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Hitler, por Norman Mailer
Alessandro Soares
Do Diário do Grande ABC
23/12/2007 | 07:15
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A última polêmica de Norman Mailer (1923-2007) está nas prateleiras. É O Castelo na Floresta (Companhia das Letras, 432 págs., R$ 55, em média), que chega ao Brasil aproximadamente um mês após sua morte por insuficiência renal, em 10 de novembro último.

Desta vez, o autor se debruça sobre a infância de Adolf Hitler. Parte de uma extensa bibliografia para desenvolver uma história ficcional, narrada por um oficial da SS nazista, que depois se revela ser um demônio encarregado de “cuidar” de Hitler desde sua concepção, preparando-o para ser o grande gênio do mal.

Mal a obra chegou às livrarias norte-americanas, ganhou um prêmio não muito benquisto: o Bad Sex in Fiction Award, da revista de literatura britânica The Literary Review, pela pior descrição de um ato sexual em inglês. A cena premiada fala da relação que os pais de Hitler tiveram quando o menino foi concebido.

Ame-o ou deixe-o - Mailer foi um ‘não grande’ romancista norte-americano que deixou um legado literário. Como romancista, justiça seja feita, seu primeiro livro Os Nus e os Mortos (1948, Record) é primordial. Um relato menos sobre a guerra e mais sobre o que ela faz com as pessoas, vencedores e perdedores, às voltas com os fantasmas do conflito.

O autor foi mais jornalista literário e polemista do que romancista. Escreveu, sobretudo, como um jornalista que mescla fatos com ficção. O new journalism teve em Mailer uma técnica literária chamada ponto de vista autobiográfico, na qual ele não só observa o que escreve, mas faz parte também. Nesse sentido, fez uma das melhores reportagens literárias em Os Exércitos da Noite – Degraus do Pentágono (1968, fora de catálogo no País), sobre os protestos que uniram intelectuais da esquerda e da direita norte-americana, hippies, movimento negro e comunistas no cerco ao QG militar da potência mundial, e Mailer entre eles.

Outro exemplo foi A Canção do Carrasco (1979, fora de catálogo), sobre assassino confesso que pediu para ser executado. As duas obras foram prêmio Pulitzer.

A biografia foi outra de suas vertentes, em busca de narrar o fascínio da fama. Escreveu sobre Marilyn Monroe e suas relações com o presidente John Kennedy, e Lee Harvey Oswald, assassino deste presidente; e até sobre Jesus Cristo, em O Evangelho Segundo o Filho.

Sexo, ambição e violência eram seus temas preferidos, espelhando o fascínio sobre o estilo comportamental da América que ele cantava em prosa e em película. Sim, Mailer aventurou-se no cinema, fazendo pontas como ator (uma delas, como um “grande escritor” no confuso Rei Lear, de Jean-Luc-Godard, de 1987), e também como diretor. Fez quatro filmes, sendo três experimentais. Mas prefira ver a versão de Os Nus e os Mortos, de 1958, dirigida por Raoul Walsh, que ganhou o título A Morte Tem Seu Preço.

Polemista - Judeu nascido em Nova Jersey e criado no Brooklyn, em Nova York, Mailer foi boxeador antes de ganhar a vida como escritor. Até recentemente, depois de 2001, afirmava que os Estados Unidos ganharam uma religião, porque todos ficaram patriotas de repente. “Patriotismo é uma espécie de religião. Algumas religiões são maravilhosas, outras manipuladoras. O país vai se tornar mais profundo, mais preparado, ou se transformará em algo monstruoso?"

Fez também comentários tidos como machistas sobre as feministas. “Agora que as mulheres atingiram o poder, tornaram-se iguais aos homens em cada estupidez, vício e falta de julgamento.” As feministas não o perdoaram, seja pelas cenas de agressão sexual descritas em sua obra, seja pela agressão de fato que ele praticou em sua segunda mulher, Adele Morales, em 1960, ferindo-a com uma navalha. O casal se reconciliou. Mailer foi casado seis vezes, e teve nove filhos.

Quando escreveu sobre a salada ideológica que peitou o Pentágono, antecipou os primeiros sinais do ocaso do sistema capitalista. Mailer dizia que se o capitalismo havia esgotado a vida de milhões de trabalhadores no século 19, no século 20 poderia destruir a mente do homem civilizado. Sem dúvida, diante dos protestos contra o G-7 e as crises financeiras globais, ele não exagerou.

Em 1969, quando foi candidato a prefeito de Nova York, chamou seus colaboradores de “porcos mimados” e afundou sua campanha. “Uma vez quase noiva, nunca noiva”, um dito popular norte-americano que ele usava para responder se voltaria a se candidatar. (Colaborou Gislaine Gutierre)

Outros lançamentos

Melhores Contos (Globo, 216 págs., R$ 32) – Professor, ensaísta, tradutor e filólogo, Aurélio Buarque de Holanda tornou-se sinônimo de dicionário. O que nem todo mundo sabe é que ele também se aventurou pelos textos ficcionais.

Neste volume da série Melhores Contos, o leitor terá a oportunidade de conhecer a narrativa de Aurélio, que, segundo o poeta Ledo Ivo, “amava as palavras como amava as mulheres”.

Baixo: Homenagem ao Maior Produtor da MPB na Televisão (Fundação Padre Anchieta, 167 págs., R$ 15) – Narra a trajetória pessoal do produtor musical Fernando Faro, a partir do depoimento de artistas com quem trabalhou. Faro, que é conhecido como Baixo, produziu discos célebres como A Arca de Noé, e criou programas importantes, entre eles o MPB Especial, Móbile e Ensaio.

O Negro no Mundo dos Brancos (Global, 320 págs., R$ 45) – Publicado originalmente em 1972, o livro mostra a visão crítica do sociólogo Florestan Fernandes sobre a desigualdade a qual os negros foram relegados no Brasil, após a abolição da escravatura. Segundo o intelectual, morto em 1995, não foi dada aos afro-descendentes a oportunidade de valorizar seu universo cultural na sociedade brasileira.

Ensaio Geral (Globo, 411 págs., R$ 54) – O livro reúne textos críticos, esboços e fragmentos ficcionais do escritor e artista plástico Nuno Ramos, produzidos a partir de 1994. Entre os temas abordados pelo autor estão a arte, o esporte, a literatura e o futebol.

Revelações por Minuto (Companhia Editora Nacional, 440 págs., R$ 62) – Escrita por Marcelo Leite de Moraes, a biografia do grupo RPM apresenta um texto confuso e recheado de informações imprecisas. Fenômeno de vendas nos anos 1980, a banda merecia uma análise mais sofisticada e criteriosa de seu trabalho.




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