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Dojival Filho
Do Diário do Grande ABC
20/03/2006 | 07:54
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Até quem não suporta a atual fase do guitarrista Carlos Santana, que voltou às paradas de sucesso amparado em canções tão superficiais quanto radiofônicas, teve que dar o braço a torcer. Ou melhor, quem ainda tinha alguma resistência, preferiu botar os braços para cima e se esbaldar ao som do instrumentista, que na última sexta-feira se apresentou na Arena Skol Anhembi, em São Paulo, para um público de cerca de 20 mil pessoas, segundo estimativa da organização do evento.

Todos os ingredientes que proporcionam ao espectador um grande espetáculo foram bem dosados pelo artista. Santana escolheu de forma coerente as canções do repertório do show, que teve duração de cerca de duas horas e meia. Para abrir o concerto, que começou pontualmente às 22h, como previsto, atacou de Jingo, primeira faixa de seu disco de estréia, lançado em 1969. No fundo do palco, um telão exibia imagens de crianças africanas e aborígenes dançando e tocando instrumentos percussivos, em perfeita sintonia com a batida tribal da música.

Depois de dar uma pequena amostra aos quarentões saudosistas, que compunham a maior parte do público, mandou os acordes de I am Somebody, faixa de seu álbum mais recente, All That I Am, lançado no ano passado. Foi a vez dos adolescentes que sequer sonhavam em nascer quando o guitarrista brilhou no mitológico Festival de Woodstock, em agosto de 1969, requebrarem para valer. Ponto para o guitarrista, que conseguiu reunir e agradar fãs de faixas etárias bem distintas.

Como artista antenado que é, Santana não apenas uniu gerações em torno de seu trabalho, mas optou pela multiplicidade de estilos, o que também colaborou para que o show fosse atraente. Jazz, hip hop, rock, merengue, salsa, calipso e o que mais o bom gosto da banda sugerisse foram temperados em um caldeirão apimentado de sonoridades.

Sucessos e referências – Quem queria ouvir os hits recentes pôde se fartar com Smooth e a breguinha Corazón Espinado, regravada pelo cantor sertanejo Leonardo. Para os representantes da geração “poncho e conga”, amantes do rock dos anos 60 e 70, o suíngue de Oye Como Va, versão de um clássico de Tito Puente; a melodia sinuosa de Black Magic Woman; e a brejeirice de Samba Pa Ti, em que Santana fez referência à Aquarela do Brasil, de Ary Barroso, munido de sua inseparável guitarra Paul Reed Smith. O instrumentista não poupou referências aos seus ídolos musicais, citando o Cream, primeira banda de Eric Clapton (Sunshine of Your Love), John Coltrane (A Love Supreme), The Doors (Light My Fire), e riffs de Jimi Hendrix.

Mas, no quesito citação, a grande surpresa ficou por conta do exímio baixista Benny Rietveld. Vestido com a camiseta da seleção brasileira de futebol, Rietveld solou a melodia de Romaria, de Renato Teixeira, e fez o público cantar em uníssono: “sou caipira, pirapora Nossa Senhora de Aparecida/Ilumina a mina escura e funda o trem da minha vida”. Emocionante. Ao lado do não menos virtuoso baterista Dennis Chambers, o baixista participou de outro grande momento da noite: ambos monopolizaram o palco em uma longa dobradinha musical. Aliás, a banda de apoio de Santana já valeria o ingresso.

Político e espiritual – Vestindo uma camiseta colorida com o rosto de Jimi Hendrix estampado, ao estilo daquelas encontradas facilmente em qualquer feira hippie, um colar com um crucifixo, boina preta e calça branca, o guitarrista esbanjou simpatia para mandar suas mensagens políticas e espirituais. “Queremos dedicar esta música e todo o concerto às minhas irmãs e meus irmãos da favela”, disse o músico, antes de tocar o tema Concerto.

Assim como o engajado vocalista do U2, Bono Vox, e todo bom candidato a algum cargo eletivo, já no final do show, Santana escolheu cinco crianças da platéia para tocar instrumentos de percussão no palco. Mais carismático, impossível.

Ciente de sua importância no cenário musical como pioneiro da fusão entre o rock e os ritmos latinos, fez uma apresentação para encantar os olhos e os ouvidos de quem foi até o Anhembi. Profissional, dinâmica e, principalmente, à altura de seu enorme talento que, apesar dos recentes deslizes, continua poderoso.




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