Cultura & Lazer Titulo
Amazônia submarina
Cássio Gomes Neves
Do Diário do Grande ABC
26/03/2007 | 07:02
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Ameaça de morte, lavrada e assinada, eles não receberam. Entretanto, o casal Tatiana Polastri e Alexandre Rampazzo não teve a mais tranqüila das atmosferas para filmar Nas Terras do Bem-Virá, longa-metragem que foi selecionado para a mostra competitiva do É Tudo Verdade – 12º Festival Internacional de Documentários e tem uma única (e gratuita) exibição nesta segunda-feira à noite, no Cinesesc.

Antes da glória de ter um filme entre os sete concorrentes da competição do maior festival de documentários do país, Tatiana, de Mauá, e Rampazzo, de São Caetano, viveram dias de tensão. Pudera: o objeto temático de Nas Terras do Bem-Virá são os ciclos históricos do trabalho escravo na Amazônia, que persiste ainda hoje, e suas relações com desmatamento, com a perda de terras por parte de comunidades ribeirinhas, com assassinatos indiscriminados e cemitérios clandestinos, com o massacre em Eldorado dos Carajás (em 1996, que resultou no homicídio de 19 pessoas), com o assassinato da missionária norte-americana Dorothy Stang (em 2005)...

“A gente nunca quis trabalhar o tema da escravidão de forma isolada. Sabíamos que esses eventos estavam ligados e procuramos mostrar que o trabalho escravo é o núcleo dos conflitos”, diz Tatiana. Conseguiram, no documentário, estabelecer essas relações em uma terra de ninguém, sem lei e sem ordem, onde são comuns “viúvas de maridos vivos”, de peões e trabalhadores que não retornam e cujo paradeiro ninguém conhece; podem ter sido assassinados ou simplesmente não ter recursos para voltar para casa.

Por mexer em vespeiro, perceberam represálias. Mais de uma vez, o casal flagrou motoqueiros que os seguiam e observavam. “Um dia, voltando de Anapu (cidade paraense onde foi encontrado o corpo da freira Dorothy) pela estrada, o Alexandre (Rampazzo) viu um ônibus parado e cujos passageiros estavam todos nus. (Os assaltantes) Tinham levado tudo deles, até as roupas”, afirma Tatiana.

O documentário despertou fantasias e realidades. A fantasia: “Os peões e suas famílias gostavam de falar para as câmeras, sentiam que era uma forma de reverter injustiças. Viam o filme como uma esperança. Mas isso é muito triste porque a força do documentário é mínima diante de todo o problemão”. Agora, a realidade: os 112 minutos de duração de Nas Terras do Bem-Virá são panorâmicos. Passada a divulgação do filme, o casal pensa em investir numa série de TV que envergaria de forma mais extensa as 150 horas de imagens obtidas para o filme.

NAS TERRAS DO BEM-VIRÁ (Brasil, 2006). Dir.: Alexandre Rampazzo e Tatiana Polastri. Exibição única nesta segunda-feira, às 21h, no Cinesesc – R. Augusta, 2.075, São Paulo. Tel.: 3082-0213. Entrada franca.



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