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Sábado, 27 de Abril de 2024

Jackson Schneider
Do Diário do Grande ABC
09/12/2009 | 07:00
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Há um ano, quando a crise derrubava as vendas e instalava um ambiente negativo no Brasil, o presidente da Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores), Jackson Schneider, foi uma das primeiras vozes a vislumbrar possibilidade de recuperação do mercado doméstico. O governo já havia anunciado a redução do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) e a retomada de linhas de crédito dos bancos públicos, mas o clima de incertezas desanimava. "É como se algumas pessoas comentassem: ‘Este cara aí é louco, o mundo desabando e ele acredita que o Brasil vai se recuperar em pouco tempo", lembra.

Para evitar mais desânimo num quadro de crise, Schneider decidiu adiar as previsões que a Anfavea faz, normalmente no fim do ano, para o exercício seguinte. Caso soltasse projeção baseada nos números do último trimestre de 2008, o mercado brasileiro iria desabar até 35% em 2009.

"Se a Anfavea tivesse divulgado previsão pessimista poderia contribuir de fato para que o quadro se agravasse. Tivemos a maturidade de só fazer uma projeção em abril, quando o horizonte já era bem mais favorável ", recorda-se.

As perspectivas para 2009 estão próximas de se confirmar. Na última estimativa, a Anfavea prevê que o mercado brasileiro encerre este ano com crescimento de 10,3%, atingindo a venda recorde de 3.110 milhões de veículos contra 2,820 milhões em 2008. Com a queda de 36% nas exportações, a produção pode até crescer um se igualar a de 2008 - 3,216 milhões. "O crescimento do mercado interno é um feito enorme, já que a maioria dos países teve queda acentuada", diz.

Aos 44 anos, Schneider diz que pretende encerrar seu mandato de três anos na Anfavea em abril. Também renunciará para que o próximo presidente possa ocupar seu posto no conselho da Oica (Organization of Motor Vehicle Manufacturers) - organismo mundial que regula e orienta a indústria automobilística em mais de 150 países.

Funcionário da Mercedes-Benz, o dirigente elogiou o presidente Lula diante da crise. "O que queriam que o presidente dissesse, que não era uma marolinha?" Também critica argumentos ‘elitistas' de que, na questão da mobilidade, tentam atribuir à indústria a culpa pela paralisia do trânsito. "O que falta é infraestrutura".

AUTOMÓVEIS - O que fez o Brasil ser um dos poucos países a crescer em 2009?

JACKSON SCHNEIDER - As medidas anunciadas pelo governo, como a redução do IPI, foram tomadas na hora certa e ajudaram a manter a confiança do consumidor, além de maior competitividade entre as marcas. A crise não tinha motivos no Brasil - tanto que fomos os últimos a entrar e os primeiros a sair. Os nossos bancos estavam fortes, as reservas com nível de segurança, além de outros fatores conjunturais favoráveis.

AUTOMÓVEIS - Quando vislumbrou que a crise não seria tão grave no País?

SCHNEIDER - No final de novembro do ano passado, depois de a crise ter derrubado as vendas desde setembro, eu já acreditava na recuperação. Fui à entrega de um prêmio e disse no meu discurso que, em 2009, iríamos nos recuperar. Algumas pessoas na plateia ficaram meio desconfiadas. É como se me olhassem e dissessem: ‘Este cara aí é louco, o mundo desabando e ele acreditando que o Brasil vai se recuperar logo'.

AUTOMÓVEIS - Ao contrário do que fez todos os anos, a Anfavea demorou para fazer previsão para 2009. Por quê?

SCHNEIDER - Se tomássemos como base números do último trimestre de 2008, o mercado brasileiro iria desabar até 18% em 2009. A atitude mais prudente naquele momento era esperar o efeito de algumas medidas que o governo já tinha adotado, como a redução do IPI. Caso a Anfavea divulgasse previsão pessimista poderia contribuir de fato para que o quadro se agravasse. Só divulgamos a projeção em abril, quando o horizonte já era bem mais favorável. Foi uma decisão responsável, pensando no melhor para a indústria, seus empregados e o País.

