas dos candidatos: não teriam importância se fossem cumpridas e sabemos que não o serão. O melhor que pode ocorrer, o mais importante, é que o vitorioso cumpra uma promessa que não fez: governar para todos.

A campanha eleitoral foi o ponto alto de crise que cresce há tempos: a divisão do País. Há muita gente jogando na luta de pobres contra ricos, de nordestinos contra o Sudeste (especialmente São Paulo), de negros contra brancos, na loucura de ganhar o poder total e destruir quem se oponha a esse projeto. A presidente Dilma é vaiada num estádio de futebol em Brasília e a culpa é “da elite branca paulista endinheirada”. A cúpula do PT vai para a cadeia e a culpa é da elite branca paulista endinheirada – embora o magistrado que a condenou fosse negro mineiro de classe média, professor universitário no Rio, nomeado por um presidente que, conforme a ocasião, era pernambucano ou paulista.

Ninguém consegue governar bem um País que não está bem. Quem percebeu a maluquice do divisionismo foi um dos presidentes mais populares da história, Juscelino Kubitschek. Um ano antes de sua eleição, o presidente da República se suicidou, o vice foi afastado pelos militares junto com o presidente da Câmara e o País ficou sob o governo do vice-presidente do Senado, Nereu Ramos. Juscelino aparou os ódios e, mesmo enfrentando dura oposição, reunificou o País.
É bom para nós lembrar a frase de John McCain, ao reconhecer a derrota para Obama: “Até agora era meu adversário. A partir de agora é meu presidente”.

Os tiros no ar
Qual o efeito eleitoral das revelações atribuídas pela revista Veja ao doleiro Alberto Youssef, do caso do Petrolão, em sua delação premiada? Bobagem especular: em poucas horas saberemos. Mas as revelações, se verdadeiras (Youssef pode estar mentindo; ou talvez essas revelações nem constem na delação premiada, já que tudo o que ele disse deveria estar em rigorosíssimo segredo de Justiça) são explosivas. Youssef, segundo diz Veja, afirmou que Lula e Dilma sabiam das propinas do Petrolão. Atribui à atual presidente e ao ex-presidente, portanto, a participação num crime – ou pior, em vários, todos de ação pública. Caso Dilma seja a preferida dos eleitores e Youssef tenha dito a verdade, é crise instalada.

A bala da crise
A afirmação mais importante da reportagem de Veja, e que não despertou tanta atenção, é a que atribui a Youssef a disposição de fornecer à Justiça o número das contas secretas do PT no Exterior, já que as teria utilizado para distribuir as propinas. Esse tipo de informação, caso confirmada, não comporta interpretações: ou os números correspondem a contas ou não. Se corresponderem, é crise.

Fazendo de conta
Uma dúvida deste colunista: se a delação premiada envolve pouca gente, se as gravações são imediatamente guardadas em cofres, se a transcrição é codificada e guardada em locais protegidos pela Justiça, não deve ser difícil localizar a origem dos vazamentos nem os interesses que se ocultam por trás das informações que pingam para a imprensa. Há alguma investigação na Justiça sobre a responsabilidade por falhas na guarda e proteção de depoimentos sigilosos?

Perguntar não ofende
Considerando-se que esta não é a primeira vez que processos em rigorosíssimo segredo de Justiça vazam para a imprensa, por que insistir em manter o sistema? Que se abram os processos, que o público tenha livre acesso a tudo – a tudo, não a pedacinhos escolhidos, normalmente de interesse da acusação, para influenciá-lo.

Quem nos julga
Acostumado a criticar os gastos secretos com cartão corporativo do governo federal? Habituado a criticar as montanhas de despesas e mordomias da Câmara e do Senado, que transformam o parlamentar brasileiro num dos mais caros do mundo? Pois está na hora de mudar o disco: o portal Congresso em Foco comprovou que apenas o auxílio-moradia para os juízes custará cerca de R$ 1 bilhão por ano – praticamente a mesma coisa que custa o Congresso inteiro, com todos os seus penduricalhos e desperdícios, e que atinge R$ 1,1 bilhão por ano. Traduzindo: com apenas um benefício extra, o Judiciário consumirá o mesmo que os salários, assessores e penduricalhos de 513 deputados e 81 senadores.

Histórias da vida real
Val Marchiori, lembra? Aquela apresentadora de TV e integrante de reality shows que acaba de conseguir um empréstimo de, digamos, pai para filha, com juros de 4% ao ano? Recordando: Val Marchiori conseguiu um empréstimo de quase R$ 3 milhões do BNDES, via Banco do Brasil, com nove anos para pagar e seis meses de carência. Claro, o fato de ser amiga do presidente do Banco do Brasil, Aldemir Bendine – ele, em duas viagens oficiais, ao Rio e Buenos Aires, encontrou-a por acaso no mesmo hotel – não teve influência no caso.

Mas falemos um pouco de Val. No último Réveillon do Iate Clube de Santos, o comodoro do clube tinha levado uma garrafa de champanhe Crystal, comprada por ele, para brindar com a família. Val recusou a champanhe que acompanhava o jantar de réveillon, foi à mesa do comodoro e pegou a que ele tinha levado. 




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