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Leminski por uma velha amiga
Por Cássio Gomes Neves
Do Diário do Grande ABC
24/08/2005 | 08:16
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O show que Neuza Pinheiro protagoniza nesta quarta à noite, a partir das 20h, no saguão do Teatro Municipal de Santo André, não pode ser classificado exatamente de tributo pós-mortem ao poeta Paulo Leminski (1944-1989). "Tributo, na verdade, eu venho prestando ao Paulo desde 1984", fala a cantora e compositora radicada em Santo André, com a propriedade de quem conheceu pessoalmente e artisticamente o bardo curitibano há 21 anos. Com entrada franca, a performance desta noite procura resgatar uma porção da obra do poeta, cronista, escritor e compositor morto precocemente, aos 44 anos, de cirrose hepática.

Antes de Neuza pisar no palco, poetas da região homenagearão e promoverão leituras de obras de Leminski, que completaria 61 anos nesta quarta. Em seguida, a cantora e amiga desembala seu violão no saguão do Municipal, acompanhada por Tonho Penhasco (guitarra e violão) e Mauro Sanches (percussão). O show, batizado Peça por Peça, reúne 14 poemas de Leminski musicados por Neuza.

"Foi um verdadeiro desafio (musicar os poemas); porque os textos do Paulo são muito velozes e muito fortes e você tem de criar gráficos musicais que correspondam a essa velocidade. E sem contar que os poemas já parecem ter uma sonoridade própria", afirma Neuza, ex-parceira musical de Arrigo Barnabé no clássico Clara Crocodilo e vencedora do Festival de Música Popular da TV Tupi, em 1979, com a música Sabor de Veneno. Como incremento musical dos versos leminskianos, há de tudo um pouco: de samba-canção ao rock do mais pesado; da valsa ao blues. "Porque o Paulo era eclético, tinha uma cabeça aberta a tudo de bom que pintava na música e na poesia".

Os títulos dos poemas-canções não fazem nada além de avalizar o bom humor de Leminski e a sofisticação que sua obra impôs à contracultura: La Vie en Close, Como Quem Conta Estrela Cabisbaixo, Chama que Me M’Água, Você Me Matou mas Eu não Morri... Peça por peça, cada uma indispensável a seu modo para montar o quebra-cabeça sonoro e poético de Leminski.

poemas

Nunca são três
Tão longe
Eu lhe disse até logo.
E um pouco de tudo
Passou-se outra vez
E foi uma vez
Toda feita de jogos
Aquela outra vez
Que não soube ser vez
E voltou sem saber
Que de duas uma
Nunca são três.
 
Rumo ao sumo
Disfarça, tem gente olhando.
Uns, olham pro alto,
cometas, luas, galáxias.
Outros, olham de bando,
lunetas, luares, sintaxes.
De frente ou de lado,
sempre tem gente olhando,
olhando ou sendo olhado.
 
Outros olham para baixo,
procurando algum vestígio
do tempo que a gente acha,
em busca do espaço perdido.
Raros olham para dentro,
já que dentro não tem nada.
Apenas um peso imenso,
a alma, esse conto de fada.




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