AUTOMÓVEIS - Então o senhor concordava com o presidente Lula, para quem a crise no Brasil não passaria de uma marolinha?

SCHNEIDER - O que você queria que (Lula) dissesse naquele momento? Que iríamos quebrar? Não tenho coloração partidária, mas foi uma avaliação correta sim, até porque os efeitos da crise foram bem menores no Brasil.

AUTOMÓVEIS - Como o senhor prevê o ano de 2010?

SCHNEIDER - O que nos preocupa é a queda nas exportações, que devem fechar 2009 com uma redução de 40% em relação a 2008. Deixaremos de exportar 300 mil veículos. Em volume de receita, teremos uma queda de 43% - de US$ 13,9 bilhões, em 2008, para US$ 7,9 bilhões, em 2009. É muito substancial.

AUTOMÓVEIS - Como recuperar?

SCHNEIDER - Os nossos tradicionais compradores, como Argentina e México, desabaram. Já existem alguns sinais de recuperação, mas esses países só vão se recuperar quando os mercados para os quais eles também exportavam se recuperarem. Aí começarão a comprar da gente. Isto deve acontecer no segundo trimestre de 2010.

AUTOMÓVEIS - O Brasil retomará os níveis de exportações?

SCHNEIDER - Vai ser bem difícil. Talvez não tenhamos nunca mais um volume de exportação de 900 mil veículos, como em 2005. Além de estarmos com o real valorizado, novos competidores entrarão e tornarão a disputa muito mais difícil com os produtos brasileiros, que são prejudicados em competitividade devido à alta carga de tributos, logística e infraestrutura deficientes. No mundo existe capacidade ociosa de 20 milhões de veículos. Todo mundo quer mercado.

AUTOMÓVEIS - Com o quinto maior mercado, o Brasil neste ano terá mais importação de veículos que exportações. Isso preocupa?

SCHNEIDER - Se as condições forem iguais para todos, não. O problema é quando você não consegue identificar eventuais subsídios que fabricantes recebem de governos que incentivam as exportações. Aí preocupa, e temos que ficar atentos para não sermos prejudicados. Além disso, temos de resolver questões estruturais internas para que os nossos produtos ganhem competitividade no Exterior.

AUTOMÓVEIS - O mercado doméstico crescerá em torno de 6% em 2009. Mas nos últimos anos vinha subindo 20% em média. Qual o nível de crescimento que o senhor considera ideal?

SCHNEIDER - Acho que um crescimento ideal está entre 6% e 8% - não estou dizendo que é isso que vai ocorrer. Quando se tem uma taxa desta de crescimento, a indústria pode se programar melhor e manter uma boa rentabilidade. Crescimentos muito fortes não são o ideal. O fato de estarmos crescendo 6% neste ano, com todo o cenário de crise mundial, realmente é um feito fantástico.

AUTOMÓVEIS - Com o crescimento de vendas, a mobilidade volta ao debate. Qual o papel da indústria?

SCHNEIDER - Temos de incentivar o planejamento urbano, o que resulta em transporte coletivo de qualidade em todas as grandes cidades brasileiras. Agora, eu percebo um certo comportamento elitista de quem se sente incomodado com a redução do espaço urbano ocupado por novos consumidores, que ascenderam socialmente e passaram a comprar carro. Quem sempre dirigiu seu automóvel, agora quer limitações para os outros. A função da indústria é atender ao desejo e ao direito legítimo do consumidor de ter seu automóvel. No Brasil, existe uma demanda reprimida. Enquanto nos Estados Unidos e Europa, há um automóvel para cada 1,4 habitante, aqui o índice é de seis para um.

AUTOMÓVEIS - Então temos um longo caminho?

SCHNEIDER - Mais de 20 milhões migraram das classes E e D, fortalecendo a classe média. São pessoas que precisam consumir TVs, geladeiras, carros e comprar casa. Este é um dos motivos para o mundo inteiro apostar no Brasil. Nós temos a responsabilidade de aproveitar esta confiança e concretizar a aposta. Como eu represento um setor importante, sinto o peso da responsabilidade pela aposta que o mundo faz no Brasil.




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