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Produção de veículos neste ano deverá retroceder a 2003

Queda de 35% será puxada por piora nas exportações, que voltam a patamar de 1999

Por Soraia Abreu Pedrozo
Do Diário do Grande ABC
08/10/2020 | 00:04
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O cenário adverso trazido pela pandemia do novo coronavírus atingiu em cheio a produção de veículos, assim como os demais setores de bens duráveis. Em setembro, leve reação na fabricação que fez do mês passado o melhor do ano e a Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores) revisou suas projeções para o fim do ano. Se no auge da quarentena e da imprevisibilidade se previam quedas de 40% ou mais, agora a projeção é de encolher 35% na comparação com 2019. Com isso, devem sair das esteiras 1,915 milhão de unidades, o que faz com que o segmento retroaja ao patamar de 2003.

“Não deixa de ser um alívio diante do quadro que vislumbrávamos no começo da pandemia, e creditamos isso sobretudo à gigantesca injeção de dinheiro feita pelo governo federal por meio do auxílio emergencial, que fez a economia girar de forma mais rápida do que o esperado”, avalia o presidente da Anfavea, Luiz Carlos Moraes. “Mesmo assim, teremos uma queda dramática de todos os resultados da indústria em 2020, ainda que o último trimestre seja razoável como foi o terceiro.”

De fato, a crise da Covid-19 deve reduzir a venda de veículos zero-quilômetro em 31%, para 1,925 milhão de exemplares, o pior resultado desde 2005. Mas o maior peso virá do pé no freio das exportações, que deverão atingir 284 mil unidades em dezembro, 34% menos do que no ano passado e nível mais baixo desde 1999, o que configura o pior desempenho do século. Ou seja, o embarque aos outros países retrocederá 21 anos.

Na avaliação do coordenador do curso de administração do Instituto Mauá de Tecnologia, Ricardo Balistiero, a pandemia agravou situação que já estava ruim para o comércio exterior, pois pelo menos metade das vendas é direcionada à Argentina, que vive persistente crise econômica. Em 2018, por exemplo, 75% das unidades eram enviadas aos hermanos. “As exportações sempre são válvula de escape para cenários turbulentos no Brasil. Mas isso não tem força em 2020”, afirma.

Quanto a retroceder a produção nacional em 17 anos, Balistiero lembra que as empresas automobilísticas fizeram suntuosos investimentos nos anos 1990, no período pós-Plano Real. Com a crise de 1998 e 1999, porém, ociosidade nas fábricas começou a crescer. “Em 2003 passamos boa parte do ano em recessão, com a Selic a 26% ao ano (para efeito de comparação, hoje a taxa básica de juros está em 2% ao ano). E, em 2005, embora não houvesse recessão, a capacidade ociosa do setor girava em torno de 30%. Então, por exemplo, se pudesse produzir 3 milhões de veículos naquela época, eram fabricados 2,1 milhões. Por isso, retroceder a esse período não é nada abonador”, contextualiza. “Nos últimos anos, houve uma expressiva ampliação dos investimentos no setor, inclusive na região, portanto, hoje a capacidade de produção é muito maior do que 17 anos atrás. O que torna a situação mais grave.”

Para se ter ideia do impacto na produção automotiva, o estoque despencou, mas não porque vendeu mais, e sim porque deixou de fabricar. Hoje são necessários 20 dias para desovar os 141,7 mil veículos prontos no mercado brasileiro. Há um ano, eram precisos 45 dias, com 348,6 mil unidades.

SETEMBRO

No mês passado, foram confeccionados 220.162 veículos, alta de 4,4% ante agosto, mas queda de 11% frente a setembro de 2019. No acumulado do ano, o tombo é de 41,1%. Quanto às exportações, foram embarcadas 30.519 unidades, alta de 8,5% sobre agosto e queda de 16,7% ante setembro de 2019. Em 2020, encolheu 38,6%. O mercado interno fechou o mês com 207.710 licenciamentos, 13,3% mais frente a agosto e retração de 11,6% sobre o mesmo mês do ano passado. De janeiro a setembro, queda é de 32,3%.

Para o último trimestre, a Anfavea espera números similares aos de setembro. Balistiero acredita que os juros em queda podem contribuir, assim como os lançamentos. “Carro é movido a crédito. A venda desse produto é muito sensível a crédito, que está ligado aos juros. Com a Selic baixa, linhas com juros menores podem ser reativadas”, diz.
 




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