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Tráfico de imigrantes ilegais aos EUA tem conexão em São Caetano
Gabriel Batista
Do Diário do Grande ABC
30/11/2005 | 08:18
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A maior quadrilha de tráfico de pessoas já descoberta no Brasil tem braço no Grande ABC. A Polícia Civil de São Paulo desmantelou terça-feira parte do bando, que enviava de 15 a 20 imigrantes ilegais aos Estados Unidos a cada três dias, via Aeroporto Internacional de São Paulo, em Cumbica, no município de Guarulhos. Trinta pessoas foram presas simultaneamente de manhã, por volta das 6h30, nos estados de São Paulo, Paraná, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Um dos detidos é o estudante de Direito Luiz Felipe Akira Dias, 22 anos, morador do bairro Santa Maria, em São Caetano. Akira é apontado pela polícia como um dos cabeças da quadrilha. Ele seria responsável pela clonagem de cartões de crédito utilizado na compra de passagens aéreas para a Cidade do México, local onde eram levados os imigrantes.

Akira foi preso em casa, onde a polícia apreendeu mais de 300 cartões e aparelhos de clonagem. Ele nega participação na atividade criminosa. Diz que seu pai conhece pessoas envolvidas com cópia de cartões e levou os utilitários bancários para casa. O pai de Akira, Antônio Manoel Dias, está foragido e também atuaria no esquema. Manoel Dias é apontado pela polícia como o segundo maior especialista da América Latina em clonagem de cartões.

Nos últimos 12 meses, a quadrilha exportou mais de 3,5 mil brasileiros, boa parte deles de Minas Gerais. Essas pessoas, geralmente desempregadas ou com problemas financeiros, recebiam propostas da quadrilha para ir aos Estados Unidos. Mas muitos deles, na prática, tornavam-se escravos dos criminosos, porque trabalhavam para pagar a viagem de ida e a travessia da fronteira do México com os Estados Unidos. Cada migrante tinha de pagar de R$ 8 mil a R$ 12 mil ao bando, caso contrário seria denunciado ao Serviço de Imigração norte-americano. O esquema movimentava cerca de US$ 3 milhões por mês.

A polícia afirma que a captação de pessoas era feita por Daniel Laurindo Evaristo Chaves, em Governador Valadares, Minas Gerais. A família dele é proprietária de uma agência de viagens e de uma distribuidora de água e gás. O investigador Robson Feitosa da Silva, que durante dois meses e meio ficou infiltrado na quadrilha fingindo ter interesse em emigrar, afirma que as empresas de Chaves são apenas fachada para lavagem de dinheiro.

O esquema contava com carros próprios para levar os migrantes até São Paulo. Eles ficavam em sete hotéis no Centro da capital e em Guarulhos, à espera do embarque. Segundo a polícia, essa parte do negócio ilegal era comandada por Vânia Maria Barbosa Bicalho, presa terça-feira.

Também participavam do esquema donos de uma agência de turismo em Foz do Iguaçu, no Paraná, e duas pessoas que compravam passagens com cartões clonados no Rio de Janeiro. A ação policial foi apelidada de Operação América e, além da Polícia Civil, participaram a Polícia Rodoviária Federal, Ministério Público e o Departamento de Segurança Interna dos Estados Unidos. “Com certeza é a maior quadrilha de tráfico de pessoas já presa no Brasil”, diz o delegado Eduardo Gobbetti, da Delegacia do Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos.

Como agia a quadrilha

1 - Agentes da quadrilha sediados em Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paraná e São Paulo captavam interessados em entrar ilegalmente nos EUA. No México, outra parte da quadrilha fazia a recepção. Boa parte dos brasileiros vivia em Governador Valadares, cidade mineira. O atrativo: inicialmente, os brasileiros não precisavam fazer qualquer pagamento.

2 - Os criminosos tinham ligações com funcionários públicos em Governador Valadares (MG). Esses servidores ajudavam a rastrear gente desempregada que quissesse aderir à proposta. O preço determinado para cada brasileiro era de R$ 8 mil a R$ 12 mil, valor que deveria ser pago após um prazo considerado suficiente para que encontrassem ocupação nos EUA. A ameaça: se alguém não pagasse a quadrilha no prazo estipulado, seria denunciado para a imigração norte-americana. O documento de cada brasileiro ficava retido até que a dívida fosse paga.

3 - Os brasileiros eram reunidos em hotéis em Guarulhos, na região metropolitana, e na capital, e também em uma casa pertencente à quadrilha, em Guarulhos. A quadrilha era instruída a esperar até que tudo estivesse certo para o embarque, rumo ao México.

4 - Parte da quadrilha era proprietária de agência de viagens em Foz do Iguaçu (PR). Por meio dessa agência, os criminosos solicitavam as passagens para o México. Como não queriam ter despesas com a operação, usavam cartões de crédito clonados. Os criminosos eram abastecidos por outra quadrilha, especializada em clonar os cartões. Um dos supostos cabeças do grupo de clonadores é o estudante de Direito Luiz Felipe Akira Dias, 22 anos, de São Caetano, preso sob acusação da polícia. O pai de Luiz Felipe é apontado como o maior clonador de cartões da América Latina – Antonio Manoel Dias. Ele está foragido.

5 - Quando chegavam à capital mexicana, os brasileiros eram recebidos por outra ala da quadrilha. Os brasileiros eram então encaminhados a hotéis conveniados com os criminosos.

6 - Para atravessar a fronteira, eram oferecidas opções ao grupo. Os brasileiros poderiam seguir a pé; atravessar o Rio Grande utilizando bóias, ou utilizar um carro que seguia em caminho alternativo. Uma mulher da quadrilha era encarregada de dirigir o veículo.

7 - Durante a travessia da fronteira México–EUA, a quadrilha indicava caminho errado para cinco integrantes de cada grupo, com o objetivo de despistar a fiscalização. Os escolhidos acabavam sempre capturados pela imigração. Os demais, em torno de dez pessoas por grupo, normalmente conseguiam atravessar a fronteira. A polícia ainda investiga qual o critério utilizado para beneficiar algumas pessoas em detrimento de outras.

8 - A polícia afirma que a quadrilha mandou em torno de  3.500 brasileiros para os EUA só no último ano. Os criminosos tinham ainda outra fonte de renda: compravam eletrodomésticos e eletroeletrônicos nos EUA, traziam para o Paraguai e, de lá, entravam com o contrabando no Brasil por vias ilegais conhecidas pela quadrilha. Aqui, entregavam as mercadorias, que já estavam encomendadas. Cada cabeça da quadrilha faturava aproximadamente 700 mil dólares por mês.




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