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Comércio vende cerol livremente
Por Fabio Leite
Especial para o Diário
08/01/2006 | 08:43
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Embora sejam consideradas práticas criminosas por leis federal, estadual e municipais, há pelo menos 15 anos a comercialização e utilização do cerol (mistura de cola de madeira com vidro moído, utilizada para passar na linha de pipa) ocorre livremente no Grande ABC. Nas férias escolares, o problema salta aos olhos. Comerciantes informais passam a vender clandestinamente o cortante em bazares de garagem e crianças e adolescentes o utilizam impunemente, colocando em risco a vida de motoqueiros, ciclistas e pedestres.

Pelo menos cinco pequenos comércios montados dentro de residências em três cidades da região foram flagrados pela reportagem vendendo cortante para linha de pipa. Ao custo mínimo de R$ 1,50, o produto pode ser encontrado separadamente (vidro moído e cola em dois compartimentos diferentes), misturado (dentro de um pote plástico) ou pronto (já passado na linha enrolada na lata). No último caso, o produto chega a custar R$ 15, como é o caso do cortante chileno.

De acordo com a lei federal de Crimes contra a Ordem Econômica, Tributária e Relações de Consumo (8.137/90), “vender, ter em depósito ou expor a venda matéria-prima ou mercadoria em condições impróprias ao consumo configura prática criminosa”. A legislação está calcada ainda em artigo do Código de Defesa do Consumidor, que define como produtos impróprios aqueles deteriorados e nocivos à vida e à saúde.

Fiscalização – “Sabidamente o cerol é perigoso e nocivo à saúde. Por isso, é impróprio e sua venda é considerada crime”, explica o assistente de direção do Procon Santo André, Charles Moura Alves. A pena é de dois a cinco anos de detenção mais multa. Além da Constituição, o governo estadual e os sete municípios da região já sancionaram leis que proíbem a venda e comercialização do cortante. Já a fiscalização e repressão da prática, afirmam, cabe à polícia.

Segundo o delegado seccional de Santo André, Luiz Alberto Ferreira de Souza, é difícil localizar os comércios clandestinos. Até por isso, convoca a população a ajudar a coibir a comercialização do cerol. “É fundamental que os moradores denunciem à polícia. É quase uma obrigação moral nos avisar”, afirma. Quem for flagrado vendendo cortante será detido e autuado. Caso seja um estabelecimento legalizado, o alvará será cassado pela prefeitura.

Comercialização – As ameaças, no entanto, não surtem efeito para os comerciantes. Por apenas R$ 1,50, R.F., menino de 9 anos, comprou um saquinho com vidro moído e um pequeno tubo com cola de madeira num pequeno bazar no Parque Erasmo Assunção, em Santo André. “Se empinar sem cerol, você perde a pipa”, conta. Como precaução, os comerciantes deixam o produto escondido dentro de casa, para despistar uma possível fiscalização.

Não é preciso procurar muito para encontrar grupos de jovens empinando papagaio com cerol na linha. Na Vila Curuçá, em Santo André, os garotos N.V.S., 13 anos, e E.N., 17, compram o cortante já misturado em um pequeno bazar no bairro. A cola e o vidro moído são passados pelos próprios garotos no chão ou já com o papagaio no alto. “Sei que é perigoso, mas vale a pena. Se não, você fica sem pipa”, relata E., exibindo os dedos cortados com cerol.

Vítimas – De acordo com uma comerciante da Vila Santa Terezinha, em São Bernardo, “se você não vende, eles mesmos fazem o cortante”. É pensando desta forma que ela vende livremente cerol para as crianças do bairro. O que ela ignora, entretanto, são as dezenas de vítimas do cortante. Como o motoboy Leonardo Cavalcanti Domingos, 23 anos, que quase foi degolado por uma linha de pipa com cerol. “A sorte é que eu estava com uma jaqueta que cobria todo o meu pescoço. A linha ainda cortou uns 10 cm da roupa e me atingiu”, conta. Depois do acidente, Domingos colocou u-ma antena na moto para evitar as linhas de pipas. “Direto enrosca pipa na minha moto”, completa.




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