Memória Titulo
De um lado, a cachaça; de outro, a elite...

Quem faz a coluna hoje é Victor José Ferreira, pesquisador, presidente nacional do Movimento de Defesa Ferroviária

Ademir Medici
Do Diário do Grande ABC
24/02/2009 | 00:00
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Quem faz a coluna hoje é Victor José Ferreira, pesquisador, presidente nacional do Movimento de Defesa Ferroviária. Ele já trabalhou no Grande ABC. Hoje vive no Rio de Janeiro. O texto integrou a sua Domingueira Poética desta semana, que circula entre seus amigos. Originariamente o texto foi publicado no jornal O Renovador, de Além Paraíba, Minas Gerais, em 15 de abril de 1997. São memórias de infância do autor.

Nossos carnavais
Texto: Victor José Ferreira

Nossos carnavais eram simples como a gente e como a nossa terra, a pequenina Volta Grande, no final da década de 1940, início da década de 1950.

Havia dois blocos. Um deles composto de operários e da parcela mais humilde (e mais animada) da população, o pessoal que frequentava o Clube Violeta, aquele onde se misturavam amor, suor e cachaça.

O outro, mais sofisticado, congregava a turma mais remediada: comerciantes e comerciários, funcionários públicos, os filhos dos poucos ricos da cidade.

Surgiam, ainda, durante os três dias da festa (sim, naquele tempo o Carnaval se limitava a três dias, mesmo), um ou outro bloco de rua (os ‘blocos de sujos'), aglomerados que se deslocavam pelas ruas durante o dia de forma espontânea, não ensaiada e com uma certa desordem, mas com muita alegria.

Havia, por fim, os bailes, esses também dividindo o povo em dois segmentos, os mais pobres em um, os remediados e ricos em outro. O baile do Clube Violeta, do povão, era sem dúvida o mais quente (o lugar era mesmo abafado) e animado (a cachaça dava uma força).

De minha parte, nunca fui folião. Gostava de ver os blocos pela rua, chegava a balançar o corpo quando eles passavam, mas tinha vergonha de me meter em qualquer ‘bloco de sujos' (os blocos regulares eram só para os adultos).

Bem que a Tia Mariquinhas, que passou um Carnaval em Volta Grande, tentou introduzir-nos, a mim e ao irmão Julinho, nas folias de Momo, contra a vontade da nossa mãe, já evangélica metodista, que considerava tudo aquilo um pecado. Preparou-nos duas fantasias de baianas - vejam só!... - e, a contragosto nosso, levou-nos para um baile infantil. Fomos ambos aborrecidos e morrendo de vergonha pelas ruas.

Chegando ao clube, ficamos pelos cantos, durinhos, tentando nos esconder. Não víamos a hora de voltar para casa, tirar aquela esdrúxula roupa e voltar a brincar em paz, no nosso quintal.

Encerrou-se assim, ali, de forma melancólica, nossa ‘carreira' de foliões. Por mais que ‘o doutor mandasse', como dizia Império do Samba, música carnalesca de sucesso, não mais voltaríamos a sambar, ou melhor, a tentar fazê-lo.

Saudades de um tempo que, quando em vez, volta a acontecer na magia de nossa memória.

DIÁRIO HÁ 30 ANOS

Sábado, 24 de fevereiro de 1979

Manchete - Carnaval vai ao povo hoje. O compositor Adoniran Barbosa foi saudado ontem pelos batuqueiros e diretoria da Escola de Samba Estação Primeira de Santo André.

São Bernardo - Prefeito Tito Costa exonera seu chefe de Gabinete, que desentendeu-se com um vereador do seu partido.

Futebol - Jogo-treino do Santo André e Jabaquara, ontem, em Ribeirão Pires, foi encerrado aos 22 minutos do segundo tempo. Motivo: conflito entre jogadores e torcedores que durou dez minutos. O Santo André vencia por 1 a 0.

ABC AM (1570) - Carnaval de todos os tempos. Aquelas marchinhas que o povo canta até hoje, entre as quais: Allah-la-ô, composição de Haroldo Lobo e Nássara interpretada por Carlos Galhardo; e Chiquita Bacana, de Braguinha, na voz de Emilinha Borba. Produção e apresentação: Marcelo Duarte. Hoje, das 8h às 9h.




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