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Garoto de 7 anos é flagrado com maconha em Santo André
Danilo Angrimani
Do Diário do Grande ABC
13/09/2003 | 16:52
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V.S., sete anos, profissão: avião. Na semana passada, o garoto V.S. foi recolhido por uma conselheira tutelar de Santo André na travessa Lucinda, no bairro Casa Branca. Ele estava dormindo na rua e trazia no bolso dois pacotinhos de maconha. V. foi conduzido para um abrigo e a família comunicada do ocorrido.

Não é a primeira vez que V. dorme fora de casa, uma construção de dois cômodos, encaixada em uma viela íngreme e escorregadia da favela Lamartine, em Santo André, onde ele vive com seus três irmãos, a mãe M.J.S. e a tia R.C.S.

Há um ano, V. tem fugido da moradia. O que ele faz na rua é um mistério até para a própria mãe. “Ele deve estar passando isso (a droga) a mando de alguém. Ele não é usuário”, afirmou M., uma pernambucana de 32 anos, desempregada, que junto com a irmã R., 16 anos, tenta cuidar dos quatro meninos, com idades entre 11 e 5 anos.

Essa é também a opinião da conselheira tutelar Leonor Carajaleascow, que atendeu a ocorrência: “Ele pode estar fazendo papel de laranja e passando a droga para os grandes (traficantes)”.

V., um garotinho loirinho que adora jogar videogame, ficou dois dias em uma casa abrigo até ser devolvido para a mãe. M. diz que tem se esforçado para manter as crianças longe das ruas: “Eu falo, falo e falo, mas não adianta. Só abrindo a cabeça deles para pôr juízo lá dentro.”

V. é monossilábico. Nunca responde as perguntas diretamente. Conversa de maneira evasiva. Não explica como a droga foi parar em seu bolso nem onde a conseguiu. Limita-se a dizer que iria “vender” o tóxico. Responsabiliza amigos da favela, que, segundo os irmãos, nem se encontravam com ele na ocasião.

Pesadelo – A mãe dos garotos conta que recentemente voltou às 2h20 da madrugada para casa, depois de ter andado a pé pelo Centro de Santo André, em busca dos quatro meninos. “Achei que eles já teriam voltado, mas não tinham. Fui dormir com o coração na mão. Deitada, parecia que eles me chamavam. Acordava e não era nada. Parecia sonho, mas não era.”

Em outra ocasião, V. saiu de casa e ficou três dias ausente. A mãe foi encontrá-lo no bairro Ipiranguinha, em Santo André, nas proximidades de uma grande lanchonete. “Ele estava com uma moradora de rua. Tive que brigar com ela, para trazê-lo de volta para casa.”

O último emprego de M. foi em uma frente de trabalho aberta pela Prefeitura. Ela ficou dois anos ocupada nessa atividade. Agora, precisa esperar um intervalo de seis meses até pode voltar para a frente de trabalho. Sem recursos, a família recebe alimentos dos vicentinos (grupo de religiosos da comunidade católica São Vicente de Paulo).

M. não recebe pensão do pai de V. (e de outros dois filhos do casal), porque ele cometeu um assassinato e está foragido há vários anos. O pai da outra criança também é homicida e cumpre pena em uma penitenciária.

A casa, onde os quatro meninos e as duas mulheres vivem, é de alvenaria. O interior foi decorado com quadros abstratos, que os meninos fizeram na escola. Há pôsteres dos cantores sertanejos Zezé di Camargo e Luciano e de uma edição da Playboy. Vêem-se flores artificiais e outras de verdade. O único lugar disponível para se sentar é uma cama de casal, onde a tia R. e dois dos meninos dormem. A modernidade surge na forma do aparelho de som, da TV e do videogame.

Do lado de fora na área de serviço da habitação, as panelas areadas, penduradas em cima do tanque, chamam atenção pelo brilho iluminado. Perto da folha de madeira, que serve de porta, um rato branco tenta, sem sucesso, escalar a gaiola para alcançar uma codorna, presa em outra gaiola.

A tia diz que V. costuma alternar seu comportamento. “Às vezes, ele é amoroso; às vezes, explosivo.” V. e o irmão mais velho, J.V.S., 11 anos, abandonaram a escola. Se os meninos não retornarem aos estudos, a família pode perder a ajuda de R$ 40, que recebe do PETI (Programa de Erradicação do Trabalho Infantil).




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